WEB

BUSCA NO SITE

Edição Atual Edições Anteriores Adicione aos Favoritos Defina como página inicial

Indique para um amigo


O Evangelho com
busca aleatória

Capa desta edição
Biblioteca Virtual
 
Biografias
 
Filmes
Livros Espíritas em Português Libros Espíritas en Español  Spiritist Books in English    
Mensagens na voz
de Chico Xavier
Programação da
TV Espírita on-line
Rádio Espírita
On-line
Jornal
O Imortal
Estudos
Espíritas
Vocabulário
Espírita
Efemérides
do Espiritismo
Esperanto
sem mestre
Divaldo Franco
Site oficial
Raul Teixeira
Site oficial
Conselho
Espírita
Internacional
Federação
Espírita
Brasileira
Federação
Espírita
do Paraná
Associação de
Magistrados
Espíritas
Associação
Médico-Espírita
do Brasil
Associação de
Psicólogos
Espíritas
Cruzada dos
Militares
Espíritas
Outros
Links de sites
Espíritas
Esclareça
suas dúvidas
Quem somos
Fale Conosco

Crônicas e Artigos

Ano 7 - N° 323 - 4 de Agosto de 2013

JOSÉ ESTÊNIO GOMES NEGREIROS
estenionegreiros@hotmail.com
Fortaleza, CE (Brasil)

 
 


Caridade e beneficência


“(...) Mas quando fizerdes um festim, convidai para ele os pobres, os estropiados, os coxos e os cegos; e estareis felizes porque não terão meios para vo-lo retribuir; porque isso vos será retribuído na ressurreição dos justos.” (Lucas-XIV, 12-15)
 

Charles-François “Bem-Vindo” Myriel, Bispo de Digne, pequena localidade da antiga França, é um dos personagens do majestoso livro Os Miseráveis, de Victor Hugo. Em 1815 era ele um venerável ancião de setenta e cinco anos. Havia sido nomeado bispo por interferência direta de Napoleão – antes fora pároco da igreja de Brignolles. A curiosa circunstância da sua nomeação deveu-se a um encontro casual de Myriel com o Imperador, em Paris, em 1804, quando aguardava uma audiência com o Cardeal Fesch, tio de Napoleão. Na antessala, vendo que o Bispo o olhava curiosamente, perguntou Napoleão a um de seus oficiais:

Quem é aquele pobre velho que tanto olha para mim?

Ouvindo a interrogação, o velho padre respondeu diretamente ao Imperador:

Senhor, Vossa Majestade olha para um pobre velho; eu olho para um grande homem. Ambos podemos aproveitar.

Decorridos poucos dias desse rápido diálogo, Myriel foi nomeado Bispo de Digne, onde, tempos depois, passou a ser conhecido simplesmente por Monsenhor Bem-Vindo, em razão das suas atitudes de desprendimento das coisas materiais e da dedicação ao amparo dos mais pobres e desvalidos naqueles tempos de graves dificuldades políticas e econômicas que a França atravessava.

Por aquela época havia em Digne um acanhado e miserável hospital de um único andar, enquanto o paço episcopal era uma bela construção de pedra de cantaria em que tudo respirava grandeza. Três dias depois de sua posse Monsenhor Bem-Vindo visitava o hospital que, naquele momento, abrigava vinte e seis doentes. Em conversa com o diretor, que o pôs a par das grandes dificuldades daquele nosocômio, assim lhe falou:

Aqui há engano. Os senhores são vinte e seis pessoas, em cinco ou seis quartos, enquanto nós na casa paroquial somos três ocupando um lugar que chega para sessenta.

No dia seguinte mudou-se com sua irmã e uma criada que com ele moravam, para o hospital, transformando-o na casa paroquial, e transferiu o hospital para o palácio do Bispo.

Deva-se dizer que aquele Bispo nada recebia de sua família que fora arruinada pela revolução. Sua irmã, Baptistine, recebia uma pensão vitalícia de quinhentos francos. Era desse salário que basicamente viviam os três habitantes da casa paroquial.

Como bispo, Myriel recebia do Estado uma dotação de quinze mil francos. No mesmo dia em que passou a residir na casa que antes fora o hospital, fez uma lista que denominou <Rol de despesas da minha casa>, na qual distribuía toda a verba a que tinha direito, entre o seminário, as congregações missionárias, os lazaristas, os estabelecimentos religiosos, a associação para socorro dos presos e da melhora das condições das prisões, entre outras instituições, reservando apenas mil libras para o que chamou de "minhas despesas pessoais". Estas disposições prevaleceram inalteradas até o fim do seu episcopado.

A Câmara de Digne assinalou a Monsenhor Bem-Vindo um subsídio anual de três mil francos destinado a "despesas de carruagem e gastos de jornada nas suas visitas pastorais". Logo que recebeu tal determinação, escreveu uma relação que entregou a sua irmã e administradora da casa, com a seguinte determinação:

Dinheiro para carruagem e visitas ao bispado

Para dar caldo de carne aos doentes do hospital... 1.500 libras

Para a Sociedade de Caridade Maternal de Aix... 250 libras

Para a Sociedade de Caridade Maternal de Draguignan... 250 libras

Para os enjeitados... 500 libras

Para os órfãos... 500 libras

Total... 3.000 libras.

Os serviços prestados por ele aos mais abastados, tais como dispensa de proclamas, casamentos, benzeduras de igrejas etc., o Bispo cobrava-lhes severamente para facilmente distribuir tais rendimentos com os pobres. Como dava tudo o que recebia aos necessitados e indigentes, estava sempre desprovido de dinheiro. No dizer de Victor Hugo “era como um pouco de orvalho em terra seca”. Bondoso e afável, nos seus sermões, tal qual Jesus Cristo, ia sempre buscar os exemplos que aconselhava serem seguidos pelo seu rebanho, nos bons procedimentos dos próprios habitantes da sua diocese.

Conversava alegremente com todos. Sua criada, Magloire, chamava-o de "Vossa Grandeza". Certa vez, quando não alcançava um livro que buscava em sua biblioteca, a ela dirigiu-se nestes termos:

Sra. Magloire, traga-me uma cadeira que “a minha grandeza” não chega àquela prateleira!

Como não se achava no direito de julgar ou condenar quem quer que fosse, limitava-se a dizer a quem o consultava sobre os procedimentos ou ações infelizes cometidas por alguém:

Examinemos o caminho que seguiu a culpa.

Mesmo se apelidando, com o seu constante bom humor, de um “ex-pecador”, não era rigoroso no que diz respeito às virtudes que os homens devem cultivar. Eis em que se constituía a sua doutrina:

“O homem tem sobre si a carne, que é a eterna carga que arrasta, a constante tentação a que cede”.

“O seu dever é vigiá-la, contê-la, reprimi-la e só lhe obedecer em caso de extrema necessidade. Essa obediência pode ser um pecado, mas o pecado assim cometido é venial. É cair, mas cair de joelhos, sendo por isso queda que pode acabar em prece.”

“Ser santo é exceção; a regra é ser justo. Errem, caiam em tentação, pequem, mas sejam justos.”

“Pecar o menos possível é obrigação de todo homem; não pecar absolutamente é aspirar a anjo. Tudo o que é terrestre está sujeito ao pecado. O pecado é uma gravitação.”

Tolerava indulgentemente as mulheres e as pessoas pobres, sobre quem naqueles recuados tempos sempre recaíam as condenações e as culpas de todos os males que afligiam a sociedade de então, contaminada pelo orgulho e pelo preconceito. Sobre isso, assim dizia: “As culpas das mulheres, dos filhos, dos criados, dos fracos, dos indigentes e dos ignorantes são culpas dos maridos, dos pais, dos patrões, dos fortes, dos ricos e dos sábios!”.

Perdoava incondicionalmente as ofensas, como por exemplo, no caso do roubo de uma cesta cheia de prataria, subtraída da casa paroquial por Jean Valjean, personagem central de Os Miseráveis, e a quem havia acolhido em sua casa quando aquele pobre homem vagava pelas ruas de Digne, desamparado, sem destino, com fome e com frio, após amargar longos dezenove anos numa prisão de Toulon, como sentenciado das galés, e da qual fora libertado poucos dias antes. Sua condenação inicial se dera por haver quebrado uma vidraça e furtado um pão de uma padaria para mitigar a fome da família. As outras sentenças posteriores lhe foram impostas por seguidas tentativas de fuga.

Na noite em que foi acolhido pelo Bispo, Jean Valjean contou-lhe a sua triste trajetória, dizendo-lhe ao final da narração:

Senhor abade, o senhor é muito bom e por isso não me despreza. Recolhe-me em sua casa. Manda acender os seus castiçais ricos por meu respeito. Porém eu já lhe disse de onde venho e lhe contei a minha desgraça.

O Bispo respondeu-lhe:

Podia ter deixado de me dizer quem era. Esta casa não é minha, é de Jesus Cristo. Aquela porta não pergunta a quem entra se tem nome, mas se tem alguma amargura. O senhor sofre; tem fome e sede; bem-vindo seja! Não me agradeça por isso, não diga que o recebo em minha casa. O dono desta casa não sou eu, é todo aquele que carece de asilo. Tudo quando há nesta casa lhe pertence. Que precisão tenho eu de saber o seu nome? Quanto mais, antes de me dizer, eu já sabia o nome que lhe havia de dar.

O senhor já sabia como eu me chamo? Indagou Valjean.

Sabia – respondeu Bem-Vindo. – chama-se meu irmão!

Naquela mesma noite Jean Valjean sairia furtivamente levando toda a prataria da casa do sacerdote. Descoberto e preso confessou o roubo. A prisão significava para ele uma nova condenação e o retorno às galés, haja vista que se achava sob liberdade condicional. A polícia o trouxe à presença do Bispo. Quando viu a cena, o preso amarrado e escoltado, Bem-Vindo – que já sabia do que se tratava, pois o roubo havia sido descoberto logo cedo pela criada Magloire – dirigiu-se assim a Jean Valjean:

Ah! Então voltou? Estimo muito vê-lo. Mas agora me lembro: eu também lhe dei os castiçais, que são de prata, como o resto, e com que pode obter duzentos francos ou mais. Por que não o levou juntamente com os talheres?

Entregou os castiçais a Valjean, que nada entendera, dispensou os policiais e em seguida segredou-lhe:

Não se esqueça, não se esqueça nunca de que me prometeu empregar este dinheiro em se tornar um homem honesto.

Valjean ficou sem saber o que dizer, mesmo porque não prometera nada.

E o Bispo arrematou:

Jean Valjean, meu irmão, lembre-se de que já não pertence ao Mal, mas sim ao Bem. É a sua alma que acabo de comprar-lhe; furto-a aos maus pensamentos e ao espírito de perdição para a dar a Deus.

Jean Valjean nunca mais se desfaria dos castiçais nem esqueceria aqueles conselhos. O resto da história, o leitor que ainda não a conhece saberá lendo Os Miseráveis.

Charles-François “Bem-Vindo” Myriel foi sem dúvida o modelo de um santo. Seus exemplos de bondade e suas lições espelhadas nos ensinamentos de Jesus não se resumem nestes trechos acima citados. Existem muitos outros no capítulo que Victor Hugo lhe dedica. Praticou a Caridade e a Beneficência puras na sua plenitude, conforme nos é ensinado através das comunicações mediúnicas feitas pelos Benfeitores Espirituais e constantes no capítulo XIII de O Evangelho segundo o Espiritismo. 


Bibliografia

Os Miseráveis, de Victor Hugo.

O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec.
 



 


Voltar à página anterior


O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita