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por Jorge Gomes

 

Acreditar em Deus ajuda a desencarnar melhor?


Como em muitas situações na vida… depende!

Este facto resulta de uma análise estatística realizada há meia dúzia de anos a partir do atendimento mediúnico a Espíritos desencarnados necessitados de auxílio. A amostra rondou os 200 casos anotados.

A pergunta do estudo não era a do título, mas sim esta: O Espírito comunicante acredita em Deus?

Verificados os apontamentos, que refletiram o atendimento efetuado através de três médiuns na mesma reunião mediúnica semanal, verificou-se nesta amostra que uma expressiva maioria acreditava: 76%! Ainda assim, percebe-se que foi insuficiente para desencarnarem numa situação saudável ou equilibrada.

Houve ainda 14,5% de casos indetermináveis. Representam os diálogos que não refletiram com clareza se estes Espíritos desencarnados de algum modo acreditavam ou não em Deus. Por sua vez, os que evidenciaram não acreditar em Deus foram apenas 9,5%. (Confira no gráfico abaixo)

 

Muitos deles começaram por envolver os médiuns com sensações de dor física ou psicológica. Independentemente disso, assim de memória, contar-se-ão pelos dedos de uma mão os que não conseguiram sair no final da conversa de esclarecimento numa situação espiritual bem melhor, por vontade própria. Nestes casos de renitência, tinham objetivos que queriam esgotar, capazes de proporcionar o desequilíbrio em que se encontravam na altura.

Estes factos não são novidade. É provável, inclusive, que reflitam realidades aproximadas em numerosas reuniões mediúnicas de auxílio espiritual deste género, caso fosse feita a organização dos dados que lhes são inerentes.

Na verdade, este estudo apenas replicou em Portugal no início do século XXI algumas das conclusões que Allan Kardec explana com sabedoria nas suas obras, publicadas em meados do século XIX, resultado de profunda e acurada experimentação, particularmente desdobradas em “O Livro dos Médiuns”.

Falou-se de Deus, mas as culturas espalhadas pela Terra refletem entendimento diverso sobre o que é a divindade. Ao longo da história ocorreu a adoração de esculturas de pedra, de plantas, de animais, etc.

No caso do espiritismo – ou doutrina espírita – isso não é dúbio. Publicado em sucessivas e numerosas edições ainda hoje, lê-se em “O Livro dos Espíritos”, de Allan Kardec, a questão n.º 1 – O que é Deus?

A resposta dos Espíritos esclarecidos vem cristalina: “Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”. E as perguntas continuam na obra primeira do espiritismo, para quem quiser aprofundar.

Logo, Deus não é, na óptica espírita, um homem idoso sentado num trono, obviamente. Também não é Jesus de Nazaré, nosso irmão mais avançado na espiral evolutiva em que nos movemos há incontáveis milhares de anos. Deus é, isso sim, um ser espiritual extraordinário que nos oferece o livre-arbítrio através do qual impulsionamos a nossa própria evolução, através de muitos erros e acertos, próprios de tão complexa aprendizagem. Quando, dentro das limitações que nos caracterizam, nos aproximamos da sua sintonia, é verdade que sentimos um imenso amor a envolver-nos.

Não admira, por isso, diante de tantas diferenças de entendimento sobre a divindade, que haja uma compreensão mais limitada de Deus, em que se misturem atitudes muito infelizes próprias dos estágios mais atrasados da evolução. Exemplo disso são as crenças atuais em que em nome de Deus se mata e rouba, ou incendeia seres vivos, como ocorreu há tão poucos séculos com os crimes da Inquisição. Esta é a antropomorfização (entender Deus à imagem das imperfeições humanas) mais atrasada de que tivemos notícia.

Atitudes de superfície, que não reflitam na profundidade do psiquismo uma dinâmica de amor ao próximo, como ensinou Jesus de Nazaré, não passam de papel de embrulho. O evangelho falava de crentes de todas as religiões que configuram sepulcros caiados por fora e podres por dentro (Mateus 23:27).

As dinâmicas próprias da realidade espiritual de cada um reflete a média horária, se quisermos dizer assim, de sentimentos bons que somos capazes de trazer, de dentro para fora do ser, no dia a dia. Um suposto ateu que seja fraterno e auxilie de forma expressiva o seu semelhante, dentro da conduta refletida pelo que de melhor o evangelho expõe, espelhará uma realidade interior capaz de lhe dar ouvidos para ouvir e olhos para ver quem o vier ajudar ao regressar ao Plano Espiritual quando o seu corpo material morrer. Crê de modo eventual em Deus no seu inconsciente amando o próximo de modo experimental, não meramente teórico. O mesmo para todos os outros caminheiros da evolução. São leis da natureza que não pedem opinião para funcionar.

Por essa razão Kardec explicava, corrigindo um chavão com ruído de falsete que se pregava na época pela Europa, que fora da caridade não há salvação. Não a salvação de inferno ou de céu, que não existem senão como estados de consciência, mas sim da ignorância, cujo império nos mundos de provas expiações causa tantas dificuldades, até que esta possa ser ultrapassada com maturidade.

Caridade essa que mais não é do que o amor em movimento. Amor tão desinteressado de retorno quanto possível, no momento evolutivo primário em que por enquanto nos situamos. (*)


(*) Esta análise foi efetuada a partir de um grupo de serviço mediúnico situado nos arredores da cidade do Porto, na região Norte de Portugal, ao longo do ano de 2017. Através de registos recolhidos das manifestações mediúnicas habituais no grupo em que colaborámos regularmente durante vários anos, até 2019, identificaram-se e registaram-se a posteriori, anotando-se caso a caso, diversos dados emergentes do diálogo de esclarecimento estabelecido com a entidade espiritual no transe mediúnico. O póster “Reuniões Mediúnicas: uma análise estatística”, relativo a este gráfico, está disponível na internet, no site Scribd e no Issuu, mas também pode ser visto clicando-se neste link

 

Jorge Gomes, escritor, ex-vice-presidente da Federação Espírita Portuguesa e ex-editor do Jornal de Espiritismo publicado pela ADEP - Associação de Divulgadores de Espiritismo de Portugal, da qual é membro, reside na cidade do Porto, Portugal. 

 
 
 

     
     

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