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por Ricardo Orestes Forni

 

O sofrimento do sofrimento


“Chega um momento em nossa vida em que é preciso abandonar o sofrimento.” – do livro Pensamentos Que Ajudam


Reencarnamos para sofrer? Não! Absolutamente não! Retornamos à carne para progredirmos moralmente e sermos felizes tendo uma existência produtiva!

Mas como assim?! O sofrimento solapa a tranquilidade de muitas pessoas que são impedidas de serem felizes!

Vamos lá. Se uma pessoa recebe o diagnóstico de ser diabética ou portadora de pressão alta que exigirá tratamento pelo restante da vida no corpo, ela pode ter dois tipos de sofrimento: o sofrimento pelo diagnóstico recebido e o sofrimento de não poder comer mais doce ou alimentos carregados no sal, tipo embutidos, que acompanhavam a cerveja gelada no verão.

Esse segundo sofrimento relativo ao controle com a alimentação que impossibilita o consumo de produtos agradáveis ao paladar da pessoa é um acréscimo de sofrimento perfeitamente contornável.

O diabético dispõe dos produtos denominados diet e os hipertensos de vários recursos que podem atenuar o uso exagerado do sal, que era agradável ao paladar. Sim, porque o hipertenso não está privado de maneira absoluta desse tempero em suas refeições, mas sim aconselhado ao uso moderado do produto e de temperos outros que disfarçarão a pouca quantidade empregada daquilo que é nocivo à sua saúde.

Até estas linhas falamos em atender aos anseios do corpo físico. Será que não existe algo mais importante no homem, Espírito reencarnado, que precisa também de certa “dieta”?

Paulo, já no final de sua existência física, afirmava que havia aprendido a ser feliz com o que tinha. Quem leu a história de vida do apóstolo entende que a felicidade de Paulo era ter servido a Jesus porque, materialmente falando, só conheceu a perda de várias situações cômodas de que era detentor. A posição no Sinédrio, a noiva Abigail, o desprezo dos próprios familiares. A morte de Estêvão, as prisões, as pedradas, as perseguições, as chicotadas vieram agravar suas perdas... E mesmo assim declarava-se feliz!

Encontramos o sofrimento em nosso retorno à vida material como forma de expiações ou provações, que é o que justifica nossa volta. Se não fosse para não nos encontrarmos com as lições de que temos necessidade, o que justificaria a reencarnação? Os encontros e reencontros não têm sido agradáveis? Observemos o presente!

Qual seria, então, a “dieta” necessária ao Espírito que transita pela estrada evolutiva? Exatamente abandonar o sofrimento, ou, pelo menos, o sofrimento do sofrimento a que nos referimos acima.

Nesta altura do artigo, muitos indagarão: como abandonar o sofrimento se ele, o sofrimento, não nos abandona?

Como abandonar o sofrimento ocasionado pela partida de um ente querido, por uma enfermidade grave; uma situação financeira que comprometa o sustento dos filhos; a dissolução de um lar por motivo de egoísmo, orgulho ou vaidade?

Paulo, como já mencionamos, apoiou-se no serviço a Jesus, mas e nós, o que fazemos de tão meritório para sofrermos menos?

Agradecermos e retribuirmos as bênçãos que recebemos até a data em que o infortúnio veio nos visitar é um bom caminho.

A vida é uma montanha russa. Num momento o “carrinho” em que estamos sentados sobe lentamente e é só alegria. A saúde nos envolve. A situação financeira está sob controle. O lar está em paz. Os filhos vão bem, obrigado.

Mas existe aquela hora em que o “carrinho” despenca trilhos abaixo. Nessa hora em que tudo parece conspirar para a nossa derrota, para o nosso fracasso, não podemos banir da lembrança que tivemos nossos momentos de tranquilidade que foram tão suaves que deixamos que eles escapem do nosso arquivo mental.

Não suportaríamos em nosso estágio evolutivo apenas nos encontrarmos com o sofrimento. Somente os Espíritos de alta evolução suportam tal situação, como nos ensina o Espírito Alcíone no livro Renúncia. Mas quão distante estamos dela! Deus sabe disso de maneira plena e permite exatamente o peso que temos condições de suportar.

Para melhorar nossas reflexões sobre abandonar o sofrimento, vamos nos valer de um trecho da página do livro Pensamentos Que Ajudam, do doutor José Carlos De Lucca, editora Intelítera, na página intitulada A outra margem:


“Abandonar o sofrimento é deixar o papel de vítima, aceitando que a vida é imperfeita, que nem sempre a felicidade nos fará companhia, que dias tristes também fazem parte do nosso roteiro, mas que, nem por isso, a vida deixa de ser boa e bonita de ser vivida. Quando abrirmos mão do sofrimento, daquele sofrimento inútil, que não remenda os estragos já ocorridos, deixaremos de ser a vítima e passaremos a ser herói. E um herói se forja com luta, perseverança, coragem, flexibilidade, aceitação da realidade, esforço e uma incrível vontade de viver, apesar de todas as suas dores e fracassos. O herói sabe que o tempo de chorar é apenas o tempo de descansar a alma para o que a vida ainda lhe reserva adiante.”


Lembro-me bem de uma entrevista com o espetacular ator Paulo Autran quando perguntaram a ele se tinha medo da morte. E ele com muita tranquilidade respondeu ao repórter que não, porque o que embelezava a vida, segundo ele, era exatamente a morte. Se ela não existisse não perceberíamos a beleza da vida.

Que definição perfeita desse gênio das artes dramáticas!

A imperfeição da vida é que confere a ela toda a beleza e o valor de estarmos em um corpo transitório aqui na Terra, porque se a vida fosse perfeita sob o aspecto material, ela se transformaria numa imensa monotonia onde não encontraríamos recursos para abandonar o sofrimento que o tédio nos imporia.


 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita