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Crônicas e Artigos

Ano 9 - N° 459 - 3 de Abril de 2016

CLAUDIA GELERNTER
claudiagelernter@icloud.com
Vinhedo, SP (Brasil)

 


Confiar e aceitar: reconhecendo
o bem na dinâmica da vida
 

“Nenhuma emoção em si é perigosa. Disfuncional é ficar ancorado durante muito tempo em algumas delas, já que a qualidade dos sentimentos é ir e vir, irromper e desvanecer-se.”
 – Joan Garriga Bacardi.


Segundo os Vedas¹, a causa primordial do sofrimento humano é a falta de conhecimento de quem somos, na realidade. O Espiritismo, embora não aponte uma causa específica como sendo a maior de todas, considera as questões do orgulho e do egoísmo² como fonte de sofrimento (conforme dizia Jesus), mas entende também que quando reconhecemos nossa porção sagrada e o real sentido da Vida, tendemos a abandonar vícios antigos, trocando-os por hábitos salutares, tais como a abnegação, o que acaba por corroborar com a primeira ideia.

A questão é que muitos vivem na Terra como se fossem apenas um corpo, com suas necessidades e potencialidades particulares, quando em verdade nossa essência é a parte imortal desta fabulosa combinação chamada Eu. Somos, portanto, alma, com mecanismos mentais específicos, vivendo em relação com o meio, em um tempo histórico, numa determinada cultura, utilizando-nos para isso de um corpo formado por um tipo de matéria mais densa, com seus órgãos e sistemas complexos. Como se vê, aquilo que tomamos por essencial trata-se apenas de veículo. O condutor é a alma, que preexiste e sobrevive à morte física.

Sendo assim, alguns indagam por que vivemos como se fôssemos eternos no campo físico, negando a alma, se ao longo de tantos milênios temos a informação de que a realidade é outra. 

Por certo a influência dos sentidos é enorme em nosso psiquismo, podendo nos levar a esta e outras confusões existenciais, mas é preciso refletir a respeito, buscando “ver" muito além das aparências, para então desvelar o que já existia e continuará existindo: nossa Individualidade imortal, potencialmente Crística. 

Dentro deste contexto, estas mesmas tradições de Sabedoria afirmam que a Vida  na Terra nada mais é que um campo de experimentações específicas que visam ao aprimoramento desta alma, através de estímulos ideais, de acordo com seu momento evolutivo. Ou seja, a dinâmica da existência possui uma inteligência soberana, capaz de nos impulsionar ao progresso, através de imputs pedagógicos, de acordo com nossa capacidade individual e coletiva. Ela tende ao Bem, portanto.

O que acontece é que tais estímulos nem sempre são bem-vistos ou digeridos por nós, justamente porque evitamos auscultar as situações com os olhos da alma. A dor, por exemplo, é um dos recursos que a vida apresenta, quando outros não foram suficientes para nos fazer mudar as disposições equivocadas. Chega firme, muita vez sem aviso prévio, causando sustos e aborrecimentos. Nunca para nos destruir, embora acreditemos nisso.

Então, como diminuir nossa angústia a fim de conseguirmos perceber as lições que ela nos traz?


Rumi, o famoso poeta da antiga Pérsia, já dizia que o remédio para a dor é a dor.³ Isso significa que quando olhamos para ela com honestidade e boa vontade, podemos aprender aquilo que veio nos ensinar, evitando-a, mais adiante. Afinal a Vida não lança mão de recursos desnecessários. E o que vemos com frequência é um desfilar de muxoxos e revoltas múltiplas. Desesperos, maldições e inconformações que apenas agravam o quadro, transformando a dor em sofrimento amargo, de forte intensidade e longa duração. 

Buda, dissertando sobre a questão do sofrimento, comentou acerca da primeira da segunda flechas⁴, numa analogia bastante interessante a respeito da dor causada por alguma questão alheia à nossa vontade e a forma como depreendemos o evento. O que acontece é que, segundo Sidartha Gautama, os desafios que a vida se nos apresenta são como flechas certeiras, causam dores específicas, muita vez passageiras, circunstanciais. Já a segunda flecha representa nossa resistência a estas primeiras. Nós as criamos e nos ferimos de forma desnecessária, quando nos revoltamos, nos irritamos com as demandas, estendendo e potencializando a dor, fazendo reverberar inclusive em outros que convivem conosco. 

Joan Garriga Bacardi, psicólogo espanhol, em seu livro “Viver na Alma”⁵, esclarece que o sofrimento se assenta em uma luta contra os fatos, enquanto a dor é uma emoção natural, humana e congruente. Diz ele que “Diante da dor genuína, da presença de pessoas que atravessam  verdadeiros lutos, abre-se espontaneamente nos demais a porta da compaixão, da humanidade e da solidariedade. É algo biológico. Sentimos o impulso natural do caminhar ao lado, acompanhar e apoiar os tristes e os que se consomem de tormento. Sem dúvida, o sofrimento é outro assunto, outro cantar. O sofrimento tem outras conotações e, muitas vezes, desperta nos demais o desejo de distanciamento”. (p. 115)

Isso porque o sofrimento tende a ser manipulador, egoísta por parte de quem o sente e expressa. Trata-se de posição existencial edificada na queixa, no ressentimento, no vitimismo. E quando o sofrimento toma esta forma deletéria, quase nunca desperta a compaixão natural dos demais, senão o incômodo. Aliás, como afirma o próprio Garriga, “já está mais que superada a ideia de que o sofrimento concede direitos”. (pg. 116)

A verdade é que, quem consegue integrar o difícil, atravessar seus lutos, enriquece a vida, se transforma positivamente, elevando-se. Já quem fica preso aos gemidos, olha tanto para si mesmo que seus olhos não percebem os demais e a realidade da vida.

Por certo a vida nos convoca aos desafios com certa frequência, então cabe-nos questionar: Como percebo esta realidade? Que atitude devo tomar diante desta demanda? Como posso fazer para minimizar este impacto em mim e nos outros? Como encontrar o sentido para esta dor que me abala a alma e assim aprender o que me cabe nesta experiência?

Podemos pensar que o desafio talvez seja gostar não apenas do que nos convém, o que nos é agradável ou estimado, mas desenvolver uma confiança na dinâmica da vida, aceitando suas propostas, nem sempre agradáveis, coloridas. Compreender que não há outro remédio, assumindo nossa pequenez diante do Espírito Criador, nos rendendo ao que é, sendo humildes. Jesus dizia: “Ofereça a outra Face”, o que significa: se desfaça de suas armas, confia, entrega e se entregue. Deus se ocupa. Ele sabe mais que você.

Confiar e Aceitar são, portanto, verbos que devem ser trabalhados em nosso campo emocional. Logicamente isso não significa uma postura passiva ou de desistência. Será preciso trabalhar e alterar o possível, usando nosso livre-arbítrio com sabedoria. Falamos aqui de aceitarmos o que não pode ser alterado. O passado, por exemplo. Apegar-se a mágoas, ressentimentos, é reanimar o momento da ofensa, relembrando-o constantemente, como se acabasse de ocorrer, a cada minuto. Nossos corpos sentem os impactos desta ancoragem emocional, ativando o sistema límbico, encharcando todo o córtex cerebral com estes imputs negativos, reverberando nos sistemas endócrino e nervoso autônomo, podendo promover diversas doenças. Nossa imunidade cai, permitindo se alastrem vírus, bactérias, fungos e até mesmo células cancerígenas, caso outras variáveis permitam seu crescimento.

Faz-me recordar querido professor na minha graduação – um médico muito lúcido e didático – que dizia que todos os dias criamos células adoentadas. Permiti-las crescer e tomar nosso corpo depende, também, da forma como entendemos e lidamos com a Vida. Ou seja, nossas mentes são responsáveis por praticamente 85% das doenças que desenvolvemos – explicava.

A questão central é que estes dados todos coincidem exatamente com as lições trazidas pelas Tradições de Sabedoria. Quando aceitamos, quando somos humildes perante a Vida, quando aprendemos a amar o que é, o que somos e os outros como são (assim como comenta Joan Garriga Bacardi na mesma obra), vivemos uma vida mais plena, com relativa paz, em harmonia com o seu fluxo sagrado, pedagógico, evolutivo. Sendo assim, e a partir de nós, conforme ensinava o querido Gandhi⁶, poderemos transformar o mundo, sendo a mudança que queremos ver nele. 


Referências:

 

1. Denominam-se Vedas as quatro obras, compostas em um idioma chamado Sânscrito Védico, de onde se originou posteriormente o Sânscrito Clássico. Inicialmente os Vedas eram transmitidos apenas de forma oral.  Existem dúvidas quanto à época em que foram compostos, mas aceita-se que se trata de pelo menos 2.000 a.C., ou antes.


2.
Ler em Obras Póstumas, Allan Kardec, Parte I, o capítulo “O Egoísmo e o Orgulho – Suas Causas, Seus Efeitos e Os Meios de Destruí-los”. 


3.
Rumi, também conhecido como Jalãl ad-Din Muhammad Balkhi, era um místico, teólogo e poeta persa, do sufismo. Viveu no século XII. Entre outras lições, em suas poesias dizia que nossas almas não pertencem a este mundo, mas apenas o corpo, e que devemos buscar mudar o mundo, mudando a nós mesmos.


4.
Ler a respeito no livro “O Cérebro de Buda”, do neurocientista Rick Hanson, editora Alaúde, 2012. Parte I, Capítulo 3.


5.
Livro Viver na Alma, editora Saberes, 2011, de Joan Garriga Bacardi.
 

         

 


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