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por Jorge Hessen

No País da fantasia que tal aplaudir o “Chico Xavier” psicografando nos sambódromos?


Sem querer ser “fiscal do Espiritismo” (como costumam dizer os espíritas “mornos bonzinhos”) e ditar regras de falsos purismos e extemporâneos sermões embebidos de ladainhas, refletiremos sobre o absurdo do carnaval.

No ano passado no desfile do grupo especial do Carnaval de São Paulo, no Sambódromo do Anhembi, a escola de samba Gaviões da Fiel apresentou um enredo com diversos componentes religiosos das mais diversas crenças, representando a pluralidade de fés, destacando as mais populares do Brasil.

Uma delas foi o Espiritismo, que contou com um carro alegórico homenageando o principal nome brasileiro da doutrina espírita: o médium mineiro Chico Xavier.

Ao redor da representação fiel do médium em postura de psicografia, com a popular peruca, óculos e uma caneta na mão direita, diversas decorações enalteciam (...!!) referências de suas obras e da própria “crença”.

Recordo que há 14 anos comentamos uma reportagem veiculada pelo jornal O Globo, assinada pelo repórter Rafael Galdo, noticiando que a escola de samba Unidos do Viradouro levaria para o sambódromo (Sapucaí) do Rio de Janeiro um carro alegórico contendo a imagem do Chico Xavier.

Tal barbaridade era para fugir do convencional, a fim da Escola voltar ao Grupo Especial, consoante afirmava o carnavalesco Jack Vasconcelos.

Pasmem uma das apostas da escola de samba era homenagear o “espiritismo” (com minúscula mesmo!).

No enredo “Quem sou eu sem você”, Jack fez, no último carro, uma homenagem ao médium de Pedro Leopoldo.

Chico foi representado por uma escultura (em que apareceu psicografando) cercada por 60 componentes, alguns deles “espíritas” (!?), que fariam uma performance de “mediunidade” (!?).

Todo espírita estudioso sabe que nenhum espírito[a] equilibrado, em face do bom senso que deve presidir a existência das criaturas, pode fazer a apologia da loucura generalizada, que adormece as consciências, nas festas carnavalescas.

Por essa razão, consterna-nos o fato de ver ligado a festas profanas o tema “Espiritismo”, assim como a personalidade impoluta de Chico Xavier.

A dita matéria afirmava que a diretoria da Federação Espírita Brasileira estaria de acordo com tal projeto, desde que nenhum “preceito do Espiritismo seja desrespeitado na apresentação da vermelho e branca”. (sic)

Esse comportamento light d’alguma liderança espírita, estilo “lava as mãos” é desconcertante.

Divulgar a Doutrina Espírita é um ato de caridade para com ela, entretanto, divulgá-la através desse meio não se “preserva os seus valores éticos e doutrinários” e é, sem dúvida, deturpá-la em suas bases, causando incalculáveis prejuízos morais, com grande responsabilidade vinculada.

Não havia como compreender a "neutralidade" da diretoria da FEB, até porque havia incompatibilidade total e absoluta entre os objetivos do folguedo momesco e os postulados da Doutrina dos Espíritos.

Ora, a origem do carnaval remonta as teias primitivas de um passado remoto que devemos, por impulso evolutivo, abandonar urgentemente.

Acompanhar a espetacularização da imagem de Chico Xavier, de André Luiz e de tantos outros veneráveis irmãos queridos nossos, que tanto contribuíram e contribuem com seus ensinamentos sublimes, aliadas a uma festa que é a própria apologia às piores viciações do ser humano, é o que podemos chamar de cúmulo do paradoxo entre a teoria e a prática Espírita.

Por “trilhões” de razões, recomenda o Espírito André Luiz para "afastar-nos de festas lamentáveis, como aquelas que assinalam a passagem do carnaval, inclusive as que se destaquem pelos desregramentos ou manifestações exteriores espetaculares, pois a verdadeira alegria não foge da temperança.

Até porque diversos estudos demonstram que durante os delírios e farras dos carnavalescos, para cada 100 casais que caem juntos na folia, setenta terminam a noite brigados (cenas de ciúme etc.); que, desses mesmos 100 casais, posteriormente, sessenta sucumbem ao adultério, cabendo uma média de trinta para os homens e trinta para as mulheres ; que, de cada 100 pessoas (homens e mulheres indistintamente) no carnaval, pelo menos setenta se submetem espontaneamente a coisas que normalmente abominam no seu dia a dia, como álcool, entorpecentes etc.

 Dizem ainda que tudo isso decorre do êxtase atingido na “grande festa”, quando o símbolo da “liberdade” e da “igualdade”, mas também da orgia e depravação, somadas ao abuso do álcool, levam as pessoas a se comportarem fora do seu normal.

Os Benfeitores afirmam que ao lado dos mascarados da pseudoalegria passam os leprosos, os cegos, as crianças abandonadas, as mães aflitas e sofredoras. (...) Enquanto há miseráveis que estendem as mãos súplices, cheios de necessidades e de fome, sobram as fartas contribuições para que os salões se enfeitem.

Na ribalta dos carros alegóricos, os obsessores influenciam os incautos que se deixam arrastar pelas paixões de Momo, impelindo-os a excessos lamentáveis, comuns por essa época do ano, e através dos quais eles próprios, os Espíritos, se locupletam de todos os gozas e desmandos materiais, valendo-se, para tanto, das vibrações viciadas e contaminadas de impurezas dos mesmos adeptos de Momo, aos quais se agarram.

É lamentável que na época atual, quando os conhecimentos novos felicitam a mentalidade humana, fornecendo-lhe a chave maravilhosa dos seus elevados destinos, descerrando-lhe as belezas e os objetivos sagrados da Vida, se verifiquem excessos dessa natureza [CARNAVAL] entre as sociedades que se pavoneiam com os títulos da civilização.  Os foliões inveterados alegam que o carnaval é um extravasador de tensões, liberando as energias (?!)

Ora!... transbordador de tensões é a capacidade de se arregaçar as mangas e colaborar em regime permanente (sem oba-oba) na recuperação das vítimas do desemprego, da fome e das Cracolândias.

É verdade! No período carnavalesco, não encontramos diminuídas as taxas de agressividade e as neuroses. O que se vê é um verdadeiro somatório da violência urbana e de infelicidade familiar. As estatísticas registram como consequências do "reinado de Momo", por exemplo, gravidezes indesejadas e a consequente proliferação de abortos provocados, acidentes automobilísticos, aumento da criminalidade, estupros, suicídios, incremento do uso de diversas substâncias estupefacientes e de alcoólicos, assim como o surgimento de novos viciados, disseminação das doenças sexualmente transmissíveis (inclusive a AIDS) e as ulcerações morais, marcando profundamente certas almas desavisadas e imprevidentes.

Os três dias de folia, assim, poderão se transformar em três séculos de penosas reparações. É bom pensarmos um pouco nisto: o que o carnaval traz ao nosso Espírito? Alegria? Divertimento? Cultura? Será que o apelo de Momo faz de nós homens ou mulheres melhores? Edifica o nosso Espírito? Muitos espíritas, ingenuamente, julgam que a participação nas festas de Carnaval, tão do agrado dos brasileiros, nenhum mal acarreta à nossa integridade fisiopsicoespiritual. No entanto, por detrás da aparente alegria e transitória felicidade, revela-se o verdadeiro atraso espiritual em que ainda vivemos pela explosão de animalidade que ainda impera em nosso ser. É importante lembrá-los de que há muitas outras formas de diversão, recreação ou entretenimento disponíveis ao homem contemporâneo, alguns verdadeiros meios de alegria salutar e aprimoramento (individual e coletivo) para nossa escolha.

Não vemos, por fim, outro caminho que não seja o da abstinência sincera dos folguedos, do controle das sensações e dos instintos, da canalização das energias, empregando o tempo de feriado do carnaval para a descoberta de si mesmo, o entrosamento com os familiares, o aprendizado através de livros e filmes instrutivos ou pela frequência a reuniões espíritas, eventos educacionais, culturais ou mesmo o descanso, já que o ritmo frenético do dia-a-dia exige, cada vez mais, preparo e estrutura físico-psicológicos para os embates pela sobrevivência.

Em síntese, se o carnaval é uma ameaça ao bem-estar social, nós espíritas temos muito a ver com ele, porque uma das tarefas primordiais de nossa Doutrina é a de lutar por dispositivos de preservação dos valores mais dignos da sociedade, sem que se violente, obviamente, o direito soberano do livre-arbítrio de cada um, mas não nos esquecendo que no carnaval sempre ocorre obsessão (espiritual) como resultado da invigilância e dos desvios morais. Somente poderemos garantir a vitória do Espírito sobre a matéria se fortalecermos a nossa fé, renovando-nos mentalmente, praticando o bem nos moldes dos códigos evangélicos, propostos por Jesus Cristo e não esquecendo os divinos conselhos do Mestre: "Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito na verdade está pronto, mas a carne é fraca''.

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita