Cinco-marias

por Eugênia Pickina

 

Lidar com os medos


A noite acendeu as estrelas porque tinha medo da própria escuridão
Mario Quintana


Sentir medo na infância é comum. E não é um medo ridículo, mas sim tocante, desamparado, ruidoso, que exige, por parte do adulto, atenção e respeito.

Lembro de um retrato de um homem velho, sobrecenho feroz, barba comprida, pendurado na sala da minha mãe e que me metia medo. Não ficava naquele ambiente sozinha por nada e só abandonei o pavor mais crescida, quando conheci a história do velho parente, abandonado jovenzinho pela noiva no altar. Simples e bom de coração, não conseguiu superar o evento difícil e, por isso, viveu até o fim solitário e recluso...

A criança pode sentir medo. Se ela chorar, relatar fantasias – monstros, bichos, ladrões – converse com ela. Aproveite o momento para orientar a coragem, dizendo ao seu filho ou à sua filha que os adultos também sentem medo, explicando, com exemplos simples sobre a importância de enfrentar o que nos assusta. Ainda, para a criança pequena, respeitar o ritual do sono ajuda muito: pijamas, ler ou contar uma história adequada à idade, oração e abraço de boa noite. 

Se a criança acordar assustada no meio da noite, tranquilize-a, não a tire do quarto, se possível a mantenha na cama, fazendo-lhe companhia, a fim de que se sinta segura e acolhida.

Tenho comigo que as crianças, no pátio da infância, inventam sem preguiça, como nuvens que se desenrolam, histórias sem fim. Sem fim é a noite: e tudo acontece, tudo... Assombros e assaltos. Consequentemente, quando a criança expressa medo, nunca a ameace, não a compare com o irmão, com outras crianças, não a chame de medrosa, instalando nela, desde cedo, uma autorreferência negativa.

De outro lado, não podemos esquecer de que pais superprotetores têm mais chance de gerar filhos fóbicos. Aquelas atitudes cotidianas de dizer ao filho ou à filha “não faça”, “olha isso”, “cuidado”, acaba por gerar uma pessoa com medo de tudo. Isso não quer dizer deixar os filhos fazerem o que bem entendem, porque os limites educam e é essencial ensinar a criança a se defender de situações perigosas, contudo sem amedrontá-la, sem violência, de acordo com a capacidade de entendimento que ela apresenta em cada momento.

A educação tem como meta embasar a autonomia do ser humano. Isso requer que a criança (também) vá aprendendo gradativamente a lidar com seus medos. Afinal, crescer, alguém duvida?, nunca foi uma tarefa fácil.


Notinha

O medo é uma emoção comum, sentida por todas as pessoas e em diferentes momentos da vida. Há medos considerados universais como o medo do escuro, medo da rejeição, medo da solidão, medo da morte, e que já aparecem na infância. E existem também os medos específicos, estruturados a partir de certas experiências biográficas, como é o caso de alguém que foi mordido por um cão fox terrier na primeira infância e, com isso, cresce e passa a sentir medo de cachorro, por exemplo. Esse último medo, todavia, pode ser avaliado/cuidado por profissionais adequados.

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita