Joias da poesia
contemporânea

Autor: Juvenal Galeno

 

Pobres


Mal clareia o Sol a serra,

Toca a vida a despertar:

O pobre se pôs há muito,

Sem descanso, a labutar.

Ao levantar-se da cama,

Inda é espessa a escuridão,

Persegue-lhe a precisão.

Ao acordar, ele escuta

O coração a gritar:

«Quem não trabuca não come

Já chega de repousar!»

Busca, então, o seu trabalho,

Tudo ajeita, tudo faz,

Rasga a terra, corta os matos,

Luta e sua, não tem paz.

Planta o milho, planta a cana,

Batatas, couves, feijão;

Três quartas partes de tudo

Pertencem ao seu patrão.

Quando a semente germina

E os ramos querem crescer,

Vem a seca sem piedade

E o pobre espera chover.

Não vem a chuva, porém;

Nada existe no paiol,

As plantas já se amarelam,

Arde a terra, queima o Sol.

Quando o pobre vai à mesa,

O estômago pede mais,

Mas se quer repetições,

Que cuide dos mandiocais.

Redobra o pobre os serviços,

Espalha o pé nos gerais,

Ah! que a água já está pouca

Nos rios, nos seringais.

Contudo, ele espera sempre

Do Deus que o ama, que o vê,

E, sempre resignado,

O pobre nunca descrê.

O certo é que ao fim do tempo

De constante batalhar,

Aguarda a minguada espiga

Que decerto há de ficar.

Plenamente contentado

Com o pouco do seu suor,

Deus lhe dará no outro ano

Uma colheita melhor.

Se geme, se sofre dor,

Não possui um só real

Pra consultar um doutor.

Então, resolve pedir

Ao patrão que sempre o tem,

Mas o patrão avarento

Não adianta vintém.

Arrasta-se e vai ao médico

E lhe expõe o seu sofrer:

«Não tem recomendações?

Então não posso atender.»

O pobre, humilde e paciente,

Regressa para o seu lar,

E pensa nos outros meios

Da saúde lhe voltar.

E põe em prática os meios:

As beberagens, o chá,

As promessas aos seus santos,

Os vinhos de jatobá.

Ai! que sorte rude e amarga

Do pobre sempre a sofrer:

Se vive para o trabalho,

Trabalha para comer.

Se a morte vem ao seu ninho

E lhe rouba o filho, os pais,

Não lhes pode dar a missa,

Que o padre cobra demais.

Dá-lhes porém seu tesouro,

Sublime estrela que brilha

Da mais rica devoção —

A prece que nasce d’alma,

Que fulge no coração.

Mesmo assim quanta tortura,

Que amargosa a sua dor!

A todo o instante da vida

Luta o pobre sofredor.

Se tem pão não tem saúde,

Se tem saúde, não tem

Quem o ampare, quem o ajude,

O braço amigo de alguém.

Se outrem lhe ofende e ele pede

Da Justiça a punição,

A Justiça o encarcera

Com a sua reprovação.

Não tem casas de morada,

Nem terrenos, nem covil;

Se lhe falta o pão do dia

Falta azeite no candil.

Se bate à porta do rico,

Mormente dum rico mau,

Os cães o tocam da porta,

E em vez de pão, ganha pau.

O pobre só tem na vida

A doce mão de Jesus,

Que o cura na enfermidade,

Que na treva lhe dá luz.

Mal do pobre se não fora

O carinho dessa mão,

Que o conforta na desgraça

E ampara na provação.

Mal dele se não houvesse

A vida depois da dor,

Após a morte, onde existem

Justiça, ventura, amor.

 

Do livro Parnaso de Além-Túmulo, obra psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.


 


 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita