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por Ricardo Baesso de Oliveira

 

O mais difícil é o que conta


Fui procurado, certa feita, por um senhor muito bem vestido, que desejava comigo um diálogo fraterno. Ele havia assistido a uma palestra minha, cujo tema fora a sexualidade, e tinha algumas dúvidas a esse respeito.

Nos encontramos e ele me colocou sua condição. Era professor da Universidade, casado, com três filhos já adultos e tarefeiro do centro espírita onde eu havia feito a palestra. Ele se considerava muito bem, na atual encarnação, do ponto de vista moral. Professor dedicado, benquisto pelos alunos, bom pai, muito amigo dos filhos e excelente espírita, estudioso e trabalhador. Só havia uma pequena questão que o intrigava: o fato de, embora casado, ter, eventualmente, umas namoradas. Ele queria saber até que ponto isso era grave do ponto de vista espiritual.

Eu então lhe perguntei:

- O senhor faz muito esforço para ser um professor competente e dedicado?

- Não, nem um pouco - respondeu ele. Leciono por amor à profissão.

Voltei a perguntar:

- O senhor faz muito esforço em ser bom pai?

- De jeito nenhum... amo de paixão meus filhos!

Retornei com uma última pergunta:

- O senhor faz muito esforço em ser um trabalhador espírita responsável?

- Também não. O Espiritismo é a luz que ilumina minha vida!

Voltei-me, então, para ele e disse:

- É uma pena..., mas o senhor não está bem não, do ponto de vista moral.

Ele, surpreso, exclamou:

- Mas como não, se sou bom em tantas coisas.

E eu:

- O senhor é bom apenas nas coisas que não exigem do senhor sacrifício, renúncia e luta íntima. Tudo aquilo que o senhor diz ser bom é feito sem esforço, ou seja, consiste em lutas passadas. O senhor já superou esses desafios. A única coisa que lhe exige o esforço de agora, o senhor não faz. Lamento, mas acho que não está indo tão bem assim.

Acredito que esse fato se identifique com uma passagem evangélica, que costuma causar estranhamento, a do Moço rico.

Segundo Mateus, 19:16-30, um homem que era muito rico chegou perto de Jesus e perguntou:

— Mestre, o que devo fazer de bom para conseguir a vida eterna?

Jesus respondeu, sugerindo que ele deveria seguir os mandamentos: “Não matar, não cometer adultério, não roubar, não dar falso testemunho contra ninguém, respeitar os pais etc.

O jovem retrucou dizendo que já fazia tudo isso. O que mais lhe faltava fazer?

 Jesus, então, após perscrutá-lo mentalmente, respondeu:

— Se você quer ser perfeito, vá, venda tudo o que tem, e dê o dinheiro aos pobres, e assim você terá riquezas no céu. Depois venha e me siga.

Segundo o texto, quando o moço ouviu isso, foi embora triste, pois era muito rico.

A perplexidade de quem se depara com esse relato é a dureza da proposta de Jesus. Coitadinho! Dar tudo aos pobres e ficar pobre como eles.

Na verdade, o objetivo de Jesus era mostrar-lhe onde se encontrava a sua fragilidade moral. Todas as demais virtudes ele já as havia conquistado, faltava uma: o desapego aos bens terrenos. Ali deveria se concentrar a sua luta pessoal. 

 
  
    

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita