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Nos
tempos da jardineira
Aos doze anos tive um
professor chamado Sídney
Puls. Na escola do
bairro, eu fazia o que
na época se chamava
“admissão ao ginásio”,
um ano de preparação
para entrada no curso
secundário.
Ali passei alguns meses,
até que minha mãe me
transferiu para outra
escola, no centro da
cidade onde morávamos.
Não esqueço as palavras
do professor Sídney ao
saber da transferência.
Lamentava a perda de um
bom aluno, que ia indo
muito bem, mas enfim, se
era conveniente a
medida, que fosse
implementada.
Fiquei empolgado com a
mudança, pois teria que
pegar ônibus e estudaria
na então mais importante
escola da cidade.
Deixaria para trás
vários colegas, mas o
sentimento de
independência foi mais
forte em mim. Completei
ali quatro anos do
secundário e mais três
do então “colegial”.
Décadas mais tarde,
garimpando livros numa
livraria-sebo, me
deparei com um livreto
contendo histórias
curtas de um tal Sídney
Puls: Nos tempos da
jardineira. Folheei
o pequeno volume à cata
de informações sobre o
autor. Nada encontrei.
Não acreditei, porém,
que pudesse ser um
homônimo, não com aquele
nome.
Um tanto emocionado,
pensei em como a vida
pode nos apresentar
certas circunstâncias
curiosas. Pura
casualidade, pois aquele
“achado” não tinha outro
propósito a não ser o de
me fazer lembrar do
dedicado professor da
minha infância, e
descobrir que ele era
também escritor.
Adquiri o livro e
guardo-o até hoje. Nas
páginas iniciais o autor
fez imprimir uma
dedicatória enigmática,
reproduzindo um
pensamento do
Eclesiastes, 7:10: “Não
digas: ‘Por que os
tempos passados eram
melhores que os de
agora?’ pois não é a
sabedoria que te inspira
essa pergunta”.
Certamente, muitos
leitores de Nos
tempos da jardineira concordaram
com esse pensamento
bíblico, que lhes dava a
certeza de que o agora e
o que está por vir são
sempre melhores.
Mas será também certo
pensar com o
Eclesiastes, que não se
aprende verdadeiramente
só com a vida presente
projetada para o futuro.
A consulta ao passado
tem muito a nos ensinar,
principalmente quando a
utilizamos como
referência, como
comparação ao que se
vive hoje. O passado
está repleto de avisos,
recados, lições. A
história de qualquer um
está impregnada do seu
passado.
Está claro que, tendo em
vista a lei de
progresso, não se deve
estagnar a mente no que
passou. Mas, para
crescer com
consistência, será
sempre útil avaliar a
experiência acumulada
anteriormente.
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