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por Bruno Abreu

Qual o mundo em que quero viver?


Qual a forma com que me aproximarei de Deus?

Esta é uma pergunta muito comum feita pelos religiosos. Torna-se o objetivo principal de suas vidas. Poderíamos substituí-la por: Como chegarei ao Paraíso?

São perguntas ilusórias, que nos levam a olhar para o futuro, tão ilusório como a pergunta.

Definimos a vida e tudo o que ela inclui, onde estamos nós próprios, pelas ideias construídas na forma de perceção do passado. Tudo o que olhamos é passado, quando vivemos dessa forma, e o futuro que nos parece novo é uma ideia com base no passado, logo tem que ser idêntico ao passado, sem nada de novo.

Construímos o nosso ser e a nossa vida neste método e depois construímos todas as preocupações em volta destas imagens. Uma vida mental que acreditamos ser a vida que vivemos.

A criação das imagens ou ideias acontece com tudo. Quando encontramos alguém conhecido, logo temos uma imagem desta pessoa, uma opinião, embora todos estejamos de acordo em que as pessoas mudam diariamente. A pessoa que sou hoje não é a que eu era há dez anos ou há um ano, ou a pessoa de ontem.

Hoje, que pessoa é? A ideia de que somos este corpo faz com que nós pensemos que as pessoas são sempre as mesmas, mas a parte psíquica ou mental mostra que somos uma evolução constante, para melhor ou pior.

Que pessoa é? Neste momento. Repare que tem de fazer a mente funcionar e, através das ideias, caracterizá-la a si próprio. Por quê? É um boneco de barro?

O passado se tornou mais importante que o presente e por isso nós recorremos às ideias para vivermos. Temos uma ideia sobre o trabalho, o marido ou a mulher, os filhos, a casa, temos ideias sobre tudo e essas ideias tornaram-se a nossa vida.

Criamos até ideias sobre as emoções e vivemos estas através dessas ideias, as boas e as más. Amamos através da ideia, por isso quando os outros fazem algo de que não gostamos, passamos a amar menos, lembrando essa situação, mas, quando os outros fazem algo que nos toca, amamos mais, lembrando esse episódio.

Odiamos os outros pela ideia que temos deles e a lembrança do que nos fizeram, que não deixa de ser uma ideia. O mais grave é que esta forma de funcionamento nos passa despercebida, então não percebemos que os outros também funcionam com base em suas ideias, construídas conforme as perceções destes. Raramente duas pessoas vivem a mesma situação, por as vivermos através das nossas perceções que são criadas com base nas ideias que valorizamos e construímos, cada um da sua forma. Se é casado/a fale com o seu cônjuge sobre o passado do seu casamento e perceberá que parecem existir dois casamentos.

Numa discussão, com os ânimos alterados, essas ideias são muito mais fortes, fazendo com que rapidamente a perceção de cada um tome o seu caminho, separando os dois “lutadores” em “duas” discussões, em que, em suas cabeças, acham-se cheios de razão. Cada um analisa a discussão com base em suas ideias e perceções, como poderiam não ter razão?

Somos completamente cegos a essa forma de funcionamento, o que nos mantém presos a ela, sem qualquer deslumbre do seu funcionamento.

“Perdoa-lhes Pai porque não sabem o que fazem.”

“Vós sois escravos.”

Perdoar é eliminar uma ideia, ver de novo essa pessoa.

O mundo das ideias é o caminho para o agrado de Mamon, o mundo que nos leva a sermos egoístas, orgulhosos, a sentirmos raiva e todas essas emoções mesquinhas construídas por nós.

Quando lhe pergunto quem é? Recorre aos adjetivos para se personalizar e essa personalização é de onde nascem as ações, a isto chamamos carácter. Este carácter leva em consideração tudo o que tem, não só os bens materiais, mas em especial as pessoas à volta. Foi construído com as suas escolhas após perceções do que aconteceu em cada segundo de sua vida. Claro que sofreu influência da moral que foi construída ao longo de milhares de anos, como na próxima vida terá influências da que continua a construir.

Sempre ouvimos dizer que o caminho é o abandono das más tendências, o que parece certíssimo senão nem o planeta sobrevive, forma de falar pela destruição que causamos.

Tem de acontecer uma mudança em nós, nossa evolução tecnológica trouxe-nos uma sabedoria muito grande com que construímos coisas impressionantes, mas nossa moral leva-nos a construir “brinquedos” altamente destruidores.

Quando pergunto quem é? Não recorra ao pensamento e permaneça em silêncio para obter essa resposta; o caminho das ideias já conhece, tem sido a sua vida, o do silêncio é aquele em que Deus em silêncio escuta e dá-se a aproximação de Deus.

A luta que acontece na humanidade, para a passagem ao próximo nível, é o abandono de si própria.

Esta frase pode parecer assustadora, mas não é. Se disser que é abandonar as más tendências, vai dar ao mesmo. Estamos a abandonar o personagem que criamos e vive nas ideias através do pensamento, para conhecer o filho de Deus.

O primeiro tem sido a névoa mental que nos tem iludido e que não nos deixa olhar mais para dentro. Ao desconfiarmos deste e negarmo-nos a viver dirigidos por este, fazemos um esforço para viver no presente, sem ideias a fabricarem a vida, e a névoa começa a dissipar-se, aproximando-nos do reino de Deus.

Sei que é tão difícil que normalmente as ideias não param mais de 10 segundos, mas este é o jogo.

“Não podeis agradar a dois Senhores.”

O silêncio parece-nos nada, mas com o cultivo deste percebemos que as más tendências nascem das opiniões, ou seja, ideias, baseadas em outras ideias, um castelo de ideias e perceções, e a paz e a felicidade nascem na inexistência destas ideias. A grande dificuldade é a tentação de todas estas ideias que nos tornam “importantes”.

       

Bruno Abreu reside na cidade de Lubango, Angola.

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita