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Ano 3- N° 109 – 31 de Maio de 2009

ABEL SIDNEY
abelsidney@gmail.com
Porto Velho, Rondônia (Brasil)

 

A transitória maldade humana

Para a Doutrina dos Espíritos o mal é criação do próprio homem e
não tem existência senão temporária, transitória, uma vez
que faz parte do aprendizado

(Parte 2 e final) *

 

“E as paixões hoje são quase as mesmas de ontem, senão mais açuladas,
mais violentas e devastadoras no homem, que prossegue
inquieto.” - Joanna de Ângelis

 

Pesquisando na Internet sobre este tema de que estamos tratando, encontramos uma interessante dissertação de mestrado na área da Psicologia Social que, em resumo, trata da relação entre maturidade, estabilidade emocional e altruísmo. A autora desse trabalho investigou o perfil daqueles que adotam crianças, tendo comparado o grupo que  adota  crianças  ainda  bebês  e aqueles que o fazem

Abel Sidney

com crianças maiores. Ao final concluiu-se que “os adotantes tardios realmente mostraram-se mais maduros, estáveis emocionalmente e mais altruístas do que os adotantes convencionais”.

 

Sentir é causar

 

Buscando a equivalência do conceito de abnegação e altruísmo, podemos inferir que aqueles que se devotam ao próximo, esquecidos de si mesmos, têm por resposta, em decorrência direta, uma maior maturidade e estabilidade emocional (enfim, os sentimentos de plenitude, de paz, tão almejados por todos). Abnegar-se, no caso específico das adoções tardias, isto é, de crianças maiores, com 2 ou mais anos, é romper com as convenções, assumir o sacrifício da adaptação, dar-se em maior cota de amor para integrar a criança à nova família.

 

Podemos parafrasear Martin Claret e afirmar que sentir é causar. Isto é, aqueles que experimentam, exercitam sentimentos elevados, aqueles voltados ao bem-estar do próximo modificam suas próprias vidas. Causam transformações no campo de manifestações das emoções, adquirindo o que se denomina frequentemente de equilíbrio ou centramento psicológico (“Fulano é uma pessoa centrada, equilibrada”).

 

Por outro lado, sentimentos pouco elevados, carregados de apego ao ego, causam também, ou seja, promovem também modificações em nossas vidas – pessoais e coletivas. A discriminação étnica, racial, que tem causado tantos problemas no mundo, é exemplo disso. Os resultados, no mais das vezes, são tragédias, quer pessoais, grupais ou coletivas (o extermínio dos judeus, já citado; a perseguição aos ciganos no leste europeu; as sutis discriminações aos negros brasileiros e outros lamentáveis exemplos).

 

O combate ao mal

 

Por não sabermos ainda produzir, em nossos pensamentos, atitudes e ações, o bem em toda a plenitude, estamos às voltas com as sobras, com os resíduos das nossas paixões, de que devemos nos livrar, conforme propomos no início deste texto. Não é simples, porém, nos livrarmos do mal que produzimos. Mal que nasce em nós, nos impregna e temporariamente passa a fazer parte de nossa personalidade.

 

Para atingir tal intento é preciso vigiar, como sentinelas atentos, as fontes do próprio coração, de onde afinal provém todo o mal, como nos ensinou Jesus, quando lançou uma pergunta que continua atual: “... como podeis vós dizer boas coisas, sendo maus? Pois do que há em abundância no coração, disso fala a boca”. (Mateus 12:34.)

 

Paulo de Tarso na sua carta aos romanos (7:19) tece comentários sobre as lutas que se deve travar para combater o mal em nós mesmos, em frase já célebre: “Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse faço”.

 

Prosseguindo nesta linha de argumentação podemos levar a pensar que o mal de que estamos falando é algo medonho, terrível, execrável – e poderíamos citar aqui certas manifestações do mal que tenham realmente uma tal face. Alguém poderia dizer a si mesmo: “Bem, deste tipo de mal felizmente eu estou livre...” Pois bem, o mal, porém, de que estamos a tratar, não se restringe às suas manifestações mais grotescas, trágicas. E por isso está tão presente em nós. O mal de que fala Paulo em suas epístolas é o mal corriqueiro que vive em nós e é alimentado por nós mesmos. E que, em certa medida, nos proporciona prazer. Daí a nossa dificuldade de nos desembaraçarmos dele...

 

Retomando a questão do abuso dos instintos, temos um mal tão comum hoje que a ninguém repugna em princípio: o comer em excesso. Nele está presente o instinto de conservação. A natureza estabeleceu para algumas das funções desse instinto a sensação de prazer, reconforto, saciedade, como forma de regulá-lo. E ao extrapolarmos os instintos, abusando deles, apegamo-nos às sensações e nos viciamos literalmente no hábito de comer em demasia, não mais para nos alimentarmos, mas para extrairmos prazer, bruto ou sofisticado, desse ato. É preciso ainda acrescentar que podemos nos dar aos excessos apoiados confortavelmente em mil dissimulações, disfarces, desculpas, prontamente aceitas pelos outros, condescendentes que somos com os desvios alheios, tanto quanto com os nossos.

 

Os maus hábitos de cada dia tendem, por vezes, a se perpetuar em nossas vidas por diversos motivos, entre outros, a própria aprovação social dos mesmos. Vivendo em uma sociedade ainda marcadamente materialista e hedonista, não é de surpreender que nos vejamos impelidos a aceitar como natural todas as atrações da matéria e todos os prazeres que isto proporciona.   

 

A luta sem tréguas e sem quartel contra o mal que existe ainda em nós exige não apenas conhecimento, mas sobretudo um grande esforço de vontade deliberada e consciente, pois estagiamos ainda próximos das nossas experiências no reino da animalidade; daí nos sentirmos atraídos, arrastados por certas facetas das más paixões. Por isso, não raro, apesar de toda a consciência do bem e do mal, nossos atos de rebeldia ou de invigilância nos embaraçam nas tramas de experiências totalmente dispensáveis que trazem por consequência, direta ou indireta, dores e responsabilidades.

 

Muitos de nós sucumbimos a estas experiências dispensáveis por estarmos desatentos ao cumprimento dos deveres que nos cabe realizar, às vezes penosos. Para fugirmos à rotina, que nos constrange mas também nos livra de muitos problemas, nos lançamos em certas aventuras que nos causam problemas sem fim.

 

Outros, desejando testar inconsequentemente suas próprias resistências, findam por abrir a caixa de Pandora (que segundo a mitologia grega continha todos os males), despertando sentimentos, sensações que deveriam permanecer soterrados, à espera de melhor oportunidade para serem trabalhados, lapidados. Portanto, não tenhamos nunca a mórbida curiosidade de conhecer em toda a extensão a "maldade humana" (a nossa própria e a alheia), cabendo-nos, antes, manter-nos em alerta para evitar que o mal que brota de nós mesmos se alastre e por contágio encontre afinidade com o mal que nasce em outros corações.

 

Conhecer-se para transformar-se

 

Para todos os que desejem sustentar-se na luta sem tréguas, encontramos em Santo Agostinho uma das estratégias mais eficazes de autotransformação (e por consequência de vitória sobre nós mesmos). Trata-se da meditação diária sobre os próprios atos, fundamental se desejamos combater o mal em nós mesmos sistematicamente. A lição agostiniana está inserida na última questão (919 e 919-a) da Parte Terceira (Das leis morais) de O Livro dos Espíritos.

 

Na primeira parte da questão (919) Kardec indaga: “Qual o meio prático mais eficaz que tem o homem de se melhorar nesta vida e de resistir à atração do mal?” A resposta, muito direta e clara, é também concisa: “Um sábio da antiguidade vo-lo disse: Conhece-te a ti mesmo”.

 

Muito arguto, Kardec desdobra a questão buscando solucionar a questão prática que envolve o tema: o como fazê-lo: ”Conhecemos toda a sabedoria desta máxima, porém a dificuldade está precisamente em cada um conhecer-se a si mesmo. Qual o meio de consegui-lo?

 

Santo Agostinho, como resposta, tece muitas considerações, que resumiremos nas linhas a seguir.

 

Devemos interrogar a própria consciência, passando em revista os atos cotidianos, para a identificação dos desvios do deveres que deveriam ter sido cumpridos e dos motivos alheios de queixa por conta dos nossos atos. Por este meio chegou ele, Santo Agostinho, a se conhecer “e a ver o que [nele] precisava de reforma”.

 

Quem se disponha a examinar os atos cotidianos para identificação do bem ou do mal que possa ter feito “grande força adquiriria para se aperfeiçoar”. Acresce ele que se deve rogar a Deus e aos Espíritos protetores esclarecimento, pois “Deus o assistiria” neste sentido.

 

Propõe para o exame dos atos cotidianos o dirigir a si mesmo perguntas, o interrogar-se sobre o que se faz e com que propósito para identificarmos se fizemos algo que censuraríamos se praticado por outra pessoa, e também se fizemos algo que não ousaríamos confessar.

 

Propõe ainda mais, fazendo-nos situar diante da vida na condição daquele que pode retornar ao mundo dos Espíritos a qualquer instante, onde deveremos fazer o balanço dos próprios atos praticados durante a experiência carnal: ao desembarcar no outro lado da vida onde nada pode ser ocultado, teríamos “que temer o olhar de alguém”?

 

A prova de que podemos descansar a consciência está em examinar se nada fizemos contra a Divindade, ao próximo e a nós mesmos.

 

Porque seja difícil a autoavaliação, o autojulgamento por conta das ilusões do amor-próprio, é proposto como meio de verificação isento de ilusão perguntar a si mesmo como classificaríamos nossas próprias ações se praticadas por outras pessoas. Se tivermos motivos para censurar tais ações, torna-se claro que não devemos agir do mesmo modo.

 

Na mesma linha de raciocínio, propõe ele que procuremos verificar o que pensam os outros sobre os nossos atos. E mais: a opinião dos inimigos, por não terem nenhum interesse em mascarar a verdade, não deve ser desprezada, pois eles são um bom meio de advertência, utilizando-se com mais frequência da franqueza do que faria um amigo.

 

Aconselha ainda àqueles que se sintam possuídos do desejo sério de melhorar-se a investigar minuciosamente a própria consciência, a fim de extirpar de si os maus pendores. E tal como ele próprio o fazia, que busquemos fazer um balanço diário de nossas ações morais, para avaliarmos perdas e lucros; os lucros serão maiores que as perdas se assim agirmos.

 

Em seguida Santo Agostinho afirma textualmente: “Se puder dizer que foi bom o seu dia, poderá dormir em paz e aguardar sem receio o despertar na outra vida”. O seu dia, cremos nós, deve ser entendido como a culminância de uma sucessão de dias. De qualquer forma, indica-nos a necessidade de aproveitarmos bem todos os dias, dando atenção ao tempo que costuma fugir-nos das mãos, caso não o administremos bem.

 

Como meio de autoexame da consciência, recomenda que formulemos “questões nítidas e precisas”, não temendo multiplicá-las, de modo a nos interrogarmos acerca de nossos próprios atos. Este diálogo íntimo, que não toma mais que alguns minutos e “alguns esforços”, é meio de conquista da “felicidade eterna”. 

 

Uma vez que muitos têm o futuro como incerto, é que os Espíritos vêm dissipar as nossas incertezas “por meio de fenômenos” capazes de nos ferir os sentidos e de “instruções” (que nos cabe, por nossa vez, também disseminar).

 

O comentário breve de Kardec a esta resposta é digno também de exame. E para tanto tomamos a liberdade de transcrevê-lo literalmente:

 

Muitas faltas que cometemos nos passam despercebidas. Se, efetivamente, seguindo o conselho de Santo Agostinho, interrogássemos mais amiúde a nossa consciência, veríamos quantas vezes falimos sem que o suspeitemos, unicamente por não perscrutarmos a natureza e o móvel dos nossos atos. A forma interrogativa tem alguma coisa de mais preciso do que qualquer máxima, que muitas vezes deixamos de aplicar a nós mesmos. Aquela exige respostas categóricas, por um sim ou não, que não abrem lugar para qualquer alternativa e que são outros tantos argumentos pessoais. E, pela soma que derem as respostas, poderemos computar a soma de bem ou de mal que existe em nós.

 

A título de conclusão

 

Diante da banalização do mal que se espalha pelo mundo dos homens, resta-nos individual e coletivamente nos lançarmos ao bom combate, que é constante, exigindo-nos disciplina e perseverança. A guerra do bem contra o mal, tema de incontáveis livros e filmes, deve ser travada nos domínios dos nossos próprios corações, acima de tudo.

 

Lembrando-nos da alegoria dos ovos da serpente, devemos quebrá-los todos ainda no ninho, antes que libertemos o mal que ainda teima em fazer morada em nós. Se já desencadeamos o mal, somente nos resta sofrer-lhe as consequências, com serenidade e resistência.

 

Se nos embaraçamos nas tramas do mal, não basta arrependermo-nos de nossos atos e nos comprometermos à mudança por desencargo de consciência (ou por quaisquer formas de promessas); é necessário meditarmos profundamente no móvel de nossas ações; é preciso, enfim, mergulharmos a sonda da investigação em nosso espírito para o exame de nossos mais profundos sentimentos e pensamentos.

 

Se a nossa má ação decorreu, por exemplo, do exercício da violência, devemos buscar em nosso coração as raízes desta violência, esteja ela onde esteja; e somente há um meio de extirparmos definitivamente as raízes de todos os males: estarmos de permanente prontidão para domar, controlar-lhes as expressões... Aprende-se nas reuniões dos Anônimos (alcoólicos, em particular) que nossos vícios (as más paixões) não têm propriamente cura, mas tão-somente controle. As lutas sem fim e sem quartel contra o mal exigem-nos, desta forma, uma plena disponibilidade de vigilância e oração.

Caso nossa "meditação" acerca das raízes e frutos do mal seja superficial; caso não examinemos com rigor as causas de nossas ações, fatalmente incorreremos nos mesmos erros, quando as circunstâncias mudarem, quando forem outros os cenários. O motivo da reincidência está em que nós não exercitamos nosso "raciocínio moral", que também se desenvolve como o raciocínio lógico, matemático etc. 

Por outro lado, mesmo que não estejamos às voltas com as expressões mais visíveis do mal, como as paixões humanas tornaram-se mais “violentas e devastadoras, no homem que prossegue inquieto”, segundo Joanna de Ângelis, é possível que as consequências destas paixões nos atinjam, diretamente ou indiretamente. A tendência de nos refugiarmos no nosso mundo ainda preservado do contágio de tantos males pode nos tornar alheios a este mundo de provas e expiações. Mantermo-nos sensíveis à dor do próximo, por mais que isto nos possa incomodar ou constranger, é atitude genuinamente cristã... Refugiar-se na indiferença, como fuga aos incômodos que as dores, as paixões e erros alheios nos causam, não é medida salutar.

 

Necessário se torna que aprendamos com nossas vivências práticas e com os exercícios do “raciocínio moral” e com um farto material de aprendizagem: os erros próprios e os alheios. O aprimoramento ético-moral exige, enfim, reflexão e mergulho em si mesmo. E se necessário for, que revisemos periodicamente nossas quedas e deslizes no campo moral, ativando a memória para nos lembrarmos dos tantos espinhos que já trazemos cravados na "carne do espírito", tal como ensina Paulo de Tarso. Estes espinhos nos lembrarão a nossa condição de enfermos em estágio de longa recuperação, necessitados de cautela... 

 

E no mais, que acreditemos, como em Juízo Final, canção de Nelson Cavaquinho, que “do mal será queimada a semente / o amor será eterno novamente”, tendo a certeza de que todo o império do mal ruirá quando rompermos os elos que mantemos com as porções inferiores de nossa própria individualidade!

 

 

Referências:

EBRAHIM, Surama Gusmão. Adoção tardia: um estudo em termos de altruísmo, maturidade e estabilidade emocional. João Pessoa, 1999. 200p. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade Federal da Paraíba.

FRANCO, Divaldo Pereira. Sol de Esperança (diversos Espíritos). 2ª ed. Salvador: Livraria Espírita Alvorada, 1978.

 

KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 76ª ed. Federação Espírita Brasileira: Rio de Janeiro, 1995.

 

MACEDO, Joel. O mal nosso de cada dia - Filósofa parte do terremoto de Lisboa para mostrar como o mal deixou de ser divino para se tornar criação do homem. Disponível em http://jbonline.terra.com.br/jb/papel/cadernos/ideias/2004/03/05/joride20040305001.html. Acesso em 7 mar. 2004.

 

* A primeira parte deste artigo foi publicada na edição 108, de 24 de maio de 2009, desta revista.
 

 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita