Brasil
por Giovana Campos

Ano 14 - N° 683 - 16 de Agosto de 2020

A empatia como agente transformador das relações humanas 

 

Rodolfo Furlan Damiano,
da AME-São Paulo, nos fala sobre o tema empatia e
espiritualidade

Uma das palavras mais usadas na atualidade é empatia. Toda vez que escutamos uma história, vemos ou lemos sobre algum acontecimento em que alguém desconsiderou ou desrespeitou os sentimentos de alguém, sempre se levanta a questão da falta de empatia. Mas o que é ser uma pessoa empática? A capacidade de compreender os sentimentos e de colocar no lugar do outro, sentindo suas dores, alegrias, preocupações, ou quaisquer outros sentimentos e respeitar este momento, sem julgamentos, nos faz uma pessoa empática. Como diz o Evangelho, “Tratai todos os homens como quereríeis que eles vos tratassem” (Lucas, 6:31), temos aí uma mostra de quanto a caridade e a empatia caminham lado a lado.

É possível colocar o conceito de empatia na formação profissional para que auxilie a equipe de saúde ter um olhar mais humanizado no tratamento? Conversamos com o médico Rodolfo Furlan Damiano, da AME-São Paulo, sobre a relação entre a empatia e a espiritualidade nos cuidados de saúde e como inserir este conceito no cotidiano do atendimento ao próximo.

A seguir, a entrevista que ele nos concedeu:

Como definir a empatia?

Assim como diversos outros conceitos abstratos, não há uma única definição de empatia e muito menos um consenso entre todas as partes. Entretanto, seja em nível teórico-acadêmico seja em nível do conhecimento geral ou senso comum, é fato que quando falamos sobre empatia nos vêm em mente dois conceitos básicos. O primeiro se refere a uma capacidade quase que inata, intrínseca, afetiva-emocional de sentir a dor do outro, sofrer junto com o outro; ou o oposto, sorrir junto com o outro e se alegrar com o mesmo. Esse primeiro conceito vem sendo chamado por alguns de simpatia, para diferenciá-lo de empatia, que seria mais esse segundo conceito que irei apresentar. Este segundo é um pouco mais racional, referindo-se a capacidade humana de se colocar no lugar do outro, conhecer seus medos, anseios, valores, e desta forma ajudá-lo a enfrentar suas dificuldades. Estudos mais modernos de neuroimagem têm encontrado resultados semelhantes, com áreas cerebrais distintas sendo ativadas para as diferentes respostas: afetiva-emocional ou cognitiva-racional. Certo é que ambas são importantes, mas merecem atenção e cuidado para se avaliar suas consequências diretas e indiretas, assim como a possibilidade de inserir no contexto acadêmico.

É possível inserir este conceito no ensino universitário ao profissional de saúde em formação?

Não só é possível como essencial. Devemos ter consciência de que esta já é uma área bastante abordada na graduação e acredito ser por meio de dois pontos principais, um teórico e outro prático. Do ponto de vista teórico, estudando o conceito de empatia e entendendo a diferença ele e outros conceitos (simpatia, compaixão, antipatia), estudando o impacto que tem na vida dos pacientes, compreendendo o impacto que tem em nossas próprias relações interpessoais (multiprofissionais, com os pares), assistindo entrevistas de profissionais mais experientes e sensíveis que se utilizam da empatia, entre outros. De um ponto de vista prático, estimulando o estudante a realizar entrevistas não clínicas, compreendendo quem é o doente que sofre (da onde veio? quais suas dificuldades? quais seus medos? quais seus objetivos? qual seu sentido na vida?), estimulando-o a ver além da doença. Mas existem dois pontos que eu considero principais e são pouco debatidos, o primeiro é a existência de espaços livres na formação, onde o estudante tenha tempo para cuidar de si e de sua saúde mental. Outro é o estímulo à prática das artes (música, teatro, cinema, literatura) as quais são um estímulo importante para a sensibilidade do ser humano.

Há como medir o grau de empatia?

Sem dúvida. Por meio de escalas auto preenchíveis, onde o profissional de saúde responde a diversas questões referentes ao seu grau de empatia (escalas como Jefferson Scale of Empathy, Interpersonal Reactivity Index), além de questionários onde o próprio paciente relata o grau de empatia de seu médico ou profissional de saúde. Entretanto, sendo um constructo abstrato, sua aferição não é fácil e está sujeita a alguns vieses, como por exemplo, que o próprio indivíduo que responda tenda a achar que é mais empático do que realmente é. Por isso, mais estudos são bem-vindos nessa área.

Sendo o médico empático, isto traz alguma influência no tratamento/ resposta do paciente?

Muitas. Tanto na percepção subjetiva do paciente quanto ao seu tratamento, o que sem dúvida leva a uma melhor resposta, uma resposta mais rápida, e uma melhor aderência medicamentosa; mas também no fato de que uma maior empatia lhe permite captar melhor e mais purificadamente as queixas do seu paciente, tornando-o não apenas mais sensível mas um médico melhor tecnicamente.

Existe relação entre empatia e espiritualidade?

Sim. Uma relação próxima e de mão dupla. A espiritualidade, em um sentido mais amplo, pode ser definida como a busca individual de transcendência, sentido e propósito. Inúmeros estudos têm mostrado a relação inversa entre sintomas depressivos, ansiosos, ideação e comportamento suicida, ou mesmo físicos, como mortalidade, tempo de internação, marcadores inflamatórios, etc. e espiritualidade-religiosidade. Indivíduos com maiores graus de empatia tendem a serem mais receptivos tanto a compreender, expressar, como também a utilizar as crenças de seus pacientes para o benefício de sua saúde. Esse ajuste fino entre a sensibilidade da espiritualidade com a razão da empatia é uma arma poderosa na transformação das relações, tanto clínicas quanto pessoais, e não só podem como devem ser estimuladas entre todos nós.

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita