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por Maria de Lurdes Duarte

O imenso poder da prece


Desde os tempos mais remotos, esquecidos no pó dos milênios que por nós foram passando, desde as eras em que o Homem ensaiava os primeiros passos terrestres, tomando consciência de si mesmo como Ser individual e distinto dos demais seres da Criação, que esse mesmo Homem se assumiu como Ser Espiritual em busca de um sentido maior para a sua existência. Observando os fenômenos da Natureza, que ultrapassavam a sua capacidade de compreensão, procurando assimilar o mundo que não entendia, cedo a Humanidade buscou fora de si mesma algo maior, responsável por tudo quanto existia e acontecia.

A crença em divindades, que muitas vezes se confundiam com a própria Natureza, ou os próprios fenômenos, teve suas origens nessa “certeza”, a princípio inconsciente, mas, de qualquer modo, inata, de que “há algo para além e acima de nós”. Nem de outro modo poderia ser. Sendo nós centelhas saídas das mãos do Criador, muito naturalmente trazemos em nós imprimida essa ideia inata de Deus e da nossa essência espiritual.

À medida que as eras foram passando e a inteligência humana se foi desenvolvendo, em contacto com as inúmeras experiências que a Terra nos foi proporcionando, também a ideia que fomos fazendo dessa Entidade Suprema se foi paulatinamente modificando. Dos seres e fenômenos da natureza (floresta, sol, vento,…), confundindo a obra com o seu Criador, passando aos inúmeros deuses do politeísmo, até chegar ao monoteísmo, passando do Deus à imagem e semelhança do Homem à ideia de Deus como Causa Primária de todas as coisas (como nos é apresentado pelo Espiritismo), a nossa compreensão da Divindade foi passando por diversos estágios, à medida das nossas possibilidades de busca e entendimento.

Mas o certo é que a nossa relação com Deus esteve sempre bem notória ao longo da História Humana, ainda que nem sempre tenha sido acionada da forma mais correta e satisfatória. Nessa busca de uma relação com o Divino, o Homem sempre sentiu necessidade de se colocar “nas suas mãos”, buscando Nele a proteção e o amparo para os seus anseios mais prementes, a princípio puramente materiais, mais tarde de cariz também espiritual.

É nesse contexto que a Prece surge como forma de nos relacionarmos com Deus, Entidade Superior de cuja bênção e proteção sempre sentimos precisar. No entanto, será a Prece realmente eficaz, ou apenas decorre de uma necessidade puramente humana e apenas tem sentido como forma de “alívio psicológico”, decorrente de uma crença instalada em nós? Diríamos que, nem que outra eficácia não tivesse para além dessa, já seria válida e oportuna.

Atentemos no que nos disse Jesus: “Por isso vos digo: todas as coisas que vós pedirdes orando, crede que as haveis de ter, e que assim vos sucederão” (Marcos, XI: 24). Foi uma garantia deixada pelo Mestre. A certeza de que as nossas Preces são ouvidas e atendidas.

Mas então podemos perguntar-nos: por que tantas e tantas vezes nos dirigimos a Deus em busca de socorro e nada acontece do que pedimos? Por que não são as nossas necessidades atendidas? Por que parece que Deus não nos ouve ou que permanece indiferente às nossas solicitações?

Perguntamos nós: Quereria Jesus dizer que tudo o que pedíssemos ser-nos-ia dado, indiscriminadamente, a nosso bel-prazer? Que Deus, pura e simplesmente, está “ao nosso serviço” e, sem esforço algum da nossa parte, tudo melhoraria nas nossas vidas em função de meia dúzia de palavras que proferíssemos nas horas de aflição?

Temos, quanto a isto, que ter em conta os aspectos relacionados com a nossa evolução, verdadeiro e único objetivo da existência terrena. Sendo assim, há que refletir: Por que sofremos? Por que experimentamos dificuldades? Por que temos experiências negativas que resultam em dor, amargura, decepção?... Que finalidade tem tudo isso, senão fazer-nos amadurecer, saldar dívidas contraídas por nós mesmos, expurgar os nossos defeitos, crescer espiritualmente acima da inferioridade que ainda nos carateriza? Seria o objetivo alcançado se bastasse pedir e os problemas fossem afastados? Que aprendizagem tiraríamos das experiências vividas? Sairíamos, ao fim de cada reencarnação, mais fortalecidos moralmente, e até intelectualmente, se tudo nos fosse dado à medida do nosso pedir? Facilmente depreendemos que não.

Cada reencarnação obedece a uma planificação, em que colaboramos e aceitamos, aquando da preparação da nossa vinda a cada existência terrena, contendo acontecimentos, situações e vicissitudes a que não podemos ou não devemos fugir, sob pena de inutilizarmos todo esforço empreendido em nosso favor pelas Entidades Espirituais que nos ajudaram nessa planificação, e não sairmos vitoriosos sobre nós mesmos e sobre as nossas imperfeições. Cabe-nos a nós utilizarmos o tempo que nos é dado com discernimento, resignação, coragem, esforço, se queremos dar passos visíveis na senda do progresso espiritual, moral e intelectual. Deus, como bom Pai, Sábio e Perfeito, ama-nos e respeita a nossa vontade e livre-arbítrio.

Qual então o papel da Prece, em função das nossas necessidades espirituais? Na empresa que cada reencarnação representa no todo da caminhada rumo à perfeição, não estamos sozinhos. Deus, direta ou indiretamente, através dos Espíritos que trabalham na sua seara, atua incessantemente sobre nós, inspirando-nos, fortalecendo-nos, amparando-nos em quedas maiores, ajudando-nos a levantar e seguir em frente quando erramos, vigiando para que tenhamos todas as condições para o sucesso (entendamos por sucesso a evolução espiritual). Quando oramos, estamos a atrair até nós essas Entidades benfazejas, entramos em sintonia com as forças do bem; por outro lado, afastamos de nós outras entidades menos sintonizadas com o bem e que poderiam resultar, com a sua presença, em entraves maiores e inspirações à desistência moral, à revolta, ao desânimo, que nos afastariam dos propósitos da luta. Podemos dizer que, com a Prece, vamos construindo uma muralha de segurança em nosso redor, onde só penetra quem vem por bem.

Para melhor compreender o verdadeiro poder da Prece é necessário percebermos o que acontece quando oramos e o modo como atua. Comecemos por lembrar que todos os Seres, encarnados e desencarnados, estão mergulhados num mesmo Fluido Universal, que se estende pelo Espaço. As vibrações do Fluido Universal, estendem-se pelo Infinito, do mesmo modo que as vibrações sonoras se transmitem pelo ar do nosso planeta. Em consequência disso, cada pensamento nosso, mal é expedido, entra nessa corrente fluídica e, podemos até dizer, deixa de ser exclusivamente nosso, porque passa a ter a possibilidade de ser captado por quem esteja a vibrar em sintonia. E o que é a Prece senão correntes de pensamento que dirigimos a Deus ou a entidades a quem podemos recorrer como intermediárias (sempre na convicção de que são apenas intermediários e nada se faz sem que Deus aprove)? Quando dirigimos o nosso pensamento ao alto, em busca de socorro, alívio, inspiração, força, essa corrente vai em direção aos Espíritos Superiores que, de acordo com a vontade de Deus que tudo prevê e a tudo provê, e de acordo com o nosso mérito e as nossas necessidades, nunca deixam de vir em nosso auxílio. O que acontece, quantas e quantas vezes, é que o que pedimos não é aquilo de que verdadeiramente precisamos, numa visão espiritual. Mas, quantas e quantas vezes também, a ajuda vem mas de uma forma que nós não captamos de imediato: sob a forma de inspiração de soluções para os problemas, sob a forma de um amigo que Deus traz até nós para nos amparar, ou de mil e uma maneiras que a Providência Divina tem de chegar até nós. De uma coisa podemos e devemos estar certos: Deus espera por nós e nunca deixa de ouvir e atender às Preces que lhe dirigimos com Fé. Foi a promessa de Jesus. Quanto a isso, lembremo-nos: Quanto maior for a força e convicção do nosso pensamento (é aí que entra a Fé), maior a força com que esse pensamento entra na imensa corrente fluídica que vai percorrer o Espaço Infinito em direção ao Alto.

Orar por que e por quem? De acordo com os ensinamentos dos Espíritos, temos três fortes razões para orar: Louvar, Agradecer e Pedir. Costumaremos lembrar-nos destes três tipos de Preces? Comumente, dirigimo-nos a Deus quando estamos aflitos e as preces cumprem quase o exclusivo objetivo de pedir ajuda. O que é mais grave é que vemos Deus como um mercador de milagres (ainda não nos livramos totalmente da ideia de Deus criado à semelhança do Homem). Entramos em negociações do gênero “se me concederes determinada graça, faço isto e aquilo”. Esquecemo-nos de que Deus não necessita de nada e a única coisa que quer de nós é o esforço por superarmos as imperfeições que ainda nos desenfeitam a alma. O Louvar e o Agradecer, por vezes, ficam para segundo plano. Há, acima de tudo, que nos reeducarmos no que concerne à atitude que temos perante a Prece. Orar bem, não orar muito (não é a mesma coisa). Sendo a oração uma corrente de pensamento, não necessita de palavras, ou pelo menos, não necessita de muitas palavras, nem de frases feitas, ou de momentos ou lugares apropriados, a não ser o recôndito do nosso coração, a intimidade da nossa alma, a sinceridade de propósitos acompanhada pelas ações. Pensamento sem ação é pouco. Pedir sem pouco fazer vai contra o conselho de Jesus quando disse: “Ajuda-te e o Céu te ajudará”. (O Evangelho segundo o Espiritismo, Capítulo XXVII, item 7.)

“A forma não é nada, o pensamento é tudo. Faça cada qual a sua prece de acordo com as suas convicções e da maneira que mais lhe agrade, pois um bom pensamento vale mais do que numerosas palavras que não tocam o coração”, diz-nos Kardec. (O Evangelho segundo o Espiritismo, Cap. XXVIII.)

A Prece cumpre ainda outra função: a da Caridade. Caridade para com quem queremos ajudar, encarnado ou desencarnado) e podemos fazê-lo dirigindo o nosso pensamento até eles e atraindo as Forças do Bem que atuarão de acordo com as necessidades de cada um. Daí o imenso poder da oração pelos desencarnados, por aqueles a quem amamos, pelos amigos, pelos inimigos e pelos que não têm ninguém que ore por eles. A todos podemos beneficiar com essa força magnética poderosa que é o pensamento dirigido ao Alto com Amor e Fé. Imaginemos a alegria com que é recebido qualquer bom sentimento, naqueles que já partiram e necessitam de força e coragem para superar as situações difíceis em que porventura possam estar, como resultado das suas más ações terrenas, o alívio que uma prece sentida poderá proporcionar a essas almas carentes de coragem. E mesmo naqueles que se encontram em situações felizes, a alegria de serem recordados com Amor, como alívio para a saudade daqueles de nós que por cá deixaram.

Concluindo: A Prece é uma força poderosa, se saída do coração e da boa vontade de quem a usa, se acompanhada do esforço próprio. Não peçamos milagres ou benefícios materiais. Do Alto, esperemos e peçamos força, coragem, fé, discernimento, resignação.

Nas horas de maior aflição, digamos como Jesus no Calvário: “Pai, se quiseres, afasta de mim este cálice, mas acima de tudo, faça-se a Tua vontade e não a minha” (Mateus, Capítulo 26: Versículo 39).


Bibliografia
:

Alan Kardec, O Evangelho segundo o Espiritismo;

Portal do Espírito: https://espirito.org.br.


 

Maria de Lurdes Duarte, natural de Portugal, integra o quadro de articulistas de nossa revista

 



 

     
     

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