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por Paulo Hayashi Jr.

 

A lição da vigilância

 

A representação da boa árvore e de seus frutos significa valiosa metáfora que simboliza a passagem do ser humano pela Terra. Seja por meio das raízes como seus descendentes e antepassados e, neste caso, quanto mais profunda, diversificada e rica for o sistema radicular, maiores as chances de a árvore ser nutrida com os recursos ímpares para o bom desenvolvimento. Seja por meio de seu crescimento contínuo em direção aos céus e abençoado e nutrido pelo sol. A fotossíntese como mensagem direta à necessidade de buscar os valores do alto e sua transfiguração. Os pais como o tronco e o exemplo de vida reta, sacrifício e dedicação para enfrentar as tormentas e as dificuldades da vida cotidiana. Por sua vez, os filhos como os rebentos e passagem da flor delicada para o fruto doce que embelezam e justificam a própria existência. São as obras, as grandes realizações que, mesmo em situações difíceis e penosas, fazem valer a pena as peleias pelas conquistas e os sacrifícios apesar da dor. Todavia, nenhuma batalha pode ser ganha sem a devida vigilância. A semente preciosa exige não apenas a boa terra, mas também o cuidado com a rega, o inço, ou os inimigos, por exemplo. É preciso nutrir o solo, assim como também proteger de invasores e pragas. Na metáfora da árvore e do jardineiro fiel, a vigilância é presença constante. Sem a devida vigilância os bons frutos não vêm. São fundamentais o trabalho, o sacrifício e a disciplina no serviço. Nem todos os recursos disponíveis conseguem dar os bons frutos sem a devida vigilância. A vigilância é estar atento e em vigília, sem ‘baixar a guarda’. Se o tempo é o mestre silencioso[1] que tudo transforma, o mesmo pode ser para melhor ou pior, dependendo da vigilância ou da direção escolhida.

Por exemplo, em seu livro Os Mensageiros, o autor André Luiz nos relata, por meio dos casos de certos amigos espirituais, alguns pontos centrais para a vigilância. Segue, como esforço educativo, a apresentação dos principais pontos:

  Renúncia de si mesmo;

  Desprendimentos das posses efêmeras;

  Desinteresse pela remuneração dos sentidos;

  Escutar os bons conselhos dos amigos espirituais;

  Viver perto de Jesus.

Quem pratica a renúncia de si mesmo combate o ego, a vaidade e o orgulho. Tal trio constitui os inços comuns na horta humana. É preciso atenção e vigilância constante para seu combate. Por outro lado, o desprendimento das posses representa ir contra o egoísmo, o materialismo e a ideia de que apenas a matéria conta. É vital buscar os tesouros imateriais e perenes que não terminam com o desencarne. As riquezas do céu representam tesouros mais valiosos do que o reles metal dourado da terra. Já o desinteresse pelos sentidos é viver de forma mais estoica e menos hedonista. Não se deixar levar pelas paixões dos sentidos e da carne. É preciso estar no mundo, mas não se perder. O equilíbrio vem com as emoções sob controle e a fé raciocinada. Deixar-se ser controlado pelos sentidos corporais é ser levado pelo ‘corcel’ do corpo, ao invés do cavaleiro controlar e dirigir o mesmo. Todavia, não estamos sozinhos. Não é uma batalha individual. Conta-se com a presença e a participação de bons amigos, encarnados ou não. Todavia, muitos preferem dar ouvidos aos cantos de sereias do mundo a bons conselhos amigos. Esquecem-se de que a intuição e o pressentimento são formas de conselhos. Na dúvida sobre algo, pergunte para si mesmo e à sua consciência, se aquilo que você vai fazer para o outro, também gostaria que lhe fizessem. Ou ainda, o que Jesus faria no meu lugar? Estar perto do mestre e de seus valores do Alto talvez represente a vigilância precisa e segura para a aquisição dos bons hábitos e atitudes frente aos desafios da vida. 

De certo modo, os três primeiros pontos da lição da vigilância de André Luiz representam a desidentificação com o mundo material. É estar no mundo, mas sem ser do mundo[2]. Por outro lado, os dois últimos pontos são a identificação com o mundo imaterial e perene. A vinculação com os valores do alto e com a espiritualidade superior.  A lição da vigilância pode ser vista ainda como verdadeiro ‘cabo de guerra’ entre a identificação ou não com o mundo material e imaterial. O lado mais nutrido e desejado ganha. Em outras palavras, “pois onde estiver o seu tesouro, aí também estará o seu coração[3]”.

Portanto, apesar da aparência inicialmente racional da vigilância, o lado emocional ganha contorno e, mais do que educar o lado cerebral, é preciso também educar as emoções, sentimentos e gostos que se identifiquem e se voltem para o bem. Mais do que uma pedagogia para a vigia e para a atenção, o fundamental é aprender a gostar daquilo que é bom, belo e verdadeiro, de forma perene e universal. É a estética do ser humano. Da apuração do gosto para se alinhar com o Divino. Gostar daquilo que faz bem e esforçar-se pela sua renovação interior. Talvez seja esta a grande lição de André Luiz. A vigilância não é como uma prova de atenção militar. Mas a estética do gosto da própria existência. O alinhamento pessoal com a lei da afinidade.

Na metáfora da árvore, é ser alguém que as fibras internas e a própria natureza se coadunam com o bem, o belo e a verdade. É ser por inteiro e não apenas por fora ou de maneira parcial. É estar intrinsecamente dedicado aos valores e à vivência do alto, pois faz parte da própria natureza. É ser o fruto vivo da doçura, do amor e do conhecimento de Jesus na Terra. É não precisar mais temer o inimigo, uma vez que todos se transformaram em irmãos. Os erros têm prazo de validade para vencer. É mudar a postura e a armadura. Não existem inimigos, mas irmãos em ignorância. Não um contratempo, mas uma oportunidade de aprendizado. A melhor vigilância é o amor que circunda o próprio coração. Revestidos desta armadura, toda oportunidade é chance de crescer para Deus e de frutificar para o bem de todos. A renovação que transforma seres humanos em florestas benditas de luzes coloridas e com perfumes e sons que nos recordam o jardim do paraíso. [4]


 



[1] Emmanuel. Pão Nosso. Cap. 63 - O senhor dá sempre. FEB.


[2] João 15:19.

 

[3] Mateus 6:21.

 

[4] Em homenagem à minha querida mãe, Ioko Ikefuti Hayashi.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita