Entrevista

por Orson Peter Carrara

Superação da fibromialgia: o exercício do servir em favor da própria melhora


 
Natural de Campina Grande (PB), onde reside, Irisvânia Emanuelly Naque Rodrigues, ou Iris (como é mais conhecida), é formada em Pedagogia e especialista em Supervisão e Orientação Escolar e no Transtorno do Espectro Autista, em que atua há mais de 20 anos, quinze deles especificamente na educação infantil e de crianças com dificuldades de aprendizagem. Vinculada ao Centro Espírita Instituto Sheila, de sua cidade, já atuou também como evangelizadora por cinco anos em outro centro espírita. Entrevistamo-la sobre sua marcante experiência de superação da fibromialgia, a partir da decisão de servir.

 

De onde o interesse pela Pedagogia?

Meu interesse pela pedagogia é um sonho de criança, sempre sonhei em ser professora, pois sempre gostei de ensinar crianças que não sabiam ler. Mesmo quando criança eu costumava ensinar as atividades de casa às crianças da minha rua. Hoje não sei fazer outra coisa e sempre digo que ser professora é minha paixão de vida.

Como conheceu o Espiritismo?

Reencontrei o Espiritismo através do meu esposo. Nós nos conhecemos em 2010 na época da famosa Festa de São João da nossa cidade e começamos a namorar, porém só no mês de novembro é que ele me levou a uma palestra em um centro espírita da nossa cidade, numa ocasião em que estava palestrando o Rossandro Klinjey. Desde então, não deixei mais de voltar e em janeiro do ano seguinte, eu já estava evangelizando no centro espírita que meu esposo frequentava. 

O que mais se destaca a você do conhecimento espírita?

Desde que nos casamos em 2014 realizamos com frequência o evangelho no lar, sendo este um assunto que muito me atrai no conteúdo espírita. Gosto de estudar as passagens do evangelho, bem como as parábolas de Jesus; me identifico e sinto sempre a minha fé renovada com tais ensinamentos.

E a questão da fibromialgia, onde ela entra nessa história toda?

Em 2015 meu filho nasceu, e depois do parto eu sentia muitas dores e frequentemente tinha crises de choro. No início nem ficar sozinha com o bebê eu conseguia. Achamos inicialmente que era algo relacionado ao pós-parto apenas, porém as dores aumentavam a cada dia. Quando meu filho estava com 5 meses descobrimos que ele tinha fechado de forma precoce a fontanela principal de sua cabeça, podendo não desenvolver habilidades importantes como andar e falar. Esta carga de stress me levou a desenvolver dores ainda maiores, me deixando de cama, que apenas a medicação tramal na veia resolvia; daí em diante eram crises constantes como essa. Foi em 2019 que recebi o diagnóstico da fibromialgia. É importante ressaltar aqui que meu filho hoje é uma criança saudável e não precisou fazer nenhuma cirurgia por médicos aqui no plano terreno, mas realizamos uma cirurgia espiritual em 2018 no conhecido Templo Espírita Tupyara, do Rio de Janeiro, o que resolveu em definitivo sua dificuldade.  Na época da pandemia, vi os sintomas piorar ainda mais, principalmente entre março de 2020 a junho de 2020, pois não suportava a ideia de ficar em casa sem trabalhar. Vi as professoras da escola em que trabalho até os dias de hoje perderem todos os seus alunos, pois os pais na época cancelaram os contratos de matrículas. Aquilo mexeu muito com o meu emocional. Foi então que, em abril de 2020, após realizarmos a reunião do evangelho no lar, num dia que eu havia passado o dia de cama e chorando muito, recebemos a intuição de levarmos alimento a pessoas em situação de rua de nossa cidade.

Você atualmente não toma mais medicamentos?

Iniciamos a atividade sugerida pela espiritualidade apenas eu e meu esposo. Saímos em nosso carro, levávamos 25 refeições (sopa) e voltávamos para casa chorando pois era insuficiente. Foi quando em maio do mesmo ano decidi postar sobre o que estávamos realizando todos os sábados. Para nossa surpresa, três amigas minhas (professoras que trabalhavam comigo) se dispuseram a ajudar, foi então que saímos de 25 para 75 refeições. Nessa época eu ainda sentia dores, mas aos sábados acontecia algo muito interessante, começava o dia com dores e quando voltava para casa, as dores eram muito inferiores. Estes casais ficaram conosco até meados de setembro do mesmo ano, porém através de outra postagem e de contatos com amigos nossos, outros três casais se somaram a nós e permanecem até os dias de hoje. Ah! as medicações! Faz dois anos que não tomo mais nenhuma medicação controlada, antes tomava cinco. Sinto dores? Sim, mas suportáveis, nada parecido com o que sentia antes. Precisava contextualizar o que me levou a não mais utilizar as medicações, claro que atrelado a isso fiz mudanças importante em minha vida, mas digo que a principal delas foi doar-me, servir ao próximo, me aproximar do Cristo através do exercício da caridade, achar minha pérola de grande valor. 

Como considera o atenuar das dores com o trabalho de servir aos semelhantes com o socorro às necessidades de pessoas em carência?

O trabalho no bem me trouxe uma perspectiva diferente de ver a vida, quando olhamos um pouco para baixo e percebemos as dores do próximo, nossas dores são minimizadas, vemos quão socorridos somos diariamente pela misericórdia divina. A cada sábado quando saímos às ruas e recebemos um sorriso, um simples Que Deus vos abençoe!, voltamos para casa renovados, certos de que estamos enxergando o evangelho do Cristo através daqueles irmãos tão desfavorecidos. Por mais que eu tente explicar aqui em palavras, jamais vou conseguir descrever a emoção, a energia e a felicidade que sentimos quando socorremos uma necessidade básica, que é a fome de uma pessoa.

Você considera isso a descoberta, no seu caso, de uma pérola como a parábola contada por Jesus?

Sim! Por isso, seu painel* no 52º MIEP (Movimento de Integração Espírita Paraibano) me deixou tão inquieta a falar, pois percebo que muitas vezes, ou na maioria das vezes, estamos buscando a pérola de grande valor em algo muito pessoal, quando em seu evangelho Jesus nos mostra de várias formas que os verdadeiros valores estão no amor a Deus sobre todas as coisas e no amor ao próximo como a si mesmo, e não tem como amar a Deus sem amar o nosso próximo, concorda? E não àquele próximo que está dentro de nossas casas apenas, ou dentro de nossas casas espíritas, que possuem os mesmos gostos, pensamentos e modo de vida que temos. Está no desafio de amar o diferente, aqueles que muitos não enxergam, que estão à margem de uma vida digna. Olhar para essas pessoas sem julgá-las, sem pedir nada em troca, sem esperar recompensa, nos fez e continua nos fazendo entender a essência do evangelho de Jesus. Hoje não faz mais sentido viver sem esse trabalho que realizamos todos os sábados. Abdicamos de muitas coisas em prol desta pérola de grande valor em nossas vidas, buscando nossa melhoria enquanto seres humanos e cristãos.

E também se curou de um câncer?

Deus sempre está a nos mover, né? A mostrar que sempre podemos ser melhores do que fomos até ontem, e quando percebe que estamos estagnados, nos convida a algo desafiador. Em agosto do ano passado recebi a notícia de que estava com uma infecção no colo do útero que poderia vir a se tornar um câncer. Após exames (biópsia) e uma primeira cirurgia foi detectado que se tratava de um carcinoma local, não invasivo. Foi quando precisei fazer a retirada do útero para a cura de forma definitiva do câncer. Claro que na hora em que recebi a notícia fiquei muito abalada, chorei muito, mas o choro durou apenas uma tarde. Não me sentia no direito de questionar a Deus as razões, mas durante todo o processo sempre perguntei o porquê, e sentia que tinha algo que eu precisava aprender ali. Hoje me tornei uma pessoa ainda mais grata por tudo e por tanto que tenho. Aprendi que há coisas em minha vida que não são negociáveis, como minha saúde, minha família e meus princípios. Que tudo que venha abalar estes três fatores não vale a pena e que minha missão de vida está no trabalho no bem. Com 30 dias depois da cirurgia eu estava de volta ao trabalho do bem nas ruas, servindo aos meus irmãos queridos. Nesse processo, percebi que tinha uma fé que jamais imaginava.

Qual a maior experiência tirada desse contato com as necessidades humanas mais básicas?

Nesses quatro anos, atendendo ao chamado do divino Mestre, aprendemos que a verdadeira felicidade está na simplicidade da vida. Aquelas pessoas nos ensinaram que não precisamos de muito para sermos gratos a Deus. Eles sorriem na diversidade, agradecem a Deus por um simples pão e mesmo numa condição desfavorecida materialmente dividem o pouco que têm. Aprendemos e estamos aprendendo a essência do evangelho de Jesus, a cada sábado que nos deparamos com eles, e aí me lembro muito da fala do divino Mestre: ..."Pois eu tive fome, e vocês me deram de comer; tive sede, e vocês me deram de beber..."

Algo comovente para contar desses contatos?

Durantes estes anos, muitas histórias nos comoveram, mas uma em especial me toca muito. Estávamos encerrando as distribuições e restaram 5 refeições. Já tínhamos percorrido todos os lugares em que costumeiramente passamos e fazemos as entregas, quando passamos em uma rua em que não costumávamos passar e encontramos um senhor com uma carroça recolhendo papelão na rua. Paramos e perguntamos se ele aceitava uma refeição; ele disse que sim e que, na verdade, nunca saía aos sábados à noite para recolher material reciclável, porém naquele dia não tinha nada em casa para dar de jantar à família. Quando perguntamos quantas pessoas eram em sua casa, ele respondeu que eram cinco. Ao entregarmos as cinco refeições, água e alguns quilos de arroz e cuscuz para ele, ele nos relatou: - Ao sair de casa pedi a Deus que ele não desamparasse minha família e ele me mostrou vocês no caminho. Essa história me comove até hoje.

Algo mais que gostaria de acrescentar?

Que possamos, portanto, estar atentos aos sinais que o Alto sempre nos dá. Todos os dias somos convidados à mudança íntima, ao trabalho do bem, como diz o evangelho: muitos serão chamados, poucos os escolhidos. Eu acrescento: poucos de nós estamos nos fazendo ser escolhidos; o que estamos fazendo para merecermos ser escolhidos? Será que não estamos ficando apenas com a teoria do evangelho esquecendo que é a prática dele que nos transforma e enobrece? Que possamos encontrar a nossa pérola de grande valor nos tesouros que nem o tempo nem a traça corrói. E que possamos acumular os verdadeiros tesouros divinos, para que quando aqui não estivermos mais e nos perguntarem o que fizemos da nossa passagem aqui na Terra, ao menos termos a certeza de que tentamos nos aproximar das características do verdadeiro cristão.

Suas palavras finais.

Quero agradecer imensamente a oportunidade de falar um pouco do amor de Deus através das minhas experiências, de quem sabe contagiar um pouco a quem tiver a oportunidade de ler estas palavras e motivar a fazer algo por alguém, pois sempre temos algo de bom para doar, principalmente doar daquilo que temos e não apenas possuímos, como doar do nosso tempo, da nossa atenção, do nosso amor. Para quem quiser conhecer um pouco do nosso projeto e de como nos ajudar a continuar a espalhar a centelha do Cristo é só buscar por @grupocentelhasdocristo ou @irisnaqueprof.

 

*A entrevistada, em uma de suas respostas, refere-se ao painel que apresentamos durante a 52ª edição do MIEP com o tema Parábola do Pérola de Grande Valor, quando ela participou com seu depoimento, o mesmo que motivou a presente entrevista. (Nota de Orson Peter Carrara)

 
 

 

     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita