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por Lillian Rosendo

 

Verbaliza o que não se cala, silencia o que não se fala


O relacionamento humano implica em comunicação e, no tocante a este tema, proponho atentar nas palavras que saem de nossas bocas. Desde que iniciamos a usar essa essencial ferramenta - a palavra, para nossa evolução -, durante a infância, adolescência, juventude e na fase adulta percebemos o poder que a palavra exerce; aonde ela nos leva positivamente, ou como nos compromete.

O meio em que vivemos nos oportuniza a seguir na direção em que as palavras nos levarão. Expressões idiomáticas, educação, cultura, gírias, palavras nada edificantes com significados dúbios e controversos... e a tarefa complicada de conquistar a ponderação e refletir antes de verbalizar, quando se elege um tom de voz recheado de sarcasmo, deboche e altivez. É ter o cuidado não só com o que se diz, mas, também, como se diz: a intenção. Os mal-intencionados tentam ocultar dos interlocutores, mas estamos sob nuvens de testemunhas que veem o veneno escorrendo pelo canto da boca.

Emmanuel nos remete a uma reflexão acerca do assunto na obra: “Palavras de Vida Eterna” e importa o versículo: “Quem quer amar a vida, e ver os dias felizes, refreie a sua língua do mal”.

Em nossa conjuntura, num desafio desse, fácil seria ficarmos mudos em alguns momentos. Entretanto, há o pensamento, mesmo que não externemos o que vai na mente com relação a críticas ou sentenças dos comportamentos alheios. Estes também causam enfermidades morais: pensou, sentiu, criou, plasmou. Passa a existir no plano extrafísico, e percebemos a nossa responsabilidade no movimento do todo.

O que falo, como ajo, e o que sinto

Curiosa sobre o capítulo 3° do 1° livro de Pedro, percebi que ele chama a atenção para os comportamentos nas relações afetivas, daí extraí o versículo anterior e o posterior, para nos compenetrarmos um pouco mais:

“9. Não tornando mal por mal, ou injúria por injúria; antes, pelo contrário, bendizendo; sabendo que para isto fostes chamados, para que por herança alcanceis a bênção”.

Quando somos insultados, ouvimos algo que nos fere. Por um motivo que desconhecemos, alguém de nosso convívio está de semblante sério em seu próprio mundo introspectivo e nós achamos que é algo conosco e, por consequência, nos comportamos de igual maneira sem sequer entender as causas daquele comportamento.

Quando ouvimos uma verdade que não admitimos que seja dita, quando somos caluniados, o que acontece com nosso mundo íntimo?

Pedro aconselha que abençoemos tais pessoas, abençoar é um desafio e tanto, porém, para vencer este desafio, o perdão é um passo bastante promissor. Não devolver o mal é considerado um avanço, mas é preciso ir além.

Pedro nos diz que fomos chamados para isto. É ativar, à vontade, a coragem e a resignação para ter acesso à herança que está em todas as nossas células, nas fibras que nos impulsionam a ir pelo caminho da verdade e da vida: as veredas da evolução. É a aplicação do ensinamento do Cristo no sermão da montanha: “Bendizei os que vos maldizem, e orai pelos que vos caluniam”.

Então alcançaremos a bênção do amor, este amor que cobre uma multidão de pecados, e o que chegar até nós como algo negativo transformaremos em positivo, como uma oportunidade de aprendizado, e será muito natural abençoar.

Analisemos o versículo que Emmanuel ressalta: “Quem quer amar a vida e ver os dias felizes, refreie a sua língua do mal”.

Seguem algumas atividades que evidenciam que queremos amar iniciando por nossa vida: Alimentação saudável e equilibrada, exercícios físicos regulares, consultas médicas preventivas ou fidelidade aos tratamentos médicos, músicas e leituras edificantes, hábito da gratidão, isenção de qualquer vício, dormir bem, ter um tempo de qualidade a sós.

Em consequência, os relacionamentos são equilibrados: compreendendo, tolerando, perdoando e servindo as pessoas, pois há amor. Não há exasperação com os filhos, não existe pensamento ou verbalização contrária ao cônjuge, nada contra o cunhado - dirá da sogra -, e o vizinho, nem pensar. Tudo em paz com o colega de trabalho, o subordinado, e principalmente com o chefe. Quando amo a vida vejo os dias felizes.

É por esse motivo que não existe vontade, muito menos interesse, em espalhar palavras más. Refreando a língua do mal, se consegue alcançar o versículo 11: “Aparte-se do mal, e faça o bem; busque a paz e siga-a”.

Quando as atitudes superam os equívocos experienciados e finalmente aprende-se com eles, raramente o ser cai no mesmo erro. Mas, só cuidar das próprias ações para não errar, não é suficiente, é preciso expandir o olhar ao semelhante, começando no lar, na instituição religiosa, no trabalho, e além, nas entrelinhas do cotidiano: ouvir, silenciar e externar apenas o que há de bom.

A paz, podemos encontrá-la no equilíbrio dos pensamentos e na consequência dos atos, quando estamos em plena comunhão com as leis que regem nossas vidas. A paz é conquistada e a seguimos em contínua evolução.

Cito um trecho da obra referenciada acima, ditada por Emmanuel:

“Insuflemos nos ouvidos alheios a tranquilidade que ambicionamos e falemos dos outros aquilo que desejamos que os outros falem de nós”.

Por mais que compreendamos o quanto a reclamação é negativa, ainda fazemos muito o uso dela. É cultural, serve até para puxar assunto, seja na fila do banco, na espera da consulta médica, sobre o clima, sobre o time que está na segunda divisão, sobre o Governo, e, principalmente, das nossas dores físicas ou emocionais, sempre escapa um pouco.  

Desabafar é bom demais, mas ouvir é necessário. O outro está de fora vibrando para que escutemos as próprias palavras de forma racional, pontuando aqui e ali no que precisamos atentar para entender, aceitar e se comprometer a mudar a situação. Podemos contaminar as pessoas com as nossas queixas. Temos que ter cuidado.

Quando falamos e há quem nos escute, o primeiro a ouvir somos nós: as orelhas estão bem próximas da boca, e, quando externamos, vamos pensando e procurando meios de solução. A forma e a carga emocional precisam ser conscienciosas para não contaminar o interlocutor. Agradeçamos sempre a Deus por ter essas pessoas por perto e, claro, agradeçamos a elas também.

Quem são os outros?

“Não existem outros” - foi a resposta de um mestre a um aprendiz, quando este perguntou como temos que tratá-los. É se ver no outro, lançar apenas o que ansiamos de bom para atingir o todo, a encarnados e desencarnados.

Jesus asseverou em uma das suas máximas simples e profundas: “(...) pois a boca fala do que está cheio o coração” - um autoexame eficaz para conhecermos o que há em nós, o que pode ser extirpado e o que pode ser conquistado. Ações como: apontar, criticar negativamente, sentenciar seja quem for, mesmo que nosso senso de justiça indique que a pessoa mereça, impedem de compreender que somos todos irmãos, inclusive daquela pessoa cujas ações abominamos. Vivenciar exatamente o que o nosso irmão maior ensinou: “Sede, pois, misericordiosos, como também vosso Pai é misericordioso”.

Ainda não conseguimos praticar o que Jesus pediu: amar uns aos outros. Vamos ao menos compreender, respeitar, perdoar e, em breve, abençoar. Assim teremos, através da comunicação, os relacionamentos que terão vencido os instintos e as sensações, trilhando pelos melhores sentimentos até atingir o amor, internalizando a compreensão sobre o amor que encontramos em O Evangelho segundo o Espiritismo nas palavras de Lázaro: “(...) não o amor no sentido vulgar do termo, mas esse sol interior que condensa e reúne em seu ardente foco todas as aspirações e todas as revelações sobre-humanas”.


Referências bibliográficas:

BIBLIA. Português. Bíblia sagrada. Livro de Hebreus, cap. 12, versículo 1.

EMMANUEL (Espírito). Palavras de Vida Eterna, [psicografado por] Francisco Cândido Xavier – 42º Edição, Uberaba, MG: Comunhão Espirita Cristã, 1964.

BIBLIA. Português. Bíblia sagrada. 1° Livro de Pedro, cap. 3, versículo 10.

BIBLIA. Português. Bíblia sagrada. 1° Livro de Pedro, cap. 4, versículo 8.

BIBLIA. Português. Bíblia sagrada Livro de Mateus, cap. 12, versículo 34.

BIBLIA. Português. Bíblia sagrada. Livro de Lucas, cap. 6, versículos 27 e 36.

Kardec, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Matheus Rodrigues de Camargo. 1° edição. 40° reimpresso. Capivari. São Paulo. Editora EME. 2000, P. 119.

 
 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita