Diálogo imprevisto
O devoto, ao ver Jesus em sonho, exclamou perplexo:
— Senhor! Senhor!… Há tanto tempo, aguardo este encontro
e somente hoje…
O Eterno Benfeitor valeu-se da reticência e indagou:
— Como assim, se ainda hoje fugiste de mim, quatro
vezes, em tua própria casa?
E ante o devoto espantado, comentou brandamente:
— Quando te encolerizaste contra o avô que te exigia
mais apreço, quando negaste apoio ao irmão perdulário
que voltava a buscar-te em penúria, quando não perdoaste
ao filho que te desacatou os pontos de vista e quando
condenaste a filha que te menosprezou o nome e os
conselhos, foi a mim que o fizeste.
Diante do Mestre, observou o crente comovido:
— Senhor, que desejas dizer? Em que lição de tua bondade
posso entender os ensinamentos a que me buscas o
raciocínio?
— Lembro-me de haver dito, — falou Jesus, — que qualquer
bênção doada pelos homens aos pequeninos seria sempre a
mim que o fariam…
— Mestre, — anotou o devoto, — eu não tenho pequeninos
em casa…
Jesus, porém, afagou as mãos do amigo que perguntava e
explicou:
— Sim, teu avô, à frente do mundo é um homem de grandes
posses dispondo de enorme influência, mas, por dentro do
coração, é um menino faminto de atenções, a carregar
dinheiro por permissão de Deus; teu irmão é um
companheiro dono de nobres conhecimentos, no domínio das
palavras brilhantes, entretanto, nos recessos dele
mesmo, é um petiz desajustado em matéria de impulsos
afetivos; teu filho é hoje um amigo de cérebro laureado
pelas ciências da Terra, contudo, no imo de si próprio,
é um pequenino sedento de fé e segurança, perante as
Leis de Deus; e tua filha, embora professora e mulher
feita, perante as criaturas humanas, ainda é, no íntimo,
verdadeira criança necessitada de proteção…
— Senhor! Senhor!… Gritou o crente, buscando alcançar
Jesus, cuja figura se lhe fazia distante.
Foi então que o devoto acordou na manhã repleta de sol e
começou a pensar.
Do livro Amizade, obra
psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.
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