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por Marcus Vinicius de Azevedo Braga

 

Coluna social espírita


Antecede o fenômeno das redes sociais o gosto dos espíritas pela identificação de personalidades do passado que estejam reencarnados no tempo presente. Uma verdadeira gincana que agita não só os programas populares do fim de semana, mas também os veículos de comunicação social do movimento, nos quais, por meio de revelações mediúnicas ou de meras suposições, se asseveram a coincidência de identidades, como assunto de grande relevância, para quebrar a rotina.

Incrivelmente, esse assunto consome horas e horas de discussão no movimento espírita, como verdadeiros “Sherlock Holmes” da espiritualidade, saem estes elaborando rebuscadas teorias de que fulano teria sido sicrano, muitas vezes construindo um certo elitismo, no qual celebridade mantém a sua condição na fieira das reencarnações, situação sem nenhum amparo doutrinário.

Por outro lado, os estudiosos de regressão de memória ou de lembranças espontâneas são meticulosos em detalhes e provas que relacionam o encarnado de hoje com uma pessoa já desencarnada do passado, buscando ser bem cuidadosos nessas afirmativas, fiéis ao seu caráter de pesquisadores.

 Documentários na televisão e obras como as de Ian Stevenson, Hellen Wambach, Jim Tucker e o livro “A volta: A incrível história da reencarnação de James Huston Jr”, de Andrea Leininger e Ken Gross, são exemplos de produções fora do movimento espírita e que tratam das relações de identidades atuais com passadas de forma bem prudente, pautadas por um conjunto de indícios robustos que permitem fazer certas ilações nesse sentido.

Mas, nós espíritas, insistimos em, por conta de uma comunicação mediúnica, adotar determinadas teses sobre a identidade de personalidades do passado reencarnadas, em um processo potencializado pelas redes sociais que inaugura genealogias reencarnatórias por conta de características supostas do antepassado em relação ao encarnado atual, de forma descontextualizada, e, às vezes, com vieses na busca de se reforçar essas assertivas, no qual só enxergamos o que corrobora a nossa crença.

Essa prática, além de animar a coluna social espírita com polêmicas e discussões inúteis, outra coisa potencializada pelas redes sociais, serve a interpretações que alimentam jogos políticos e ainda, ajudam a explicar, de forma superficial, comportamentos atuais que chocam ou são objeto de exaltação.

Essa situação é similar às questões afetas à identidade dos Espíritos nas comunicações mediúnicas, com a diferença que não se prende a uma mensagem específica, mas a toda a personalidade de uma pessoa encarnada e à busca de relacionar esta a alguém do passado, para justificar alguma tese. É uma forma de atender a nossa curiosidade, à feição da nossa ansiedade pelo desenrolar de filmes e as reviravoltas da sua conclusão.

Na questão da identidade dos Espíritos nas mensagens psicografadas, Kardec nos traz uma preocupação com o teor da mensagem, com a caligrafia, com a linguagem, com relatos de pessoas que o conheceram em vida, conforme descrito na introdução de O Livro dos Espíritos, sempre com ceticismo, e percebendo, segundo o próprio codificador, que isso não é uma questão tão relevante.

Na reencarnação, tem-se que a situação é mais complexa, pois, no processo de nascer de novo, há uma reconstrução da personalidade em um novo contexto, e essas relações de identificação são mais complexas, sendo mais exitosas no caso de lembranças espontâneas ou regressões, como já citado, e que relacionam dados e documentos a essas lembranças. E ainda assim, como já afirmado, os pesquisadores são bem cautelosos nessas afirmativas.

Dessa breve discussão fica a seguinte reflexão: diante de mais uma informação de rede social sobre o fulano de hoje ser o sicrano do passado, nos importa saber, primeiro, da relevância dessa informação para o que nos interessa, nos minutos sagrados da reencarnação. Segundo, vale avaliar não só a credibilidade da fonte, mas que ideia se busca reforçar com esse argumento reencarnatório. Pode ser para aumentar a credibilidade de alguém por conta de sua suposta identidade de outra vida, como é geralmente utilizado esse artifício. E isso é preocupante.

Espírita, imbuído de uma fé raciocinada, que estuda e reflete sobre o que lê, já tem elementos suficientes para trafegar nesse mar de informações das redes sociais, fugindo desse canto de Sereia de ficar procurando personalidades reencarnadas, uma diversão não muito diferente das mesas girantes de outrora, mas que por detrás trazem discussões muito mais relevantes, que não podem sumir na superficialidade dessas coisas.



 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita