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por Maria de Lurdes Duarte

 

O Reinado do Amor


Estamos a atravessar tempos difíceis. Isso não constitui segredo para ninguém. Tempos atormentados, dolorosos, em que, inegavelmente, a Humanidade está sendo posta à prova na sua capacidade de superação, resiliência, cooperação, esperança… Não só a Humanidade como um todo, mas cada um de nós, individualmente, está perante a oportunidade de provar a si mesmo e à sua consciência o que vale realmente como Ser Espiritual que é, carregado dos mais diversos valores adquiridos ao longo da já longa jornada evolutiva.

Por todo o lado, vemos o reconhecimento, mais ou menos generalizado, de que agora, como nunca, a Terra está a passar por um momento crucial, em que será dado mais um passo determinante para o cumprimento do seu destino. Mesmo entre pessoas com poucos conhecimentos no que respeita a espiritualidade, ou de crenças mais tradicionais onde o progresso planetário não é objeto de estudo, parecem ter, com a atual situação pandêmica, começado a tomar consciência de que “algo de superior” tem de estar a presidir aos acontecimentos, proporcionando-nos oportunidades valiosas de reflexão e mudança, assim como possibilitando ao próprio planeta e à sua Natureza aproveitarem o ensejo para se regenerarem de alguns dos estragos que temos vindo a infligir-lhes com a nossa irresponsabilidade e interesses economicistas desenfreados.

Nós, espíritas, sabedores do fato de que já por cá temos andado vezes e vezes sem conta, acompanhando e vivenciando numerosas épocas históricas com as respectivas oportunidades de aprendizagem, dizemos mais: agora, mais uma vez, uma nova oportunidade nos está sendo facultada pelo Amor do Pai, que não se cansa de nos incentivar e conduzir na senda do progresso. Mais uma oportunidade, que não será, certamente a última, como não é, isso sabemos, a primeira. O que aprendemos com as oportunidades que nos foram dadas anteriormente? Dizem alguns que nada temos aprendido. Continuamos a incidir nos mesmos erros. E que, passado este tempo de desespero e dor, tudo continuará na mesma. Temos uma propensão para o erro, e egoisticamente, passado o susto, continuaremos a agir da mesma forma e depressa esqueceremos as reflexões que agora fazemos.

Nada de mais errado. Não podemos cair na tentação do negativismo, que não nos deixará avançar e encarar com coragem as mudanças de atitude que se fazem tão necessárias. Se nos convencermos de que somos incapazes de mudar, nada faremos para contrariar essa ideia. Cairemos na posição de estacionamento (já que o retrocesso é contra a Lei de Progresso a que não podemos fugir). Deus não nos dá prova superior às nossas forças. Não nos daria oportunidades que saberia, de antemão, que seríamos incapazes de encarar. Se aqui estamos, precisamente nesta época, a viver os acontecimentos atuais, e não na posição de desencarnados, é porque Deus, e os Espíritos que nos assistem e orientam, nisso viram utilidade para a nossa caminhada evolutiva. E eles esperam e contam ver-nos sair vitoriosos.

Tentemos refletir na questão colocada acima: se muitas outras oportunidades já nos foram dadas, o que teremos aprendido com elas? Tudo. Foram elas que fizeram de nós o que hoje somos. A inteligência, o conhecimento, a sensibilidade com que olhamos e analisamos a situação atual, a piedade, a nossa visão pessoal das coisas e das situações, o modo como vemos e aceitamos os outros, como sentimos a sua dor e o sofrimento, a capacidade de refletir nos próprios atos, o desejo de crescer a nível pessoal e de com isso contribuir para um mundo melhor… tudo isso é o resultado do somatório das aprendizagens realizadas no caminho percorrido ao longo dos milênios. Mas também o orgulho que ainda nos tolhe, a preguiça de avançar mais rapidamente, de sair da nossa zona de conforto e de trabalhar pelo bem comum, a tendência ao desânimo e ao desespero perante as dificuldades, o comodismo, o egoísmo… também eles são o resultado das oportunidades desperdiçadas e das aprendizagens que poderíamos ter feito e não fizemos.

Apesar disso, em resultado da tal sensibilidade cultivada e apurada desde vidas anteriores, hoje, talvez como nunca em épocas anteriores, sentimos cada vez mais a dor do outro como nossa. E olhamos o mundo como a casa comum, que é necessário amar e preservar como um verdadeiro lar onde todos têm direito ao seu quinhão de felicidade e bem-estar. Isso leva-nos a importantes reflexões. A atual pandemia veio pôr a descoberto o quanto temos andado a “brincar” com os recursos que Deus nos concede, como bens comuns. Em vez de, colocando a inteligência e os conhecimentos adquiridos ao serviço do progresso geral, tornarmos este planeta um verdadeiro lar em que todos possam encontrar um lugar de trabalho e aperfeiçoamento, alçando o planeta a condições mais elevadas na escala dos mundos, em nome dos interesses mesquinhos de uns, agravamos a situação de pobreza e miséria de outros. Em vez de os povos se unirem e amarem, como membros de uma família universal, dividimo-nos e guerreamo-nos, deixando certas zonas planetárias completamente entregues ao sofrimento que poderia ser combatido e minorado com a boa vontade dos países mais favorecidos materialmente.

Por interesses políticos, econômicos, consumistas, racistas, até religiosos, acentuamos as diferenças sociais entre os povos, realidade que esta pandemia veio pôr a descoberto, mostrando que alguns países não têm a mínima condição para o combate ao vírus que a todos atormenta. Mas o que é de notar, até os países que se julgam ricos e cientificamente e tecnologicamente avançados estão em dificuldades, perante uma situação que é de todos, e para a qual não estavam (pasme-se!) minimamente preparados. Talvez agora nos apercebamos todos da importância da mudança de paradigma e da adoção de outras atitudes, abandonando as ideias velhas e nos preparando para um futuro mais digno e harmonioso.

Jesus ofereceu-nos a solução. Desde há mais de dois mil anos nos tem alertado para a necessidade de construir o Reino de Deus, o Reino do Amor. Construí-lo dentro de nós e no mundo que habitamos. Mas, tristemente, o mundo ocidental, de tradição maioritariamente judaico-cristã, na ilusão orgulhosa de detentor da verdade, é o que tem perpetuado os maiores erros, é o que mais tem falhado. Que temos feito das lições e das advertências de Jesus?

“Amarás o teu próximo como a ti mesmo”, insistia o Mestre, fazendo da Lei do Amor a principal condição para a construção do Reino de Deus. Mas, compreendendo a dificuldade que teríamos no cumprimento dessa tão “simples” condição, também avisou: “O meu reino não é deste mundo”, ou seja, não seria neste mundo, pelo menos tão cedo, que essa lei se cumpriria. Mas terá de ser assim para sempre?

Em O Livro dos Espíritos, Capítulo XI, Amar o próximo como a si mesmo, o Espírito Lázaro explica-nos: “O amor resume toda a doutrina de Jesus, porque é o sentimento por excelência, e os sentimentos são os instintos elevados à altura do progresso realizado”. No mesmo capítulo, garante-nos o Espírito Fénelon: “O amor é de essência divina. Desde o mais elevado até o mais humilde, todos vós possuís, no fundo do coração, a centelha desse fogo sagrado”. As advertências dos Espíritos que se manifestam na Codificação Espírita mostram-nos que o cultivo do sentimento do amor é algo que está ao alcance de todos e é imprescindível o apuramento desse sentimento, tal como Jesus nos ensinou.

Estaremos nós, atualmente, mais aptos à vivência do amor? Estamos convictos que sim. Reparemos que é nos momentos em que a dor aperta, nos momentos de calamidade maior, em que a segurança geral se vê abalada, que a nossa sensibilidade mais desperta, e, com ela, os sentimentos de solidariedade, compaixão, partilha… Vemos isso despertar por todo o lado, de uma forma bastante evidente. Atitudes negativas que antes tolerávamos como rotineiras, em relação a humanos e até mesmo animais, hoje parecem-nos inconcebíveis e repugnantes. Por quê? Porque evoluímos. Já não somos os mesmos. Ou antes, somos os mesmos, mas diferentes, porque aprendemos e apuramos o sentimento. Temos estado a crescer intelectualmente e moralmente. A passinhos curtos, talvez demasiado curtos, mas estamos em crescimento constante. E por isso, de vez em quando, a Espiritualidade Superior dá-nos um “empurrãozinho” piedoso, para que acordemos e avancemos com passos mais seguros. Por quê? Por Amor. Sempre por Amor.

O Amor é o motor que faz avançar o Universo. Foi por Amor que Deus nos criou. Foi por Amor que Jesus desceu dos Páramos Superiores até ao nosso mundo atrasado, para nos fazer subir com Ele. É por Amor que temos numerosos Amigos Superiores a trabalhar incansavelmente para que agarremos todas as oportunidades de crescimento e possamos fazer a nossa amada Terra avançar na escala dos mundos.

É por Amor, com o Amor e pela prática do Amor que haveremos de construir aqui mesmo na Terra o Reino de Deus, solicitado no Pai Nosso, quando pedimos ao Pai “venha a nós o Vosso Reino, assim na Terra como nos Céus”. Faça-se aqui na Terra o que já se está fazendo nos Céus: o Reino do Amor, da Harmonia, da Paz, da Solidariedade entre os homens e entre os povos. Será esse o reino de Deus, em qualquer lugar e em qualquer tempo que nos encontremos. Se não estivesse ao nosso alcance, Jesus não no-lo teria anunciado. E não nos teria ensinado como alcançá-lo.

É hoje e aqui o tempo certo. É esta a hora de enfrentarmos o desafio com Coragem e Fé. Não desperdicemos mais uma oportunidade que Deus nos concede… mais uma vez. Inauguremos, de uma vez por todas, o Reinado do Amor.         



 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita