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por Bruno Abreu

 

Indulgência e resignação


A primeira história sobre a humanidade na Bíblia fala acerca de Adão e Eva. Resumidamente, descreve um casal que vive num paraíso, que a única coisa que lhe foi proibida foi comer uma determinada fruta. Esta fruta, tinha como árvore a chamada do conhecimento.

A Eva, tentada por uma cobra, acabou por comer e dar a comer a referida fruta a Adão.

Esta fruta da árvore do conhecimento trouxe-lhes o conhecimento do certo e do errado ou do bem e do mal, e nessa altura tiveram de abandonar o paraíso.

Como pode o conhecimento sobre o bem e o mal fazer mal alguém? Este é o entrave ao entendimento deste ensinamento.

Por que discutem duas pessoas?

Têm opiniões diferentes sobre algo e por isso chocam. O conhecimento que têm e os ocupa mentalmente, como feitio ou forma de caracter, são diferentes e cada um quer impor o seu ponto de vista, adquirir a taça da razão que alimenta o Orgulho ou o Ego. Apegados a isto, discutem como se suas vidas dependessem disso.

Parece que o apego ao conhecimento, a fruta desta árvore que existe em cada um de nós, continua a fazer estragos, alimentando e motivando o funcionamento da humanidade.

Este conhecimento que o ensinamento da história de Adão e Eva fala, não é um conhecimento tecnológico. Embora de volta da tecnologia ou profissões também existam alguns confrontos, podemos perceber o que é melhor nos manuais e se não for suficiente, o tempo de trabalho trará a melhor resposta.

O que o referido ensinamento nos traz é sobre o conhecimento moral, o que nos faz discutir com a mulher ou com o filho e por aí fora. É fácil de perceber que o que não é tecnológico é moral, ou seja, a maioria das lutas que a humanidade tem, incluindo dentro de cada um de nós, é moral.

A harmonia que tanto almejamos não acontecerá por passarmos a ter todos o mesmo conhecimento, isto é impossível de acontecer. Cada um de nós é único e a nossa forma de estar ou caracter constrói-se de um caminho único e um aprendizado ímpar.

Todos nós teremos formas de ver diferentes, em muitas situações. A consciência disto leva-nos ao “antibiótico” natural, a indulgência.

A consciência não vem do conhecimento teórico, esta é muito prática e só acontece com o treino constante alicerçado em uma vontade, que esta sim, pode iniciar no conhecimento teórico. A importância do estudo.

A consciência da diferença vem da prática de nos permitirmos aceitar as diferenças. Ao princípio, obrigando-nos, mas com o tempo e desenvolvimento de consciência, de forma natural, por a diferença ser uma verdade inegável.

A indulgência, o antidoto ao veneno do conflito, é uma forma de estar que não é afectada pela diferença, ultrapassando a aceitação.

A aceitação é um caminho necessário, imposto por nós próprios, para chegarmos a indulgência.

Se queremos crescer moralmente e sabemos que aceitar os outros é importante, pelo menos de forma teórica, ao início, temos de nos obrigar a aceitar essas diferenças, lutando com o velho hábito que nasce em nós, da não aceitação ou indignação. Esta luta é só nossa, o outro é como é, e a aceitação ou a não aceitação, reside apenas dentro de nós.

Ao nos encararmos consecutivamente, ganhamos consciência de que somos muito apegados as nossas ideias, que exaltam logo a negatividade perante os outros e perante a vida.

Esta consciência, que se vai desenvolvendo aos poucos, vai-se libertando das amarras dos certos e errados que nos têm dirigido, tornando a aceitação em indulgência.

Na indulgência não aceitamos nem deixamos de aceitar. Já percebemos de forma consciente e prática de que o outro é diferente e não nos cabe a nós alterá-lo, pois isso seria um enorme movimento de orgulho e egoísmo de nossa parte, então não existe nada para aceitar, porque não existe nada a modificar.

A indulgência oferta-nos uma paz enorme. Se não existe nada para alterar, não existe conflito, logo a permanência da paz é uma realidade.

Se a indulgência é a forma de estar correcta perante os outros, sem qualquer vontade de alterar o outro, a resignação é o termo utilizado para a mesma forma de estar perante os acontecimentos da vida.

A indulgência e a resignação são a consciência de sabermos que estamos no sítio certo, com as pessoas certas, no tempo certo, sem qualquer desejo de que as coisas ou as pessoas sejam diferentes.  A plena confiança em Deus.


Bruno Abreu reside em Lubango, Angola.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita