Especial

por Marcos Paulo de Oliveira Santos

Principais causas do decréscimo de espíritas no Brasil apontado
no Censo IBGE 2022

 

O Censo do IBGE de 2022 registrou uma queda no número de espíritas no Brasil, passando de 2,2% em 2010 para 1,8%.
São variados os motivos para este quadro e o objetivo deste texto é, justamente, tentar compreender o cenário. A pretensão não é esgotar o assunto, mas trazer apontamentos sobre esta situação.
*     Lideranças
Primeiramente, é relevante constatar que o mundo está “carente” de referências. De bons líderes; de pessoas inspiradoras; carismáticas.
Alguns gigantes passaram por aqui e serviram de inspiração para muitos. À guisa de exemplo, podemos citar Mandela; Pepe Mujica; Papa Francisco; Irmã Dulce...
Puxando a “sardinha para o nosso lado”, no Movimento Espírita tínhamos Chico Xavier e Divaldo Franco. É do conhecimento de todos que em Doutrina Espírita não há corpo sacerdotal; lideranças hierárquicas; estrutura de poder... Mas, é inegável que boas pessoas servem de referência/inspiração para que modifiquemos para melhor os nossos comportamentos.
A falta de lideranças, recentemente, é um dos fatores desse decréscimo apontado pelo IBGE. O falecimento de ícones como Chico Xavier (1910-2002) e, mais recentemente, Divaldo Franco (1927-2025) enfraqueceu o apelo midiático e cultural do Espiritismo, tornando-o menos visível e atrativo para novas gerações.
*     ESDE
O modelo de aulas dos Centros Espíritas precisa ser revisto com urgência. Refiro-me aos Estudos Sistematizados da Doutrina Espírita (ESDE). Estes estudos, não raras vezes, configuram-se mais como “palestras” do que aulas propriamente ditas. Ou seja, há sempre um “facilitador” que fica a falar constantemente e apresenta didáticas; abordagens; metodologias extremamente tradicionais e pernósticas (com as exceções compreensíveis), não permitindo que o os cursistas possam se expressar; participar, enfim.
Não quero com isso dizer que todas as aulas devam ser dinâmicas, com brincadeiras e inovadoras, mas há que pensar numa metodologia menos “professoral” e mais dialógica, permitindo a participação e a exposição das ideias para a construção de um consenso em torno do que foi estudado. Caso contrário, não há a necessidade de se estudar em grupo. Basta que cada um estude em casa ou noutro local de sua preferência. O ESDE é justamente para fortalecer os laços entre os confrades e construir, a partir das discussões salutares, uma visão sólida do que foi estudado. É com os diferentes que se forjam os conhecimentos e se ampliam as visões de mundo.
Portanto, repensar as aulas do ESDE, os dias e horários, são fundamentais para torná-los mais atrativos.
*     Dirigentes Espíritas
Muitos não querem ser dirigentes de Centros Espíritas.
A tarefa é desafiadora!
Exige bom senso, estudo,
conhecimentos sólidos de administração e noções jurídicas, para a prestação de contas necessárias à população e ao Estado. Além, claro, de administrar uma instituição com esmero, exige-se do dirigente inteligência emocional, para lidar com os adeptos da Doutrina Espírita e simpatizantes, além de saber delegar as funções para que outros possam se familiarizar com as atribuições da função e/ou de outras áreas da Casa.
O dirigente deve compreender que ensinar outras pessoas o seu ofício ou delegar função para outros departamentos é fundamental para a continuidade da casa e da causa.
Lamentavelmente, o que ocorre é o contrário. Há dirigentes que não “largam o osso”, para utilizar-me de uma expressão popular. Acreditam ser os “eleitos” e que sem eles a casa não prossegue firme no ideal. Sentem-se “donos” de um planejamento que não são deles, mas da espiritualidade maior.
Infelizmente, inconformados (algumas vezes), forjam o centro espírita ao seu próprio gosto, olvidando as diretrizes de Allan Kardec. Fazem enxertos nas casas e nos seus ensinamentos que são transmitidos aos seus frequentadores, que não têm qualquer relação com o Espiritismo.
Cumpre considerar, também, que o púlpito da Casa Espírita não deve ser utilizado para propaganda político-partidária. Infelizmente, nos últimos anos, dirigentes de diversos centros espíritas contaminaram-se e passaram a propagar suas ideias políticas da tribuna. Isso causou ruído, confusão e divisão no Movimento Espírita.
Lamentavelmente, oradores e médiuns renomados manifestaram-se politicamente em palestras públicas causando profundas decepções em muitos; provocando cizânia e incrementando o ódio em outros, em lastimáveis pugilatos intelectuais que nada agregaram ao Movimento Espírita.
*     Tecnologias, Redes Sociais, Streaming
Ser espírita exige escolhas. E nem sempre se está disposto a eleger aquilo que agregará valores espirituais.
As novas tecnologias, notadamente, as redes sociais e os serviços de streaming são muito chamativos e viciantes! Perdemos enorme tempo e energia com vídeos, memes, comentários e “curtidas” das redes sociais, numa espécie de enxurrada de dopamina fútil. Além da profusão de filmes e séries dos serviços de streaming que são instigantes e nos prendem mais ainda às telas.
Diante deste cenário de telas e plataformas variadas, é compreensível que muitos não queiram ir para um centro para assistir a uma palestra pública, sentado num banco duro e refletindo sobre a vida ou questões transcendentais.
De outro modo, não conseguimos adentrar este universo das redes sociais e streaming com uma linguagem acessível e abordagens espíritas instigantes, com raríssimas exceções.
Trata-se de um espaço fecundo para atingir as massas, especialmente, os jovens. Entretanto, muito da linguagem espírita está eivada de expressões “difíceis”; uma linguagem mais rebuscada, que não é condizente com o anseio do grande público e isso causa estranhamento e afastamento.
*     Fim da “onda” audiovisual espírita
Entre 2000 e 2010, telenovelas (Alma Gêmea, O Profeta, Escrito nas Estrelas) e filmes (Chico Xavier, Nosso Lar) colocaram o Espiritismo em destaque. Após essa década, não surgiram grandes produções para manter o interesse popular e nutrir o movimento.
Anteriormente, filmes espiritualistas como Ghost – Do outro lado da vida, O Sexto Sentido e Os Outros serviam de chamariz para as pessoas que se sentiam curiosas sobre as questões transcendentais da Vida e faziam-nas procurar o Espiritismo. Isso, certamente, diminuiu com o tempo.
*     Migração de autodeclaração para religiões de matriz africana
Sempre houve uma linha tênue entre o Espiritismo e as Religiões de Matriz Africana nessas pesquisas populacionais, tudo era colocado “num mesmo saco”.
O salto de 0,3% para 1% de Umbanda e Candomblé sugere que muitas pessoas que antes se identificavam como espíritas agora se sentem mais seguras para assumir crenças afro-brasileiras, reduzindo a fatia espiritualista no total da população.

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     Limitações metodológicas na coleta de religião
Como o IBGE faz uma única pergunta aberta (“Qual é a sua religião ou culto?”) e depois categoriza as respostas, quem é espiritualista, mas sem religião, tende a não se declarar espírita, inflando o sub-registro do movimento.
Ademais, muitos aspectos negativos de diversos segmentos religiosos provocaram uma espécie de desencanto nas pessoas, fazendo com que muitas se afastassem das denominações religiosas em que foram criadas.
*     Crescimento de segmentos não confessionais e evangélicos
O recorde de pessoas sem religião (9,3%) e a expansão dos evangélicos (26,9%) refletem um Brasil mais plural e competitivo em termos religiosos, diminuindo proporcionalmente o espaço do Espiritismo no censo.
Não é o intuito discutir, neste texto, o incremento das religiões protestantes. Afinal, cada pessoa escolhe a religião que lhe faz se sentir bem e tenha um sentido existencial.
A religião é uma espécie de Pedagogia que nos reconecta ao Criador. Entretanto, o incremento de pessoas sem religião chama a nossa atenção e nos faz refletir enquanto espíritas.
Como tem sido o acolhimento nas casas espíritas?
Quais tem sido os temas e as abordagens nas palestras públicas?
Como tem sido a qualidade dos cursos do ESDE?
Como tem sido as relações interpessoais no bojo da Casa Espírita?
São temas relevantes para que possamos pensar e agir, de maneira ativa, na divulgação do Espiritismo, visto que divulgar é servir de instrumento para que cada indivíduo avance na reforma íntima. A fim de que o Espiritismo cumpra seu ideal de regeneração moral da humanidade.

    

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita