Machado de Assis e o Espiritismo
Elaine Maldonado, no ano de 2008, escreveu uma
dissertação e a apresentou à Faculdade de Ciências e
Letras da UNESP de Assis, no interior de São Paulo. Uma
tese bem interessante e curiosa: “Machado de Assis e o
Espiritismo”. Um tema que teve o apelo forte da
criatividade e saiu do ponto comum dos textos que falam
sobre Espiritismo. Li sua dissertação, gostei muito e
indico o trabalho, que pode ser facilmente encontrado na
internet.
Imaginem vocês que em determinado momento de sua
existência o escritor brasileiro Machado de Assis
dedicou-se a falar, mesmo que mal, do Espiritismo,
vinculando-o em muitos de seus contos à loucura. E não
foi por pouco tempo não. Conta-nos a Elaine que por
aproximadamente 31 anos, de 1865, Kardec ainda
encarnado, até 1896, Machado de Assis publicou contos e
crônicas com críticas à Doutrina Espírita.
Percebam que o Espiritismo codificado por Kardec estava
nascendo na França, aterrissava no Brasil por meio de
Teles Menezes e passava a fazer parte de contos de
Machado em alguns jornais cariocas. Fato que mostra não
estar errado Kardec quando, em vários de seus escritos,
impressiona-se com o crescimento e a expansão do
Espiritismo.
Era, realmente, um assunto da moda e que encontrava,
claro, seus adeptos e detratores, como, aliás, todas as
ideias que surgem na sociedade.
Um ponto que Kardec costumava comentar é que a Verdade,
passe muito ou pouco tempo, estabelecer-se-á, porque
repousa junto a leis naturais. Se uma ideia for falsa
ela se trairá e não encontrará forças para triunfar.
Constatamos hoje que o Espiritismo penetrou forte na
sociedade e de tal modo que seus conceitos são estudados
em diversas universidades, mesmo que sob um outro rótulo
que não o do Espiritismo.
Encontramos os conceitos espíritas nas discussões entre
cérebro e mente, nas experiências de quase morte, nas
lembranças de vidas passadas, nas pesquisas sobre
reencarnação e tantos outros subtemas que Kardec
trabalhou em sua obra.
Portanto, por mais críticas que a ideia espírita tenha
recebido em seu início e de homens influentes como
Machado de Assis, fato é que venceu o tempo e os
preconceitos.
Das críticas de Machado de Assis ao Espiritismo, uma
delas era que seus praticantes poderiam descambar para a
loucura, crítica que Kardec constantemente recebeu
acerca dos “efeitos” colaterais da crença espírita, isso
dito por seus críticos, mas bem contra-argumentado por
Kardec. A propósito, loucura era o termo que se
utilizava no século XIX para designar as pessoas com
transtornos mentais.
Século XIX, tudo ainda estava no começo para o
Espiritismo em termos de doutrina, e os homens,
inclusive inteligentes como Machado de Assis, insistiam
em fazer suas considerações sem conhecer bem a obra de
Kardec.
Ninguém escapa de julgamentos precipitados. A ânsia e
vontade de falar sobre o que está na "crista da onda",
ou na ordem do dia, são maiores do que a paciência para
estudar um tema antes de emitir uma opinião.
Se há algo que podemos dizer que nos atrapalha, esse
algo leva o batismo da pressa.
Observador do comportamento dos homens e dos Espíritos,
Kardec percebeu muito bem esse desafio de vencer o
julgamento precipitado e trouxe, na escala espírita,
algumas lições que mostram o perfil de homens e
Espíritos portadores de julgamentos mais próximos da
realidade.
Na segunda ordem da referida escala espírita, terceira
classe, Espíritos de sabedoria e já bem adiantados são,
segundo Kardec, dotados de capacidade intelectual e
moral capaz de julgar com precisão os homens e as
coisas.
Você poderá dizer que Machado de Assis possuía
inteligência acima da média, era um intelectual. De
fato, sim, contudo, é preciso entender que para chegar
ao estágio de um Espírito de sabedoria, desses
mencionados por Kardec na escala espírita, não basta ser
um intelectual e dominar com maestria determinado campo
do conhecimento humano. Um Espírito para atingir esse
nível da escala espírita deve, além de ser dotado da
mais alta moral, dominar um amplo campo do conhecimento
material e espiritual, o que o fará ver o “mundo” do
alto, com uma visão mais ampla e, por isso, pode julgar
com mais assertividade o homem e as coisas.
Espíritos já adiantados estão livres da pressa. Sim, ela
mesma, a velha pressa, que nos faz correr para falar de
coisas que não tivemos o cuidado de bem estudar ou
avaliar com mais critério.
A pressa, de tão esperta, engana até homens como Machado
de Assis. O tempo está aí provando tudo...