WEB

BUSCA NO SITE

Edição Atual Edições Anteriores Adicione aos Favoritos Defina como página inicial

Indique para um amigo


O Evangelho com
busca aleatória

Capa desta edição
Biblioteca Virtual
 
Biografias
 
Filmes
Livros Espíritas em Português Libros Espíritas en Español  Spiritist Books in English    
Mensagens na voz
de Chico Xavier
Programação da
TV Espírita on-line
Rádio Espírita
On-line
Jornal
O Imortal
Estudos
Espíritas
Vocabulário
Espírita
Efemérides
do Espiritismo
Esperanto
sem mestre
Divaldo Franco
Site oficial
Raul Teixeira
Site oficial
Conselho
Espírita
Internacional
Federação
Espírita
Brasileira
Federação
Espírita
do Paraná
Associação de
Magistrados
Espíritas
Associação
Médico-Espírita
do Brasil
Associação de
Psicólogos
Espíritas
Cruzada dos
Militares
Espíritas
Outros
Links de sites
Espíritas
Esclareça
suas dúvidas
Quem somos
Fale Conosco

Crônicas e Artigos

Ano 8 - N° 394 - 21 de Dezembro de 2014

EUGÊNIA PICKINA 
eugeniapickina@gmail.com
Indaiatuba, SP (Brasil)

 
 
 
 

Detrás do muro,
uma estampa


Homem, 56 anos: “minha mulher está preocupada com os meus hábitos sociais. Saio para beber aquela ‘cervejinha’ após o trabalho, todas as sextas e sábados, e algumas quintas também, todavia, às vezes, também tomo uma dose de uísque ou uma boa cachaça durante o happy hour”.

O amigo, psiquiatra, e ambos na piscina, avisa: “a esposa tem razão de ficar preocupada. Você começa a beber na quinta, depois aumenta progressivamente. Considero, por isso, um tiro no pé a justificativa que muitas pessoas dão a esse desejo indomável de beber: ‘bebo, claro, mas apenas socialmente’. Confessemos: até que ponto dizer isso é honesto?”

Pesquisas recentes apontam que o hábito de beber entre crianças e adolescentes não para de crescer.

E os menores que estão hoje a beber revelam alguns motivos para o uso do álcool: curiosidade; necessidade de pertencer a determinado grupo; diminuir inibições; adquirir coragem; relaxar para lidar com situações estressantes (família/escola); divertir-se.

Os estudos, de outro lado, enumeram diversos fatores de risco para o uso do álcool, mas os hábitos familiares têm status privilegiado, pois tudo começa em casa.

Sem dúvida, o campo doméstico, espaço primário dos exemplos, permite aos menores assimilar determinadas texturas comportamentais, que se reforçam no tempo, à medida que observam continuamente pais e parentes a relacionarem felicidade com bebida, sobretudo nos eventos festivos, nos feriados, nos almoços de domingo – para celebrar e/ou desfrutar o descanso, o hábito assumido da cerveja, esquecidos os adultos de que, embora não pareça, cerveja também é álcool.

Um professor, e amigo precioso, me conta: cresci assistindo a meu pai chegar em casa nervoso ou enfadado. Correr para a cozinha, abrir a geladeira, apossar-se da cerveja, que lhe dava a ilusão de leveza, quiçá alguma esperança. No outro dia a vida igual, mas, no final de semana, o vinho tinto, “bom para a saúde”, ele dizia, mais cerveja e, na sequência, o homem piadista; e, depois do sono, a letargia pós-almoço, um crônico mau humor. As horas tão breves, pois o mundo não é paraíso, só a sociedade de consumo, a indústria nos contam isso e de forma tão infiel. A maioria acredita. Meu pai acreditava. Morreu mal, o coitado, dessas doenças dos excessos, construídas lentamente no corpo. E abracei, de forma inconsciente, ou não, nunca sabemos, a mesma atitude. Então, tive um infarto e fui obrigado, por uma questão de saúde, a me educar e assim acabar por oferecer um outro estilo de vida para os meus filhos. Cresceram mais estruturados e acredito que possuem mais recursos emocionais para lidar com os desafios e as frustrações do caminho. E sobre o álcool, sou muito honesto. Procurei educar meus filhos, mostrar a eles os efeitos danosos, pois sei que só proibir é pensamento mágico.

Soneto do povo e de toda gente, as campanhas publicitárias, infelizmente, remetem a todo tempo mensagens explícitas do consumo do álcool ligado à fantasia do sucesso, a cenários de uma vida feliz, muito contrária, na verdade, à realidade, à valorização da vida. Quanto vale a nossa vida?

Escutei algo interessante outro dia, durante uma viagem de trabalho. Uma mulher, diretora de uma escola, me perguntou: você fuma socialmente?

Respondi: não entendi a pergunta.

Mas, por demonstrar mais espanto que desentendimento, ela continuou: as pessoas, a sociedade, o poder público, seja quem for, são engraçados. Abominam o cigarro; o tabaco causa câncer, mata, polui... Um horror. Claro, concordo e não há dúvida em relação à associação direta entre cigarro/doença/morte. Por isso minha pergunta lhe causou embaraço, pois, ou uma pessoa fuma, ou não fuma. Você não considera, ao menos sem lógica, o combate público ao tabaco e o conto da carochinha que continuamos a espalhar sobre o consumo moderado do álcool? Pensemos aqui na estampa: “beba com moderação”. Ora, o álcool é um perverso e dissimulado vício social cosmopolita...

Tanto no uso esporádico, como no consumo frequente, o álcool causa alterações múltiplas no organismo, e as primeiras reações são sonolência ou agressividade, irritabilidade, agitação, alteração de equilíbrio, vômitos, convulsões.

E, como um agente etiológico importante, com o uso frequente, o álcool pode ajudar a gestar diversas doenças, antecipando os riscos graves à saúde: hepatite alcoólica, gastrite, síndrome de má absorção, hipertensão arterial, acidentes vasculares, cardiografias, diferentes tipos de câncer – esôfago, boca, garganta, cordas vocais, de mama nas mulheres e o risco de câncer no intestino, pancreatite e polineurite alcoólica (dor, formigamento e cãibras nos membros inferiores). Nas mulheres, essas manifestações são mais precoces, todavia; e, ainda, impotência sexual no homem e frigidez nas mulheres.

O álcool, um “falso amigo”, integra sem pudor a cultura ligada à sociabilidade e ao lazer.

O apelo dos meios de comunicação, que incita o consumo das drogas lícitas, assim como a condescendência familiar para o consumo destas substâncias parecem creditar em sua utilização um padrão de vida natural e engajado, o qual se agrega, também por isso, à ideia de rito de passagem para a vida adulta.

Logo, e cada vez mais cedo, mais crianças e adolescentes, querendo integrar-se a “grupos dos maiores”, antecipam o consumo do álcool, embora o ECA seja taxativo à medida que regulamenta o tema no país: para criança e adolescente, o álcool é sempre uma droga ilícita – e não há exceções, nem na casa familiar aos domingos, quando os avós instigam “quebra de vigilância”, afinal... “é só um gole de vinho, e vinho faz bem para o coração...” Boas são as uvas, com ou sem sementes.

Por fim, na viagem de trabalho, a mulher me contou, enquanto tomávamos um chá gelado no canto quieto de uma sala vazia da escola: anos atrás eu fumava. Um dia, no final da faculdade, estava nervosa em uma reunião de trabalho, pressionada pela equipe do estágio. Acendi um cigarro. Ficaram chocados e alguns me pediram, e até de forma deselegante, para eu apagar o cigarro. Respondi que só apagaria se alguém ali dissesse que não consumia álcool. Uma moça replicou dizendo que só bebia socialmente. Ela me deu a oportunidade. Disse que só apagaria se houvesse alguém ali que não bebesse nada de álcool, pois, ou somos bebedores, ou não somos, e simples assim! Ou seja: fumei meu cigarro até o fim e todo mundo conivente em silêncio. Senti-me a própria adúltera, mas salva pela justiça das palavras do Cristo. Cegos não podem querer guiar outro cego no desfiladeiro.

O pior, completei, é que estamos, e cada vez mais cedo, levando nossas crianças e nossos adolescentes para o desfiladeiro. Porém, mas pior, concorremos para o êxito da cegueira...


Notas:

1- De acordo com a OMS, cinco fatores proporcionam o abuso de substâncias ilícitas e lícitas (álcool, entre elas): falta de informação sobre o problema, dificuldade de inserção no meio familiar e no trabalho, insatisfação com a qualidade de vida, problema de saúde, facilidade de acesso às substâncias.

2- O padrão de uso pesado de álcool por tempo determinado (um fim de semana, por exemplo) é chamado pelos especialistas de uso “binge” de álcool, ou, em português, “BPE” (beber pesado episódico). Ele é definido pelo consumo de 5 ou mais doses de bebida alcoólica de uma só vez pelos homens, e de 4 ou mais doses para as mulheres. E também é usado por indivíduos que bebem até a embriaguez.

3- Última pesquisa sobre o álcool indica que a idade inicial de consumo, no Brasil, está na faixa de 15 anos de idade (Cf. Lenad – Levantamento Nacional de Álcool e Drogas), embora seja considerado este número controverso – em muitos locais no país, crianças com menos de 11 anos já fumam e consomem álcool. E dos jovens que declaram beber, grande parte faz uso em forma de “binge”, ou seja, consome muito e em um curto espaço de tempo (cerca de duas horas e toda semana).

4- O abuso do álcool determina mortalidade precoce. Na Suécia, perto de 25% dos óbitos abaixo de 50 anos foram atribuídos ao álcool.

5- São fatores protetores ligados à resiliência (logo, associados à evitação do uso de álcool por crianças e adolescentes): família estruturada, participação efetiva dos pais (*ou da mãe, ou do pai, a depender da situação familiar – o importante é a existência, ou seja, a estabilidade desta participação) na vida dos filhos, determinando regras claras de conduta no núcleo familiar, pois isso vai favorecer recursos internos diante das frustrações; rendimento escolar satisfatório ou assistido; relações com outros núcleos da comunidade – igrejas, centros espíritas, templos etc. (espaço para a religiosidade), grupos desportivos, adoção de normas preventivas a respeito de substâncias ilícitas e lícitas (álcool/tabaco); práticas de voluntariado.

6- Não foi pretensão tratar do alcoolismo neste escrito, mas sim da “conduta social do álcool” e com foco no menor. Contudo, quando o alcoolismo domina? O alcoolismo se instala “quando se observa uma perda de controle sobre o uso do álcool, de modo que o usuário não tem mais autonomia e se torna dependente”. (Edmilson Antunes de Campo, professor da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP.)

7- Para saber mais, consulte: Blum, R. W. Adolescent substance use and abuse. Arch Pedriatr Adolesc. Med. 1997; 151:805-8.



 


Voltar à página anterior


O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita