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por Leda Maria Flaborea

 

Parábola do Mordomo Infiel


Cada homem é servidor e administrador frente à obra de Deus. Servidor porque trabalha na seara divina, e administrador porque terá de prestar contas à Justiça Divina. Podemos entender, então, que administrador não é aquele que cuida apenas dos interesses coletivos, particulares ou públicos com esforço pessoal, pois “cada inteligência da Terra dará conta dos recursos que lhe foram confiados”, afirma o benfeitor espiritual Emmanuel¹, através da mediunidade de Francisco Cândido Xavier.  

Lembra também o mesmo benfeitor que esses recursos não são apenas a fortuna e a autoridade. Vão além, muito além... O corpo físico, a saúde, as oportunidades de crescimento pelas possibilidades de servir, de estudar, de bem usar o tempo; o próprio lar, os amigos e as experiências pelas quais passamos e que nos permitem aprender mais, são dádivas do Céu. Mesmo a ocasião de viver em harmonia com tudo e com todos que nos cercam a existência ou de ajudar alguém em necessidade são bênçãos vindas do Celeiro Divino do amor para nossa evolução espiritual. Todos esses recursos são talentos preciosos que repousam em nossos corações, o tabernáculo sagrado da parábola, em nossas mãos e no nosso caminho. Por isso é preciso velar pelo que realizamos com eles, pois chegará o dia em que o Pai nos dirá: “dá conta da tua administração”.

Fica clara na passagem evangélica a preocupação do Mestre em nos alertar tanto para o fato de que somos instrumentos para ajudar o outro (embora ambos, o outro e nós, sejamos imperfeitos), como para a possibilidade do uso dos bens materiais para fins espirituais. Assim, o Senhor das terras na parábola é Deus e nós o mordomo ou o administrador infiel.

O fato é que essa parábola talvez seja uma das mais difíceis de serem compreendidas em sua essência, a menos que pretendamos, com uma leitura literal, imaginar que Jesus possa compactuar com a esperteza, com a desonestidade. Se o Mestre não compactua com essas atitudes, o que Ele quis dizer?

Para compreendermos isso, é necessário penetrarmos no campo do espírito: segundo a parábola, o mordomo foi denunciado por ser esbanjador, mas é preciso entender que ele não era gastador, ou seja, apenas facilitava os negócios, trazendo prejuízos ao patrão. O dono das terras agiu com justiça despedindo-o, e com misericórdia não o denunciando para ser preso e punido.

Esse fato é de grande importância para a sequência da história que Jesus narra, pois o administrador, tendo de prestar as contas ao patrão, aposta na misericórdia com a qual este o havia tratado e faz a mesma coisa com os arrendatários das terras: reduziu as dívidas deles, procurando imitar a conduta do patrão. Mas, o que significa, no campo do espírito, reduzir a dívida do outro? Vamos entender essa lição do Excelso Amigo: do ponto de vista do Jesus, cada vez que auxiliamos alguém, conquistamos novos amigos encarnados e desencarnados e essa ajuda retorna a nós quando necessitamos, diminuindo a nossa conta na contabilidade divina. Granjeamos novos amigos, conforme o pedido d’Ele.

Quando ajudamos os tutelados desses amigos desencarnados, os Espíritos marcam o bem que fazemos e nos recompensam, mais tarde, quando precisarmos. Diminuímos os débitos dos companheiros encarnados, quando os impedimos, com nossa ajuda, de cometer novos desatinos, ou os induzimos a repensar suas escolhas, trazendo-os de volta ao equilíbrio. E de tanto fazer o bem, aprendemos a amar incondicionalmente. Não é isso que diz o apóstolo Pedro, na sua primeira carta, capitulo 4, versículo 8: “o amor cobre uma multidão de pecados”?

A leitura cuidadosa da parábola permite observar a proposta de Jesus para imitarmos o mordomo infiel, juntando tesouros no Céu e não na Terra, como lembra Mateus, no capítulo 6, versículo 20.

O benfeitor espiritual, através da abençoada psicografia de Francisco Cândido Xavier, diz: “(...) cresçamos na virtude e incorporemos a verdadeira sabedoria, porque amanhã serás visitado pela mão niveladora da morte e possuirás tão somente as qualidades nobres que houverdes instalado em ti mesmo”.²

Mas como poderemos nós imitar a atitude do mordomo?  Como poderemos diminuir o débito das criaturas? Através das palavras que consolam, que confortam, que erguem as criaturas do desespero para a esperança. Mostremos ao amado Mestre nossa capacidade de auxiliar o próximo ofertando o ombro amigo, o alimento para o corpo e para o Espírito, o esclarecimento que o tira da ignorância das culpas e das penas eternas... Deus é Pai de amor, justiça e misericórdia e apesar das nossas imperfeições somos seus colaboradores na construção de um mundo melhor.

Granjeais amigos, diz-nos a parábola. Amigos sinceros, devotados pelo uso correto dos bens materiais, porque “toda dificuldade do homem sobre a Terra está em assumir atitude correta em face dos bens materiais”.³

A riqueza das injustiças inclui nosso passado total, com todas as lições dolorosas que o caracterizam.

Para Cairbar Schutel 4, a parábola trata de duas qualidades: a fidelidade e a firmeza de caráter. Pergunta ele: somos fiéis nos nossos deveres? Temos reconhecimento, gratidão, indulgência, caridade e amor? Entendemos o convite do Mestre para sermos perfeitos como o nosso Pai Celestial o é?

Evidentemente que nossa dificuldade ainda é imensa frente aos generosos convites do Divino Amigo. Ainda não conseguimos compreender o que os ensinamentos evangélicos significam. A fidelidade, a justiça, mesmo no pouco, é algo difícil de realizarmos em nós. O que dirá então no muito? 

Como o apóstolo Paulo de Tarso, ainda que demoremos, um dia faremos a mesma pergunta 5“quem me separará do amor de Cristo”?


Referências:
 


1. XAVIER, Francisco Cândido. Fonte Viva. 10ª ed. Rio de Janeiro, FEB, lição 75.

2. Idem, lição 177.

3. ROHDEN, Huberto. Sabedoria das Parábolas.  Martin Claret, 12ª ed. São Paulo/SP, pg. 76.

4. SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e Ensinos de Jesus. 27ª ed. Casa Editora O Clarim, Matão/SP, capítulo O Mordomo Infiel.

5. PAULO (Romanos, 8:39.).


 
 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita