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Crônicas e Artigos
Ano 2 - N° 99 – 22 de Março de 2009

MILTON  R. MEDRAN MOREIRA 
medran@via-rs.net
Porto Alegre, Rio Grande do Sul (Brasil)
   

Os novos excomungados


Você tem ideia do que significava para alguém, no Estado teocrático, ser excomungado? Atente para a etimologia da palavra: excomunhão significa literalmente ser retirado da comunhão com os outros. Pois era isso mesmo. O cristão excomungado perdia inteiramente o direito de conviver com quem quer que seja: com a sua família, com os seus amigos, com a Igreja e, pelo poder que todos reconheciam na autoridade religiosa, com o próprio Deus. 

Não podia haver maior desgraça. Aliás, aí está outra palavrinha que talvez nos ajude a imaginar a tragédia imposta a um excomungado: desgraça, literalmente, é a ausência da graça. O sujeito excomungado perdia a graça, que era da alçada divina. E, ora, se Deus o havia desgraçado, afastando-o de Sua presença, quem ousaria lhe oferecer qualquer forma de convivência? 

Nesse tempo, a fonte do Direito era basicamente uma só: ele provinha, dizia-se, diretamente de Deus. Seus intérpretes eram as autoridades religiosas, que, afinal, ungidas de Deus, detinham, só elas, a administração da verdade, que era sagrada, eterna e imutável. Por isso, também, o maior de todos os delitos era a descrença. Ausência de fé, especialmente quando expressa concretamente pela palavra ou a ação em desacordo com a verdade revelada por Deus – fonte absoluta do Direito –, se constituía na ignomínia suprema, na mais vil desobediência. Passível, pois, da excomunhão. 

Depois, bem, depois o homem foi iluminado pela concepção do Direito Natural, resgatada do antigo pensamento grego. Um de seus mais ilustres formuladores, um holandês chamado Hugo Grócio (1583-1645), ousou afirmar o Direito como algo inerente ao homem e não, necessariamente, provindo daquele Deus pessoal que regulava a vida do indivíduo e da sociedade. Para escândalo de muitos, chegou a declarar que o Direito Natural existiria mesmo que Deus não existisse ou que, existindo, não se envolvesse com as questões humanas. O Direito, a partir dali, começava a se emancipar da religião. O que não significava, necessariamente, emancipar-se de Deus. Pelo menos para aqueles capazes de percebê-lo na harmonia da natureza e na consciência do justo que repousa no íntimo do coração humano. 

Começava ali a mais fantástica aventura humana, com a qual, aliás, a religião nunca iria se conciliar. Quando, nos dias de hoje, um purpurado da Igreja declara excomungados médicos e pais de uma criança de nove anos de idade, por submeterem-na a um aborto, única forma reconhecida pela lei e a medicina de preservar sua vida e sua dignidade, ele e a instituição que representa dão clara demonstração dessa radical inconformidade. E dão, com isso, testemunho do também radical divórcio entre a religião e o ser humano. O Direito do qual se dizem representantes deixa de ser o Direito dos homens e da natureza que os envolve. Mas também não é o daquele Deus que o ser humano foi capaz de descobrir nas leis naturais – e, logo, divinas – e na intimidade de sua própria consciência. 

Razão e sentimentos, conjugados, geraram o novo homem. Este só tem uma certeza: a de que a verdade absoluta lhe é inacessível. E sempre que, em nome da verdade, lhe ameacem ou soneguem a liberdade e a dignidade conquistadas, reage com o que lhe restou de verdadeiramente sagrado nessa fantástica aventura: a sua condição humana. 

Ela, a condição humana, percebe-se hoje, é a justa medida do Direito. Em seu nome, o ser humano já pode, sem qualquer temor às suas terríveis sanções, exorcizar os antigos detentores da verdade, isolando-os em suas catedrais, para que ali, e somente ali, cultuem suas verdades eternas e imutáveis. É assim que, pouco a pouco, eles se tornam estranhos à comunhão humana. Literalmente, excomungados. Por opção própria. 
 

O autor é Procurador de Justiça aposentado e jornalista.

(Artigo publicado no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, na edição de 10/03/2009.)


 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita