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por Marcos Paulo de Oliveira Santos

 

Nosso Lar: nas zonas inferiores


O célebre romance "Nosso Lar", psicografado por Chico Xavier e ditado pelo Espírito André Luiz, veio a lume em 1944. Tornou-se um clássico da literatura espírita brasileira e uma película cinematográfica de enorme sucesso.

Trata-se de narrativa dos primeiros anos do médico André Luiz, após a sua desencarnação, numa colônia espiritual "Nosso Lar". A obra está dividida em 50 capítulos e, neste texto, abordo o primeiro capítulo intitulado "Zonas inferiores".

Meu comentário será apenas daqueles trechos que mais me impactaram e, obviamente, ao sabor da minha emoção e da minha capacidade de compreensão do momento.

Diz André: "Eu guardava a impressão de haver perdido a ideia de tempo. A noção de espaço esvaíra-se-me de há muito. Estava convicto de não mais pertencer ao número dos encarnados no mundo e, no entanto, meus pulmões respiravam a longos haustos".

Aqui, o André se vê diante de um dilema. Ele, que fora médico, estava convicto da sua passagem para outro plano e, no entanto, não conseguia compreender o que se passava consigo. Ele também não tinha a noção de tempo, porque no mundo espiritual essa dimensão se dá de outra maneira. A lição que ele quer nos transmitir é a da imortalidade da alma; a existência da individualidade mesmo com o perecimento do corpo físico. A sobrevivência do ser com todas as suas idiossincrasias.

Mais adiante ele diz: "O medo me impelia de roldão. Perdera toda a noção de rumo. O receio do ignoto e o pavor da treva absorviam-me todas as faculdades de raciocínio, logo que me desprendera dos últimos laços físicos, em pleno sepulcro!"

Eis um fato de extrema relevância: o medo! Trata-se de uma condição que nos acomete quando estamos diante de algo que desconhecemos. Daí a importância de estudarmos as verdades espirituais; meditarmos e procedermos com a faxina interior para a própria iluminação. Visto que aquele que detém conhecimento e, principalmente, claridades interiores, não teme os desdobramentos da realidade espiritual.  

André Luiz afirma, diante da situação difícil que estava a viver, que "Em momento algum, o problema religioso surgiu tão profundo a meus olhos. Os princípios puramente filosóficos, políticos e científicos, figuravam-se-me agora extremamente secundários para a vida humana".

Quando o autor faz esse tipo de afirmativa, ele não quer dizer que devemos desconsiderar as diversas áreas do conhecimento humano. Mas que devemos SIM ter tempo para o processo de iluminação do espírito. Quantos de nós dedicamos alguns minutos para a iluminação interior? Para a mudança comportamental? Para a prática da caridade?

Diz ele: "De fato, conhecia as letras do Velho Testamento e muita vez folheara o Evangelho; entretanto, era forçoso reconhecer que nunca procurara as letras sagradas com a luz do coração. Identificava-as através da crítica de escritores menos afeitos ao sentimento e à consciência, ou em pleno desacordo com as verdades essenciais. Noutras ocasiões, interpretava-as com o sacerdócio organizado, sem sair jamais do círculo de contradições, onde estacionara voluntariamente".

O que se depreende do trecho acima é que ele não lia as escrituras com o escopo de buscar o conteúdo profundo para a transformação interior. Mas, tão somente, para criticar; espezinhar; criar embaraços.

André também nos chama atenção para o uso do tempo com sabedoria, quando diz: "(...) examinando atentamente a mim mesmo, algo me fazia experimentar a noção de tempo perdido, com a silenciosa acusação da consciência". Quantos de nós perdemos tempo com questiúnculas e com atividades que nada contribuem com os valores intrínsecos?

André alerta para a importância da caridade e para a noção de coletividade. Diz ele: "Deliciara-me com os júbilos da família, esquecido de estender essa bênção divina à imensa família humana, surdo a comezinhos deveres de fraternidade".

Ele havia se fechado no próprio núcleo familiar e tudo o que era de fora não recebia a mesma atenção e zelo atribuídos aos familiares. Quantos de nós consideramos apenas os nossos e desconsideramos fria e cruelmente os que não estão no grupo familiar? Relativizamos os do “próprio sangue” e somos duros com os “outsiders”.

Por fim, ele diz: "Acendei vossas luzes antes de atravessar a grande sombra. Buscai a verdade, antes que a verdade vos surpreenda". Penso que o trecho seja autoexplicativo.

Estes, portanto, são os aspectos mais relevantes que constatei nesta unidade. São, na minha opinião, trechos relevantes, fecundos e que merecem a nossa reflexão.



 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita