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por Cláudio Bueno da Silva

 

Relações artificiais


Para evoluir, o ser humano foi chamado a viver no mundo em sociedade(1), e seu isolamento social e cultural, desde que voluntário, reflete apenas o ato egoísta de pensar só em si mesmo e uma pretensa superioridade sobre os outros.

“O meio natural de evolução – diz Herculano Pires –, para o homem e para todas as coisas e todos os seres, é a relação.(2)

“O homem deve progredir, mas sozinho não o pode fazer porque não possui todas as faculdades: precisa do contato dos outros homens. No isolamento, ele se embrutece e se estiola.”(3)

A experiência que faz amadurecer a alma flui mais autêntica e eficiente nas relações interpessoais. O homem precisa do homem. Em matéria de aprender sentimento nada substitui o contato direto, o calor da palavra, a permuta de energia e conhecimento entre as pessoas nas relações objetivas da vida material.

Porém, as circunstâncias do desenvolvimento do mundo atual têm feito as pessoas buscarem alternativas de convivência que acabam se opondo aos seus verdadeiros interesses naturais. A violência e o medo na vida moderna (mas não só isso) estão afastando cada vez mais umas das outras, forçando-as a se relacionarem por vias artificiais.

Cercadas por grades e sistemas de segurança, fechadas em seus condomínios, apartamentos e escritórios, é possível que se sintam mais seguras para se entregarem ao “faz de conta” das redes sociais e às facilidades tecnológicas, mas não percebem que esse distanciamento aumenta o mal social.

O vai e vem condicionado e restritivo dos shoppings, o confinamento dos membros da família, cada um no seu cômodo, os incontáveis guetos religiosos que se isolam em pequenos (ou grandes) rebanhos que não se afinam uns com os outros, tudo isso concorre para que as pessoas se afastem da vida real.

As diferenças e atritos em nosso mundo decorrem (também) da heterogeneidade de condição dos homens. Seus problemas pessoais e de relacionamento do passado e do presente precisam ser resolvidos na Terra e não num mundo imaginário. Isolando-se, não encontrarão parâmetros, portanto ficarão sem muitas respostas. O processo de crescimento é em boa medida individual, mas, sem referências práticas externas, a experiência humana será pobre e limitada.

A espiritualização do homem, que passa antes pela sua humanização no plano da matéria, requer compatibilidade entre suas ações e o seu desejo de liberdade e plenitude, que muitos chamam de felicidade. Isso ele conseguirá vivendo entre os homens, procurando aprender, acertar e influir positivamente.

É preciso pensar que, se o homem, por força da Lei de Deus, assume o compromisso de reencarnar na Terra, estará aceitando tacitamente sua meta principal aqui: evoluir. Precisará da diversidade humana como forma de ganhar experiência e garantir a sua formação como indivíduo. A diversidade servirá de matéria de análise sobre como melhor agir nesse mundo, sobre o que aceitar e o que evitar.

Em consequência, conclui-se: assim como não dá para “se jogar no mundo”, não dá também para se encastelar no egoísmo individual ou de grupo.

O mundo atual, passível de progresso, não pode prescindir da colaboração de todos e de cada um em particular. Talvez precisemos retomar algumas práticas antigas no campo da convivência, abandonadas pela ansiedade do futuro, e implementá-las com amor e fraternidade: as reuniões em família, as visitas, as conversas, o abraço, a gentileza e os pequenos favores, os elogios, as “lembrancinhas”... Não se trata de voltar ao passado, mas de enriquecer o presente com emoções duráveis. Creio que isso fará bem a todos.


Referências
:

(1)  O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 766, LAKE.

(2)  Agonia das Religiões, J. Herculano Pires, Paidéia, 1.976.

(3)  O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 768, LAKE.


 


 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita