Artigos

por Rogério Coelho

 

O temor da morte


O medo da morte deve ser enfrentado através do exercício da razão e da lógica

 

“Se alguém guardar a minha palavra, nunca verá a morte.” - Jesus. (João, 9:51.)

 

A Humanidade ainda está longe de perder o pavor provocado pela morte, uma vez que foi “cozinhada” durante séculos, no caldo cultural judaico-cristão que a pintou com as cores mais pesadas e tristes que já existiram.

Kardec esclarece[1] bem essa questão, afirmando que para libertar-se dessa fobia faz-se necessário encarar a morte sob o seu verdadeiro ponto de vista, isto é: penetrar pelo pensamento o mundo espiritual, fazendo dele uma ideia tão exata quanto possível, visto que tal temor decorre da noção insuficiente da vida futura.

Assim que nascemos começamos a morrer, e segundo podemos aprender com a nobre Mentora Joanna de Ângelis[2] em psicografia de seu pupilo Divaldo Franco: “(...) nesse processo de transformações incessantes, chega o momento da parada final dos equipamentos biológicos, e tal ocorrência é perfeitamente natural, não podendo responder pelos pavores que têm sido cultivados.

(...) Um aprofundamento mental demonstra que a morte não dói, não apavora, mas, o estado psicológico de cada um, em relação à mesma, transfere as impressões íntimas para o exterior, dando curso às manifestações aparvalhantes.

A Psicologia Transpessoal, lidando com o ser psíquico, (o ser espiritual), sabe-o em processo de evolução, entrando no corpo — reencarnação — e dele saindo — desencarnação — da mesma forma que o corpo se utiliza de roupas, que lhe são necessárias e dispensáveis conforme as ocasiões. O simples hábito de dormir, quando se mergulha na inconsciência relativa, é uma experiência de morte que deve servir de padrão comparativo para o fim do processo biológico.

Conforme o eu profundo considere a morte, povoando-a de incertezas, gênios do mal, regiões punitivas ou aniquilamento, dessa forma a enfrentará. O oposto igualmente se dá: vestindo a morte de esperança de reencontros felizes, de aspirações enobrecidas, de agradável despertar, ocorrerá o milagre da vida. O medo decorre tão somente da ignorância da realidade espiritual e do apego ao transitório físico.

Freud afirmava que o instinto da morte é superior ao de conservação da vida, o que é perfeitamente natural, tendo-se em vista que o corpo é fenômeno, e este passa, permanecendo a causa, que é a energia, a vida em si mesma. A psicoterapia preventiva, como curadora para o medo da morte, propõe uma conduta harmônica com os níveis superiores de consciência desperta, lúcida, avançando para a transcendência do eu, até culminar na identificação com a Cósmica.

Pensar e agir bem; amar e amar-se; servir, como forma de ser feliz; vincular-se à Fonte da Vida Perene, causal e terminal; meditar, beneficiando-se com o autodescobrimento e tornando-se um agente de esperança e de paz, eis como viver sem morrer e morrer para perpetuar a vida”.

Em sua portentosa obra[3], Léon Denis explica: “(...) a morte é o estado de exteriorização total e de libertação do "eu" sen­sível e consciente, afirmando, também que o nascimento é como que uma morte para a alma, que por ela é encerrada com o seu corpo etéreo no tú­mulo da carne. O que chamamos morte é simplesmente o retorno da alma à liberdade, enriquecida com as aquisições que pôde fazer durante a vida terrestre; e vimos que os diferentes estados do sono são outros tantos re­gressos momentâneos à vida do Espaço. Quanto mais profunda for a hipnose, tanto mais a alma se emancipa e afasta. O sono mais intenso confina com a primeira fase da vida invisível.

 “(...) Na realidade, as palavras sono e morte são impróprias. Quando adormecemos para a vida terrestre, acorda­mos para a vida do Espírito. Produz-se o mesmo fenô­meno na morte; a diferença está só na duração.

CHEGADA AO MUNDO MAIOR

A situação do Espírito depois da morte é a consequência direta das suas inclinações, seja para a matéria, seja para os bens da inteligência e do sentimento.  Se as propensões sensuais dominam, o ser forçosamente se imobiliza nos planos inferiores que são os mais densos, os mais grosseiros.  Se alimenta pensamentos belos e pu­ros, eleva-se a esferas em relação com a própria natureza dos seus pensamentos.

Swedenborg disse com razão: "o Céu está onde o homem pôs o seu coração"; todavia, não é imediata a classificação, nem súbita a transição.

Se o olhar humano não pode passar bruscamente da escuridão à luz viva, sucede o mesmo com a alma. A morte faz-nos entrar num estado transitório, espécie de prolon­gamento da vida física e prelúdio da vida espiritual. É o estado de perturbação, estado mais ou menos prolongado segundo a natureza espessa ou etérea do perispírito.

Livre do fardo material que a oprimia, a alma acha-se ainda envolvida na rede dos pensamentos e das ima­gens - sensações, paixões, emoções, por ela geradas no decurso das suas vidas terrestres; terá de familiarizar-se com a sua nova situação, entrar no conhecimento do seu estado, antes de ser levada para o meio cósmico adequa­do ao seu grau de luz e densidade.

A princípio, para o maior número, tudo é motivo de admiração nesse outro mundo onde as coisas diferem essencialmente do meio terrestre. As leis da gravidade são mais brandas; as paredes não são obstáculos; a alma pode atravessá-las e elevar-se aos ares. Não obstante, continua retida por certos estorvos que não pode definir. Tudo a intimida e enche de hesitação, mas os seus amigos de lá a vigiam e guiam-lhe os primeiros voos.

Os Espíritos adiantados depressa se libertam de to­das as influências terrestres e recuperam a consciência de si mesmos. O véu material rasga-se ao impulso dos seus pensamentos e abrem-se perspectivas imensas. Compreendem quase logo a sua situação e com facilidade a ela se adap­tam. Seu corpo espiritual, instrumento volitivo, organis­mo da alma, de que ela nunca se separa, que é a obra de todo o seu passado, porque pessoalmente o construiu e teceu com a sua atividade, flutua algum tempo na atmos­fera; depois, segundo o seu estado de sutileza, de poder, corresponde às atrações longínquas, sente-se natu­ralmente elevado para associações similares, para agru­pamentos de Espíritos da mesma ordem, Espíritos luminosos ou velados, que rodeiam o recém-chegado com solicitude para o iniciarem nas condições do seu novo modo de existência”.


 

[1] - KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. 51.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2003, 1ª parte, cap. II.

[2] - FRANCO, Divaldo. O ser consciente. Salvador: LEAL, 1993, p. 112-113.

[3] - DENIS, Léon. O problema do ser, do destino e da dor. Rio [de Janeiro]: FEB, 2008, p. 202.

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita