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por Marcus Vinicius de Azevedo Braga

 

Que fé raciocinada é essa?


Conversavam, em um diálogo fictício que poderia ser real, dois espíritas na porta de entrada do centro, sobre um dos seus filhos ter sido aprovado para uma universidade. Enquanto um se alegrava e exaltava os dons intelectuais de seu filho, o outro lhe chamava a atenção de que a universidade era um antro de ateus e que, possivelmente, indo lá ter contato com aquelas teorias, logo se afastaria da doutrina espírita, seduzido por pensamentos agnósticos.

Essa historieta de receio de pisar na universidade e ali perder a sua fé ilustra o pensamento de muitos dos adeptos das ideias espíritas, o que é no mínimo espantoso, pela proposta da própria doutrina espírita de ser algo moderno e sintonizado com a realidade e suas inovações. Mas que raio de fé raciocinada é essa na qual temos medo de ir à faculdade e virar ateus?

O Espiritismo nos prepara para enfrentar o mundo e não para viver em uma redoma. Nos dá elementos para conviver em todos os ambientes profissionais, conjugando a diversidade de ideias e visões com o respeito fraterno e o diálogo argumentativo. Não busca o Espiritismo criar comunidades isoladas nas quais todos pensem igual e comunguem dos mesmos ideais, como os Amish estadunidenses. Não, esse isolamento não tem lastro na doutrina dos Espíritos.

Esse medo de transitar no mundo e ser capturado pelos ideais materialistas é, inclusive, uma visão equivocada das pessoas que optaram por não crer em Deus ou seguir uma religião. Esse grupo, que segundo dados de 2012 constituem 16% da humanidade, são pessoas que merecem nosso respeito, e por vezes se encontram desiludidos com essas religiões que não dialogam com a realidade, e buscam sua forma, às vezes informal, de lidar com a sua espiritualidade.

A falta de um estudo denso e dialógico da doutrina espírita pode nos conduzir a esse medo do conhecimento que poderia abalar a nossa fé. Afinal, o próprio Kardec afirma que: “Fé inabalável só o é a que pode encarar frente a frente a razão, em todas as épocas da Humanidade”, indicando que talvez o problema não esteja na universidade, ou no mundo, ou nos livros, e sim na construção da nossa fé espírita, de uma forma cega, mas fantasiada de raciocinada.

Acabamos construindo uma relação dogmática com o conhecimento espírita, que pode nos levar a extremos fanatizados de só assistir a programas de TV espíritas, ler livros dessa natureza e ouvir música espírita. Já vimos esse filme. O Espiritismo é uma doutrina libertadora de consciências, pautada no estudo sério, não como se suas obras fossem escrituras sagradas ou a palavra de Deus, mas como um conjunto de conhecimentos que nos ajudam no processo de evolução.

Não devemos temer a universidade, o materialismo, a ciência. Essa é uma aliada do Espiritismo e uma fonte de um pensamento também libertador. Devemos temer a ignorância, a falta de debate, o argumento de autoridade e tudo mais que se opõe ao que dá ao Espiritismo a sua maior força, pelo poder de dialogar com a realidade através dos tempos.



 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita