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por Bruno Abreu

 

A condenação do Eu


Vivemos reclamando liberdade sem percebermos o que nos aprisiona.

Quando falamos em falta de liberdade, surge-nos logo a ideia dos outros, o quanto nos sentimos sujeitos a abdicarmos de nossa liberdade para não chocarmos com os outros.

A ideia mais generalizada, é que, sentimos falta de liberdade porque não podemos fazer o que queremos, pois vivemos em grupo e temos de sujeitar, anulando as nossas vontades e desejos.

A um determinado nível superficial de consciência, esta é uma imagem que nos parece verdadeira. Os outros agem e nós temos de sujeitar ou temos vontades de fazer diferente e temos de conter.

A análise de nossa parte é feita numa “zona” de consciência muito superficial, não é aqui que acontece a falta de liberdade.

Nós sentimos de forma inata essa falta e associamos ao que nos parece lógico, por o nosso nível de consciência ser tão superficial e limitado.

Jesus diz-nos que um dia conheceremos a verdade e que esta nos libertará, pois somos escravos e nem nos apercebemos.

Sentimo-nos prisioneiros por não agirmos como queremos, mas se entrarmos um pouco mais em nós, podemos perguntar de onde nasce essa vontade.

As vontades são um resultado da formação de carácter, levando em consideração a nossa individualidade.

A psicologia chama isto de Ego. Estas formas de vontade nascem do inconsciente, como impulsos, mas nós só as vemos no consciente em forma pensamento, acreditando que foi uma escolha nossa naquele momento.

Nós falamos português, não por escolha, mas porque é o que sabemos, ou seja, um condicionamento mental e não uma liberdade.

Se formos a uma pastelaria, escolheremos o que mais gostamos, não por liberdade, mas por condicionamento do passado. Nós achamos que escolhemos por liberdade, porque a imagem que nos surge, é de nós em frente a vitrine e escolhemos o que gostamos.

Porque escolhemos o que gostamos? Em determinada altura do passado, experimentamos e elegemos aquele doce como um dos preferidos, então no futuro, nasce em nós o desejo desse condicionamento, até trocarmos por outro.

Assim acontece a nossa vida, temos tudo eleito, nascendo do inconsciente as escolhas automatizadas perante a vida e chamamos isto de liberdade.

Quanto mais difícil for o nosso carácter, com maior apego aos defeitos humanos, mais escravizados somos, menos liberdade temos.

Quem deseja ter a liberdade de exercer a agressividade ou a raiva? Ou são impulsos que não conseguimos conter, que muitas das vezes nos arrependemos depois de acontecerem?

As más tendências humanas nascem do inconsciente e levam-nos como tsunamis gigantes, sem exercermos qualquer escolha.

Nas más tendências, tais como nos vícios, podemos ver com facilidade a falta de liberdade que temos. Nas vontades “comuns” temos maior dificuldades, por estas serem a maior parte, mas podemos perceber que resultam dos hábitos.

Não existe liberdade nos hábitos, pelo contrário, é uma repetição de algo, como um vício. Como não rotulamos de vício, achamos que é liberdade, e quando não os podemos exercer, apelidamos de falta de liberdade. Na forma lógica de raciocínio podemos concluir que o hábito é um impulso repetidor do passado que nos inibe da verdadeira liberdade.

O carácter é a acumulação de hábitos ao longo do tempo, em especial na altura infantil, que nos levam a repetir a forma de funcionamento. Os vícios morais, como a maledicência, o orgulho ou o egoísmo, nascem desta forma de estar, que chamamos carácter e que a psicologia apelida de Ego.

O carácter é o velho Eu a funcionar, com a repetição do que achou melhor para si, ao longo das experiências, qual a liberdade que encontra nisto?

Na teoria, conseguimos perceber tudo isto, mas a prática é bem diferente. Da próxima vez que surgir uma resposta mental de indignação a um acontecimento, pergunte se lhe estão a roubar a liberdade de ser diferente ou se a liberdade que pede não é apenas um impulso que lhe rouba a verdadeira liberdade?

O Mestre da Vida, diz-nos que conheceremos a verdade e esta nos libertará. Podemos perceber que a liberdade acontecerá da libertação dos condicionamentos de nós próprios, a maioria nem percebe que os tem. Os desejos, os impulsos, que aparecem em forma pensamento são condicionamentos, no entanto para nós, o condicionamento é não poder realizar o desejo, não compreendendo que aquela realização é o fortalecimento do condicionamento do ser, aumentando uma forma de ser repetitiva de hábito.

Olhe para dentro de si, perceba o funcionamento condicionado a que estamos sujeitos, procure compreender esse funcionamento. Questione de onde vem e como é formado.

A liberdade é uma conquista do autoconhecimento que nos eleva a moral e aumenta o livro arbítrio que é condicionado pela repetição dos hábitos desejosos e viciantes, onde se inclui as formas de carácter.

O Eu ou Ego está condenado a sua própria prisão, onde não consegue ver as grades por se formarem dos hábitos que o constrói.


 
 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita