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por Gebaldo José de Sousa

 

Operações de catarata e dentaduras...
 

Ao saudoso Dr. Pimentel, coautor da façanha


“Nas grandes calamidades, a caridade se emociona e observam-se impulsos generosos, no sentido de reparar os desastres; porém, a par desses desastres gerais, há milhares de desastres particulares que passam despercebidos. (...) São esses infortúnios discretos e ocultos que a verdadeira generosidade sabe descobrir, sem esperar que peçam assistência.”
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Um amigo, ao receber convite para auxiliar nas despesas de operação de catarata em um pai de família, honrado e trabalhador, mas que não dispunha de meios para curar-se, respondeu ao interlocutor: – Só participo da catarata. Para a dentadura, não posso contribuir. – Ora, de que dentadura você fala?

Relatou-lhe, então, porque esta entrou na história.

Um outro amigo nosso, que também cultiva o salutar hábito da bondade, buscando auxiliar necessitados que não têm meios de sair das agruras que enfrentam, vivenciou a dupla experiência (da catarata e da dentadura).

Não nos faltam oportunidades para fazer o bem.

Aqui, a enfermidade; ali, a fome; além, a ignorância. E ele sempre encontra meios para amenizar sofrimentos, dividindo as despesas com aqueles que o conhecem, nele confiam e respeitam essa sua capacidade de, não sabemos como, localizar em lugares distantes, criaturas anônimas que sofrem dificuldades extremas. São os “Filhos do Calvário”.

Certa feita localiza, em sítio distante, um casal de velhos vivendo miseravelmente. Para agravar a penúria, o velhinho estava quase cego, cegueira essa causada por catarata mais do que madura.

Prontifica-se a auxiliá-lo e o traz para a cidade.

Realizada a consulta médica e os exames prévios, a operação é feita com sucesso.

Acompanha a recuperação, com a aplicação dos medicamentos prescritos.

Liberado pelo médico, cuida de devolvê-lo à sua morada, onde permanecera a esposa.

Recebido efusivamente pela companheira, que o abraçava, voltou-se para ela, tristemente: “– Minha veia, como ocê tá acabada e tão feinha!...”

Na obscuridade da cegueira, não lhe via defeitos, nem rugas, nem velhice; mas, agora, senhor da luz, valorizava outra vez a beleza! E via os estragos que o tempo fizera na face de sua boa mulher. Algo irremediável, que só agora pudera ver!

Como não acompanhara as marcas que a velhice nela imprimira implacavelmente, assustou-se com os sinais do tempo, e o fato o pegou de surpresa. Não obstante, estava conformado, mas registrava essa circunstância, até como prova de que realmente a visão lhe fora restabelecida.

Contudo, o mesmo benfeitor, comovido com aquele desfecho inesperado que presenciara, conduziu agora a velhinha ao dentista e encomendou-lhe belo par de dentaduras. Após essa providência, deu-lhe um banho de loja, melhorando-lhe o aspecto e devolvendo-a, por fim, ao seu esposo, bem melhorada.

E, para surpresa dos velhos e bons amigos, dividiu com eles também esta segunda conta, aceita e paga, entre boas gargalhadas!

Na situação jocosa em que involuntariamente se envolveu, viu outra oportunidade para, mais uma vez, servir com alegria.

E dela tira – para ele e para nós –, com elevado senso de humor, lições para a vida, amando sempre aos seus semelhantes, até mesmo aos amigos, aos quais dá exemplos e oportunidades de socorrerem os infortúnios ocultos.

É assim que pratica a Caridade, e o faz por inteiro!

 

 

1. KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. Impr. Brasília: FEB, 2013. Cap. 13, it. 4, p. 173.



 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita