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Só damos o que possuímos
Muitas pessoas acreditam que, segundo as antigas
histórias bíblicas, o sentido de fazer a caridade na
Antiguidade estava associado à posse de bens materiais
que poderiam ser doados no templo de Jerusalém ou também
aos necessitados que cruzavam o seu caminho com as
esmolas.
Levando em conta a época e a cultura dos hebreus, a
riqueza material era a principal fonte da felicidade e
as pessoas se sentiam privilegiadas por Deus. Por isso
que Jesus fazia analogias e usava alegorias para
explicar questões de ordem moral.
Historicamente os povos não gostavam de pagar impostos e
a questão dos bens materiais sempre foi colocada em
evidência. É um bom exemplo a história do óbolo da viúva
que conta a passagem de uma pobre viúva que abriu mão do
pouco que tinha para ajudar aqueles que nada possuíam no
templo de Jerusalém.
Cairbar Schutel apresenta uma boa explicação para isso
quando escreveu:
“As Parábolas dos Evangelhos são alegorias...”
“O emprego contínuo, que durante o seu ministério Jesus
fez das parábolas, tinha por fim esclarecer melhor seus
ensinos, mediante comparações do que pretendia dizer com
o que ocorre na vida comum e com os interesses terrenos.
Sugeria, assim, o Mestre, figuras e quadros das
ocorrências cotidianas, para facilitar mais aos seus
discípulos, por esse método comparativo, a compreensão
das coisas espirituais”. 1
Jesus procurava mostrar que existiam dois tipos de
caridade, a caridade material e a moral. A caridade
material representava a doação dos bens que possuímos de
forma transitória, no caso o dinheiro. Mas a doação
moral representava a boa vontade, a dedicação e
principalmente o tempo em querer ajudar e ser útil
àqueles que precisavam de um acolhimento, atenção ou
consolação.
Podemos destacar a história do bom samaritano, em que um
samaritano passava por uma estrada indo até Jericó e
encontra um homem que havia sido espancado e
provavelmente assaltado, sendo deixado caído na estrada,
entregue à sua própria sorte. O samaritano procurou
ajudar esse homem tratando das suas feridas e também
materialmente, levando-o a uma estalagem até melhorar e
seguir seu caminho. A principal preocupação era ajudar
aquele desconhecido, para ele seguir o seu destino.
Rodolfo Calligaris procura dar uma interpretação mais
didática na visão espírita, onde a questão central é
ajudar a quem passa por nosso caminho, e seguir sua
caminhada evolutiva, independente de quem seja:
“...para entrarmos na posse da vida eterna não basta
memorizarmos textos da Sagrada Escritura. O que é
preciso, o que é essencial, para a consecução desse
objetivo, é pormos em prática, é vivermos a lei de amor
e de fraternidade que ele nos veio revelar e
exemplificar.
Jesus, então, extraordinário pedagogo que era,
serenamente, sem impacientar-se, conta-lhe a parábola do
“bom samaritano”, através do qual elucida o assunto,
fazendo-o compreender que ser próximo de alguém é
assisti-lo em suas aflições, é socorrê-lo em suas
necessidades, sem indagar de sua crença ou
nacionalidade.” 2
A passagem bíblica fala na posse de um bem inalienável,
um bem que possuímos e que não foi conquistado, nem
adquirido com trabalho, mas por mérito de ordem moral.
Esse é o verdadeiro bem que podemos oferecer ao nosso
semelhante, o nosso tempo, a nossa boa vontade e o nosso
desejo sincero em querer ser útil.
Algumas pessoas afirmam que a caridade material é muito
importante, porque as pessoas precisam de comida e
agasalhos. Jesus em seus ensinamentos procurava focar a
necessidade moral de todos que passavam pelo seu
caminho, como a questão do acolhimento ao sofredor, do
esclarecimento para aqueles que passavam por uma
provação e em alguns casos a intercessão espiritual para
uma cura, ou um processo de desobsessão, dependendo do
merecimento de cada caso, até como uma forma de servir
de exemplo para todos os demais.
Chico Xavier psicografou vários livros para nossa
compreensão. Destacamos essa passagem sobre a questão da
caridade segundo Emmanuel:
“Sem dúvida, em nos reportando aos bens materiais, há
sempre mais alegria em ajudar que em ser ajudado,
contudo, é imperioso não esquecer os bens espirituais
que, irradiados de nós mesmos, aumentam o teor e a
intensidade da alegria em torno de nossos passos”. 3
Para facilitar o trabalho de divulgação do Cristianismo
nos primeiros momentos, devido a perseguição dos
romanos, os apóstolos passaram a se reunir em um local
muito simples, realizando o acolhimento aos sofredores,
que ficou conhecida como Casa do Caminho. Esse
local chegou a ser conhecido por Gamaliel, antigo mestre
de Saulo de Tarso, onde conheceu Pedro e o singelo
trabalho que realizavam pelos necessitados. 4
A verdadeira caridade é simples e realizada de coração.
Existe sem sombra de dúvida a necessidade material do
corpo como a fome, porém a consolação, o acolhimento e o
esclarecimento espiritual podem promover um processo de
libertação daqueles que sofrem e não encontram uma saída
para suas aflições.
A sabedoria nas palavras de Emmanuel, pela psicografia
de Chico Xavier, nos desperta a responsabilidade na
condição de aprendizes da vida que buscamos nos tornar
sempre pessoas melhores a cada dia:
“Possuímos aquilo que damos.
Não te esqueças, pois, de que és mordomo da vida em que
te encontras. Cede ao próximo algo mais que o dinheiro
de que possas dispor. Dá também teu interesse afetivo
tua saúde, tua alegria e teu tempo e, em verdade,
entrarás na posse dos sublimes dons do amor, do
equilíbrio, da felicidade e da paz, hoje e amanhã, neste
mundo e na vida eterna”. 3
Referências:
1) Schutel,
Cairbar; Parábolas e Ensinos de Jesus (1928); 1ª
p. - As Parábolas e a sua Interpretação; Ed. Clarim.
2) Calligaris,
Rodolfo; Parábolas Evangélicas (1963); Ca.14
- Parábola do bom samaritano; Ed. FEB.
3) Xavier,
Francisco Cândido; Fonte Viva (1956) Emmanuel;
Cap. :117 - Possuímos o que damos; FEB.
4) Wikipédia
(Enciclopédia Livre).
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