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por Mário Frigéri

 

Uma linda revelação de Emmanuel


Há cenas na literatura espírita que não se apagam jamais da memória de quem as lê, porque tocam, ao mesmo tempo, as fibras mais íntimas da alma e os mais altos ideais do espírito. Assim é o episódio registrado no romance Paulo e Estêvão, de Emmanuel, em que o apóstolo dos gentios, depois de um reencontro amargo com o pai em Tarso, recolhe-se em lágrimas à solidão da natureza e adormece sob o silêncio das estrelas. Seu corpo descansa entre as pedras, mas sua alma se eleva a uma esfera mais alta  chamada por ele de “terceiro céu”, em suas epístolas. Ali, ele reencontra, num raro e comovente instante de comunhão espiritual, os dois afetos mais profundos de sua existência: Estêvão, o mártir da fé cristã, e Abigail, a noiva de quem o destino o separou, mas que o amor eterno voltou a reunir.

Nessa experiência que supera o tempo e a morte, Paulo não é julgado. É acolhido. Não é acusado. É compreendido. Abigail, agora em sua nova existência de alma iluminada, torna-se a voz que traduz para ele os códigos silenciosos do Evangelho. Suas respostas, de uma simplicidade que emociona, não se limitam a consolar o amigo em crise: elas o orientam, o guiam, o despertam. A cada pergunta ansiosa do apóstolo  como servir a Jesus, como vencer a frieza dos homens, como lidar com o desânimo ou com a própria sombra , ela responde com verbos curtos e luminosos. E ali, naquele breve colóquio que parece condensar séculos de aprendizado, Paulo se refaz em lágrimas e fé.

Inspirado por essa cena comovente, escrevemos o poema que ilustra este texto, procurando rememorar aqueles momentos de intensa luz. A narrativa poética procura interpretar esse encontro entre os dois planos de vida, traduzindo em linguagem lírica as respostas da amada ao coração contrito do apóstolo. Sua leitura nos convida à reflexão sobre os liames que continuam a entrelaçar as almas após a morte e sobre a pedagogia divina, que nunca abandona aqueles que, arrependidos e sinceros, se abrem à renovação interior.

 

PAULO, ESTÊVÃO E ABIGAIL


Margens do Tauro. Cilícia.

Arrebatado em visão,

São Paulo frui a delícia

Duma nova dimensão...

 

Nessa esfera cristalina

 Terceiro céu, intuiu ,

Sente a presença divina

De Estêvão e Abigail.

 

Fugazes fluem os momentos...

Por isso, presto, procura

Alinhavar pensamentos,

Questões que causam-lhe agrura.

 

E pergunta, imerso em luz:

– Como conquistar a chama

Da compreensão de Jesus?

E a noiva querida: – Ama!...

 

– E a virtude que ilumina?

Como proceder, sem falha,

Nessa aquisição divina?

Ela responde: – Trabalha!...

 

– Que providência adotar

Quando o desânimo impera

E a tudo quer destroçar?

E Abigail, doce: – Espera!...

 

– Quanto à indiferença humana?

Como harmonizá-la à boa

Luz do Evangelho, que irmana?

Sussurra a amada– Perdoa!...


Amor, Trabalho, Esperança

E Perdão... O Apóstolo ora...

Banha o coração-criança

Na paz do Senhor, e chora...

 

Quando extravasa a emoção

De seu sentimento a Deus,

A noiva do coração

Esboça um gesto de adeus...

 

Abigail, suavemente,

Aperta-lhe as mãos, agora,

E seu vulto evanescente

Desfaz-se em flocos de aurora...

 

Mário Frigéri é poeta, escritor, autor e youtuber com a mente e o coração voltados para o esplendor do Evangelho e da Doutrina Espírita. Campinas-SP.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita