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por Bruno Abreu

A mão esquerda


Mas, quando tu deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita.” - Mateus 6:3


Este conselho de Jesus Cristo vem após a crítica sobre as pessoas que dão esmola em frente aos outros para que possam ser elogiadas.

O próprio elogio em si é a recompensa de quem o fez. Uma recompensa justa, pois foi a intenção que estes tiveram e colhem o que semearam.

Para além de não devermos mostrar o que fazemos, o Mestre aconselha-nos a que a nossa mão esquerda não chegue a saber o que a direita faz. Como é possível isto acontecer?

Quem sabe o que fazemos, ou não, é a parte inteligente, a mente. Então, tem que ser travado aí, a mão é uma alegoria ao nosso funcionamento mental.

Jesus utilizou estas figuras do corpo, em relação à forma de estarmos na vida, por várias passagens. Podemos ver, em Mateus 5:29, a passagem:

Portanto, se o teu olho direito te escandalizar, arranca-o e atira-o para longe de ti, pois te é melhor que se perca um dos teus membros do que todo o teu corpo seja lançado no inferno”.

Não é culpa do olho, mas do funcionamento mental que podemos ter em relação ao que vimos, tal como as mãos, na passagem que estamos a ponderar no texto.

Como poderá a mão esquerda não saber o que a direita faz?

A mão esquerda representa a forma como recebemos o ato.

Quando fazemos um ato de caridade é porque alguém precisa e nós estamos em condições de o fazer. Seja um simples bocado de pão, seja a ajuda a um amigo ou familiar, com uma conversa.

Para existir esta oportunidade de fazer o bem, tem que existir quem precise. Nós, normalmente, colocamo-nos como os “principais da fita”, mas sem a pessoa necessitada não existiria a carência de o fazer, ele é o principal ator neste ato.

Trazer a importância para nós, de que “eu estive bem”, é querer ser o protagonista da peça que não nos pertence.

A fome ou a necessidade de ajuda daquela pessoa não está em nossas mãos. Pensar que aquele irmão foi ajudado, graças a mim, é colocar parte do movimento da vida daquele ser dependente de mim. Não vos parece isto errado?

Deus tudo organiza e Ele deu-nos aquela oportunidade, se não aceitarmos, virá alguém e o fará.

Podemos constatar, através da lógica de que nenhum destino de ninguém está em nossas mãos, mas todos nas “mãos” de Deus.

A mão esquerda não saber é o mesmo que dizer: a mente, ou nós não sabermos.

Como é isto possível?

Quando fazemos o ato, acontece a ação. O ato é sempre presente e, enquanto este decorre, não acontece o orgulho, apenas a compaixão.

Foi levantada a compaixão em mim, o que me levou a agir em favor aquela pessoa.

Aqui, ainda não existe a mão esquerda, esta mão aparece depois.

Após a caridade, temos uma enorme tendência de transportar aquele ato conosco, em nossa mente. Alimentamos o nosso Ego com aquela ação, aumentando o nosso orgulho, pois só olhamos pra nós. “Estive muito bem”, “pude ajudar aquela pessoa” etc.

De que isto nos serve?

Não parece que entrou a mão esquerda em ação? Agora ela sabe e saboreia este ato.

Se nós olhamos para o outro que ajudamos ou alimentamos, podemos perceber que ele continuará a precisar de ajuda ou alimentação. Com esta visão, que orgulho ou satisfação posso sentir?

O problema é que passamos a olhar para nós e não para o todo, onde inclui o outro, e concluo que estive muito bem naquela ação que passou a ser memória.

O ruminar pensativo, fora da ação, como neste caso da caridade, é um veneno que constrói o âmago que se entrepõe entre o Filho de Deus e o Filho do Homem.

Vigiai para que não entreis em tentação.

Mas, quando tu deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita.” - Mateus 6:3.

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita