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Ano 6 - N° 265 - 17 de Junho de 2012

JOSÉ CARLOS MONTEIRO DE MOURA 
jcarlosmoura@terra.com.br 
Belo Horizonte, MG (Brasil)

 


José Carlos Monteiro de Moura

Direito e Justiça. Direito e Moral. Um conflito a resolver


 
1
 Giorgio Del Véchio, um dos grandes nomes da Filosofia do Direito, professor da  Universidade de Bolonha, a mais tradicional e antiga da Europa, inicia sua obra clássica A JUSTIÇA (Ed. Saraiva, São Paulo, 1960,  p. 1) lembrando as numerosas e graves disputas que se têm travado em torno da noção  de direito  e realçando que “maiores todavia são  as dúvidas e divergências que se movem em torno do conceito de justiça: umas vezes é tomado como sinônimo e equipolente do primeiro, outras vezes, pelo contrário, como distinto e superior a ele”. Destaca a verdadeira tautologia que se estabeleceu a respeito, afirmando que “sob certo aspecto, faz-se consistir a justiça na conformidade com uma lei: mas, por outro lado, afirma-se que a lei deve ser conforme com a justiça”. 
 

A questão é extremamente preocupante, e atinge indistintamente todos os ramos do Direito. Uma longa militância na área criminal, de um modo especial no Tribunal do Júri, permitiu-nos defrontar,  vezes sem conta, com o terrível conflito entre o legal  e o justo,  pois o Júri, no Brasil,  nos termos de sua competência constitucional,  julga os  crimes  dolosos contra a vida (homicídio,  induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, infanticídio  e o aborto), e as suas decisões, tanto absolutórias como condenatórias,  dificilmente podem ser tomadas como modelos de justiça. O latrocínio (matar para roubar),  vulgarmente chamado de assalto não integra esse rol, por ser crime contra o patrimônio. O julgamento de quem o comete é da alçada do Juiz de Direito. 
 

2. As decisões do Júri podem apontar na direção de autênticas anomalias éticas, não obstante plenamente acobertadas, resguardadas e legitimadas pelo Direito.  Além de ser um tribunal formado por leigos, aos quais estranhamente se submetem complexas indagações de direito, as suas origens não o recomendam. Alguns, como salienta Vicente de Paulo Vicente de Azevedo (CURSO DE DIREITO JUDICIÁRIO PENAL, Ed. Saraiva, São Paulo, 1958, V. II, pp. 176 e ss.), vão  encontrá-las na Grécia e em Roma. Na primeira, na instituição dos heliastas. Eram cidadãos, de nível inferior em cultura e educação, que julgavam ao ar livre (daí a denominação de heliastas, palavra derivada de helios, sol). Suas decisões mais notáveis foram o exílio de Aristides, por se acharem cansados de ouvi-lo chamar o justo, e a condenação de Sócrates a beber cicuta, por idênticas e mesquinhas razões.  

 

O Brasil é um dos poucos países que insistem
em manter o Tribunal do Júri

 

Em Roma, os pesquisadores encontram traços comuns do Júri atual com os judice jurati. O modelo romano, a exemplo do brasileiro, adotava a faculdade de alguns jurados poderem ser recusados. Porém, as razões das recusas não o dignificavam, porquanto ou o jurado se vendia por um preço tão vil que todos os interessados podiam pagar e, por conseguinte, ninguém se sentia seguro quanto ao veredicto, ou a venda era por um preço tão alto, que só os ricos podiam beneficiar-se com suas decisões!


Todavia, suas origens mais próximas remontam a 1215, quando o Quarto Concílio de Latrão aboliu as ordálias ou julgamentos de Deus. De acordo com essa forma de julgar, o acusado deveria provar sua inocência mergulhando, sem dano, a sua mão em água ou azeite fervente ou colocando-a sobre um ferro em brasa, quando não se via forçado a submeter-se a um duelo, em que, normalmente, prevalecia a força ou a destreza, que nem sempre correspondiam à sua alegada inocência.  Em face da proibição conciliar, os clérigos ingleses, invocando as tradições e crenças que dominavam os espíritos daquela época, criaram o Tribunal do Júri. A sua base repousa sobre a convicção reinante de que, assim como os doze apóstolos haviam recebido a visita do Espírito Santo, doze homens de consciência pura, reunidos sob a invocação divina, atrairiam infalivelmente a verdade para o meio deles.  Da Inglaterra, ele passou para a França depois da Revolução de 1789, como uma das formas de exercício da democracia.  O Júri francês, no entanto, adotou critérios diferentes, seja no que se refere ao número de jurados, seja quanto à forma de julgamento. Foi nele que se inspirou a instituição hoje vigente no Brasil.  Atualmente, entretanto, já não mais existe naquele país, tendo sido substituído pelo Escabinado.


O Brasil é um dos poucos países que ainda insistem em manter o Tribunal do Júri, erigido, inclusive, à condição de direito e garantia fundamental pela Constituição de 88, repetindo velha tradição que vem desde a de 1946.


3
. A fragilidade e imperfeição da justiça humana decorrem naturalmente de sua própria natureza. Dependem do grau de evolução moral de um povo e refletem aquilo que ele foi, ou é, num determinado instante de sua história. Daí a razão por que as chamadas noções prévias de direito e de justiça, embora inatas ao homem, estão, muitas vezes, eivadas de conceitos, preconceitos e conotações típicas da cultura popular, nem sempre consentâneas com a moral.

 

Conforme a doutrina espírita, justiça é 
cada um respeitar os direitos dos demais”

 

Assim, o habitante do Brasil colônia, da mesma forma do que ocorria em Portugal e na Espanha, não se insurgia, a não ser excepcional e esporadicamente, contra os verdadeiros descalabros do LIVRO QUINTO DAS ORDENAÇÕES DO REINO DE PORTUGAL (ORDENAÇÕES FILIPINAS), que vigorou entre nós, no que diz respeito ao Direito Penal, até 1830, quando foi editado o Código Criminal do Império.


O fanatismo e a ignorância religiosa, bem como atraso cultural, vigentes influenciavam e definiam os sentimentos de direito e de justiça predominantes na época, apesar dos absurdos que, aos nossos olhos, eles continham. Quando os autores espirituais da Codificação definiram a justiça em função do respeito devido aos direitos alheios, e informaram sobre as origens desses direitos (Questão 875 e 875-a de O LIVRO DOS ESPÍRITOS), estabeleceram duas fontes principais: a lei humana e a lei natural. A primeira acompanha os usos e costumes, e os direitos dela decorrentes são mutáveis para melhor, à medida que se verifica o avanço do progresso moral. São deles as palavras: “Vede se hoje as vossas leis, aliás imperfeitas, consagram os mesmos direitos que as da Idade Média. Entretanto, esses direitos antiquados, que agora se vos afiguram monstruosos, pareciam justos e naturais naquela época. Nem sempre é acorde com a justiça o direito que os homens prescrevem”.  


4
. No entanto, mesmo à vista de todos os seus erros e deficiências, nenhum homem deixa de trazer consigo, no imo de sua alma, o germe da justiça, cuja essência é a lei natural: “No coração do homem imprimiu Deus a regra da verdadeira justiça, fazendo com que cada um deseje ver respeitados os seus direitos (L.E., questão 876).


Compete-lhe, pois, desenvolvê-la e aperfeiçoá-la, de modo a ensejar que o direito por ele elaborado seja o mais justo e honesto possível, e que se torne um efetivo instrumento da verdadeira justiça, conforme preconiza Gustav Radbruch (FILOSOFIA DO DIREITO, Coleção Stvdvivm, Arménio Amado, Editor, Coimbra, Portugal, 1961, p. 34), que o entende como “uma realidade que tem o sentido de se achar ao serviço da Justiça”.  Todavia, conforme já visto, a justiça consiste em cada um respeitar os direitos dos demais”, razão por que esse respeito somente pode ser devido quando o direito em questão estiver concorde com a ética.

 

Segundo Moisés, Jeová lhe teria entregue diretamente
os Dez Mandamentos

 

Não se cogita aqui de qualquer distinção entre ética e moral, como pretendem alguns. Tal distinção não existe, desde quando a palavra foi utilizada pela primeira vez por Aristóteles em sua ÉTICA A NICÔMACO, e teve seu sentido referendado por Cícero ao dizer: “quod ethos illi vocant, nos decet nominare moralem” (o que eles chamam de ético, nós denominamos moral). Fora disso,  prevalecerá a velha máxima romana: “nom omne quod licet, honestum est” (nem tudo que é lícito é honesto).


5.
 Essa contradição ou oposição entre direito, justiça e moral estimulou o homem na procura de um fundamento superior para o primeiro, a fim de permitir-lhe sua adequação com o justo e uma melhor sintonia com o verdadeiro sentimento de justiça, que dormita nos refolhos de sua consciência.   

Nessa busca, ele seguiu o caminho do retorno a Deus como a principal fonte do direito, embora lhe fosse muito difícil conviver com o Deus antropomorfo, feito à imagem e semelhança do homem, portador, em grau superlativo, de seus erros e defeitos milenares. As leis, quase sempre injustas e arbitrárias, refletiam essa situação, porquanto, seguindo uma tradição que remontava aos primitivos agrupamentos sociais, imputava-se à divindade a condição de principal legislador.  Assim, a mais antiga legislação conhecida, o Código de Hamurabi, que data do XXIII século a.C., teria sido transmitida diretamente ao rei babilônico por Marduque, seu deus-sol; Zaratrusta afirma que recebeu suas leis, no cimo de uma montanha, diretamente de Ahura Mazda, e Moisés legou aos judeus os Dez Mandamentos como resultado de uma entrega direta que Jeová lhe fez, no alto do Sinai. O caráter divino do direito não impedia, contudo, que ele refletisse invariavelmente ou a vontade exclusiva do legislador ou o interesse de minorias privilegiadas. Tal fato acabou por implicar a falência do legislador divino. Deus estava, iniludivelmente, a serviço dos fortes e poderosos, e os mais fracos e socialmente menos favorecidos deveriam, curvando-se diante de sua caprichosa vontade, permanecer pacientemente nas suas sofridas situações.  Somente lhes competia continuar servindo aos objetivos exclusivos de seus senhores, dentre os quais pontificavam, em todas as épocas e em todas as religiões, os membros da classe sacerdotal.  

 

Na cultura judaico-cristã, o Decálogo continua
sendo a “Constituição Divina”

 

Os deuses, de toda espécie e categoria, assim como seus pseudorrepresentantes na Terra, nada mais fizeram do que intimidar, explorar e enganar o homem.  O Cristianismo, paradoxal e contraditoriamente, foi a religião que mais se esmerou nesse mister. Desconheceu, com estranha e sistemática tendência, o Pai amoroso, justo e bom de que Jesus tanto falou, e cultivou o ser ciumento e vingativo, que pune “a iniquidade dos pais nos filhos, na terceira e na quarta geração daqueles que me aborrecem”, colocando-o sempre a serviço de interesses inconfessáveis e desonestos daqueles que se arvoraram em seus dirigentes na Terra...


6
. Essa situação criou um obstáculo, cuja transposição ou remoção somente começou a ser vislumbrada a partir do surgimento de uma nova mentalidade, formada e sedimentada em torno das noções de liberdade, solidariedade e fraternidade que o Iluminismo desenvolveu, e que propiciaram, no momento oportuno, a eclosão das vozes do além, conclamando o homem para o seu verdadeiro destino e retomando a ideia do Deus-Pai-Criador pregada por Jesus. Concomitantemente, no âmbito da Filosofia, a Teoria do Direito Natural, que havia despontado desde antes da era cristã em Atenas, sustentava a existência de princípios absolutos, metapositivos, correspondentes às exigências fundamentais da natureza humana, deduzidos ou estabelecidos pela razão, anteriores e superiores ao governante e ao direito positivo, cujo respeito pelo legislador constitui pressuposto fundamental de um Estado justo.  A teoria recebeu uma acolhida quase unânime dos pensadores, da antiguidade aos nossos dias. Foi consagrada por Cícero na sua oração Pro Milone, em que a reputou um direito natural derivado da necessidade – non scripta sed nata lex , admitida por São Tomás de Aquino, que, todavia, a desfigurou ao submetê-la à interpretação exclusiva da Igreja, e hoje encontra o apoio de notáveis nomes da filosofia do Direito, como é o caso do já citado Giorgio Del Véchio.    


7.
 Para nós, herdeiros da cultura judaico-cristã, o Decálogo constitui a “Constituição Divina”, porquanto nele se contém, sinteticamente, todo o ordenamento jurídico ideal. Jesus, o seu grande hermeneuta, reduziu-o a dois princípios fundamentais: o amor a Deus e o amor ao próximo.

 

A fonte primordial das injustiças de toda ordem
que ainda grassam na Terra

 

Entretanto, atento ao fato de que o homem ainda não estava, como ainda não está, preparado para conduzir-se na Terra apenas pela lei do amor, explicou, comentou e elucidou o sentido dos dois mencionados princípios no incomparável Sermão do Monte, estabelecendo normas de conduta, de claro e imperativo conteúdo, capazes de ensinar à humanidade como aplicar a referida lei. Mais tarde, Allan Kardec, assessorado e instruído pelos Espíritos Superiores, expôs, em linguagem acessível ao entendimento e assimilação de todos, os fundamentos filosóficos, sociológicos e jurídicos que, no decorrer dos séculos, nortearam o pensamento dos que procuraram conceituar o Direito Natural. E, a exemplo do que outros já haviam feito, ele os identificou com a própria Lei Divina. Só que, desta feita, os argumentos e raciocínios apresentados se caracterizaram pela lógica, pela racionalidade e pela simplicidade, desprezando-se o apelo às elucubrações filosóficas e jurídicas, de compreensão limitada a um pequeno grupo de iniciados.


A Parte Terceira de O LIVRO DOS ESPÍRITOS encerra em si tudo aquilo de que o homem necessita para, progressivamente, diminuir a imensa distância que ainda existe entre Direito e Justiça, Direito e Moral.  A tarefa que originariamente competia ao Cristianismo executar transferiu-se, a partir de 1857, para o campo mais restrito de seu segmento quantitativamente mais modesto, ou seja, o Espiritismo.  As dissensões que marcaram a história cristã, aliadas aos excessos cometidos por Roma, a intolerância e o radicalismo que ela cultivou e adotou, projetaram-se, infelizmente, para o seio das Igrejas Reformadas, impedindo que o homem aprendesse a amar a Deus, ao invés de temê-lo, amar ao próximo, ao invés de tê-lo como adversário, competidor ou inimigo. Essa situação fomentou ainda mais o egoísmo e o egoísmo, assim exacerbado, ensejou a elaboração de leis desumanas, cruéis, ambiciosas, eivadas de interesses de classes, imorais ou amorais, enfim, numa palavra, injustas. Pretender que, de um dia para o outro, o Espiritismo acabe com tal estado de coisas configura incontestável utopia. Contudo, seus adeptos podem e devem contribuir, na medida de suas possibilidades e no âmbito de suas atividades, para que uma nova consciência seja formada, a fim de permitir que a humanidade de amanhã não venha a conviver com as injustiças de toda ordem que ainda grassam na Terra, cuja fonte primordial ainda é, do ponto de vista social, esse malfadado e eterno conflito entre o Direito, a Justiça e a Moral.
 


                                                


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