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por Leonardo Marmo Moreira

 

A opinião de Cairbar Schutel sobre colônias espirituais e animais no mundo espiritual


Uma das questões mais polêmicas do movimento espírita na atualidade diz respeito aos conceitos de “colônia espiritual” e “umbral”, assim como sobre a presença de animais no mundo espiritual, os quais foram amplamente difundidos pela obra de André Luiz, psicografada por Francisco Cândido Xavier.

Apesar da obra de Yvonne do Amaral Pereira intitulada “Memórias de Um Suicida” ter sido elaborada, no que se refere às suas narrativas, em 1926, portanto, muito anteriormente à obra de André Luiz, tal corroboração parece não ser suficiente para persuadir aqueles que não aceitam o grande volume de detalhes de caráter semimaterial (ou material) da obra de André Luiz.

Nesse contexto, a obra de Cairbar Schutel denominada “A Vida no Outro Mundo” merece ser destacada. De fato, essa obra, que é pouco conhecida de grande parte de nosso movimento espírita, representa importante estudo sobre a realidade material ou semimaterial do mundo espiritual e seus detalhes e implicações.

Cairbar Schutel nasceu em 1868 e desencarnou em 1938. Conhecido como “O Apóstolo de Matão” (e também como “O Bandeirante do Espiritismo”), Schutel desenvolveu um trabalho de grande qualidade doutrinária em uma época em que as mais severas dificuldades em diferentes áreas limitavam as iniciativas de divulgação doutrinária.

Schutel escreveu “A Vida no Outro Mundo” no ano de 1932. Esse livro, que foi publicado, em sua primeira edição, em outubro de 1932, consiste em um estudo sobre a realidade objetiva do mundo espiritual, tendo sido elaborado a partir de uma rigorosa averiguação da literatura espírita e/ou espiritualista disponível àquela época.

Naquele tempo não existiam ainda as obras de André Luiz e de Yvonne do Amaral Pereira. Aliás, Chico Xavier publicaria sua primeira obra mediúnica, “Parnaso de Além-Túmulo”, justamente nesse ano de 1932, e Dona Yvonne era, então, uma ilustre desconhecida, e demoraria muito tempo para publicar seus primeiros livros, incluindo “Memórias de Um Suicida”. De fato, seu mais célebre livro só seria lançado pela FEB em meados da década de 1950.

No caso de André Luiz, seus dois primeiros livros, “Nosso Lar” e “Os Mensageiros”, somente teriam suas primeiras edições publicadas no ano de 1944, seis (6) anos após a morte de Cairbar Schutel.

Assim sendo, Cairbar Schutel redigiu seu texto a partir do estudo de obras que nada tinham a ver com os legados de André Luiz e Camilo Castelo Branco, Léon Denis, e, muito menos de outros autores, tais como Manoel Philomeno de Miranda (pela mediunidade de Divaldo Pereira Franco), que somente chegariam ao público muito tempo depois.

Demonstrando vasta cultura, Schutel correlaciona informações interessantes presentes em diferentes obras, com especial destaque para os chamados “clássicos do Espiritismo”, mas também contemplando um consistente estudo do texto bíblico. Tudo isso partindo, obviamente, de uma sólida e ricamente referenciada base na obra de Allan Kardec.

Nomes como Gabriel Delanne, De Rochas, William Crookes, Oliver Lodge, entre outros, são citados e comentados por Cairbar Schutel para respaldar a existência de muitas realidades materiais no mundo espiritual.

Schutel demonstra compreender claramente quais itens tendem a gerar maiores dificuldades para que nós, encarnados em geral (e militantes espíritas, em particular), entendêssemos minimamente a realidade física do mundo espiritual com suas implicações em relação à rotina dos Espíritos desencarnados. De fato, uma observação atenta de alguns debates vigentes atualmente em nosso movimento espírita denota como a obra de Cairbar Schutel é relevante e altamente útil para os estudos atuais.

Cairbar Schutel organiza seu livro “A Vida no Outro Mundo” por meio de capítulos curtos e extremamente didáticos, iniciando sua análise a partir de uma discussão sobre o materialismo e a questão da imortalidade da alma. Subsequentemente, “O Apóstolo de Matão” aborda o perispírito e suas propriedades, citando e transcrevendo passagens de importantes autores, tais como Gabriel Delanne, De Rochas e Andrew Jackson Davis. Schutel analisa igualmente a questão dos animais no mundo espiritual, defendendo sua existência no mundo espiritual, a partir de reflexões sobre textos de Ernesto Bozzano, entre outros autores.

Realmente, no capítulo intitulado “O Perispírito nos Seres Inferiores”, Schutel, ao comentar sobre o perispírito, tem ocasião de afirmar:

“Não só o homem é dotado desse órgão, necessário às funções que exerce; todos os animais mantêm essa ideia diretriz, que é de indispensável utilidade fisiológica.

“O cão, o gato, o cavalo, o tigre, o leão, os pássaros, os peixes, os quadrúpedes de toda espécie, os répteis, até os mais insignificantes insetos, todos são dotados desse organismo, que existe neles ainda invisível para nós e que designa em cada parte e a cada elemento, seu lugar, sua estrutura e suas propriedades...”.

Subsequentemente, no mesmo capítulo, Schutel afirma:

“...na Outra Vida, encontraremos Espíritos de animais, como de seres que já pertencem, pelo seu grau de evolução espiritual, ao reino hominal.

“A prova dessa afirmação está nas aparições dos animais constatadas nos anais do psiquismo. O Dr. Ernesto Bozzano chegou a reunir avultado número dessas manifestações póstumas em seu livro denominado Animali e Manisfestazioni Metapsichiche”.

No capítulo intitulado “No Outro Lado da Morte”, Schutel transcreve substancial trecho obtido da revista inglesa “Beyond”, afirmando o seguinte: “...é do nosso dever adicionar a esta obra, pois se acha de plena conformidade com o que sabemos sobre a vida no outro mundo”. De fato, Schutel vai subdividir esse capítulo nos significativos itens:

- Saúde e entusiasmo perfeito;

- Características inesperadas;

– Construções Celestes.

No item “Características inesperadas”, Schutel transcreve um interessante comentário, no qual o autor espiritual fala sobre seu pai e as características do ambiente espiritual que ele conheceu:

“...Ele tem vastos conhecimentos dos reinos animal, vegetal e mineral, porque também aqui a alma de qualquer ser está vivamente representada. Há maravilhosas rochas, cristais de rocha, joias, ouro e prata, somente usados pela sua beleza e não desmoralizados, como meio de corrupção, como acontece na Terra”.

No item “Construções celestes”, Schutel também transcreve outras passagens significativas da revista “Beyond”:

“Algumas pessoas se comprazem em fazer casas dessas coisas encantadoras. Temos maravilhosos edifícios, salas para conferências e assim por diante, que são admiráveis de serem vistos, como essas visões que o Evangelista João descreve nas Revelações, com paredes de pedras preciosas, portões de pérolas e ruas de ouro.

“Esses lugares maravilhosos são muito interessantes para serem visitados, como, na Terra, se vai ver belos e notáveis palácios; naturalmente, os daqui são muito mais belos para conferências, reuniões e música do que qualquer edifício por mim visto na Terra. Para mim, porém, as belezas naturais das árvores, montanhas, flores e rios, que são todos tão perfeitos, dão mesmo mais encanto e eu sempre gosto de procurar esses lugares gloriosos da Natureza, quando me sinto inclinado a ficar pesaroso, como algumas vezes me acontece. O admirável e agradável efeito da luz através das árvores, ou brilhando nos rios, como nunca tive a dita de ver na Terra, é tudo tão maravilhoso! Os rios são gloriosos, tão perfeitamente puros e incorruptos que, dentro deles, podemos andar, sentar na água e senti-la, cobrir-nos e dela sairmos refrescados e revigorados; e, ainda mais, a água, evaporando-se em contato com o brilho solar, não deixa sensação nenhuma desagradável.

“Tudo isto é tão delicioso que só afago um desejo; a vossa participação em tudo que desperta o prazer de viver intensamente a vida celeste”. (grifos meus)

Cairbar Schutel, possivelmente desconfiando que tais informações poderiam causar espanto ou ser interpretadas como algo puramente simbólico, desejou reforçar tais noções ao incluir um capítulo intitulado “Sala de Reuniões e Casas no Mundo dos Espíritos”. Ao iniciar esse capítulo (que, inclusive, tem um subcapítulo denominado “Casas de Convalescentes”), Cairbar Schutel faz uma análise realmente admirável sobre o porquê dessa realidade material ou semimaterial do mundo espiritual. Ele afirma:

“Já lembramos aos nossos leitores que o Outro Mundo deve ser algo de real, de positivo, pois não se poderia compreender a Vida sem os acessórios necessários para a sua manifestação e, também, não poderíamos admitir que houvesse um hiato na transição desta para a outra vida, uma transição tão grande que o homem chegasse a perder a noção de si mesmo, ou enlouquecesse com a mudança de estado absolutamente incompatível com a sua evolução, com o seu grau de progresso moral e científico”.

Diante de tão consistente argumentação, só nos restaria um pequeno questionamento:

Se nós, militantes minimamente esclarecidos do movimento espírita, temos tamanha dificuldade em conceber o mundo espiritual e suas atividades e implicações, o que dizer dos inúmeros irmãos materialistas e espiritualistas menos esclarecidos?!

A dificuldade de adaptação desses irmãos à vida além-túmulo tende, a princípio, a ser muito maior que a nossa. Assim sendo, mudanças drásticas seriam extremamente traumatizantes e contraproducentes do ponto de vista educacional e evolutivo, o que ajuda a entender o motivo da Providência Divina evitar transições mais brutais na realidade de caráter semimaterial (ou material) do mundo espiritual.


Nota da Redação
:

O livro A Vida no Outro Mundo, de Cairbar Schutel, foi estudado metodicamente nesta revista, nas edições 444 a 472, todas disponíveis para os leitores. Para acessar a parte inicial do estudo, clique aqui


 

 

     
     

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