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por Vladimir Polízio

 

Por que ser espírita? 

É reconhecido que ninguém está obrigado a fazer algo que não tenha vontade de fazer. No exercício da vida normal, as pessoas, por viverem em comunidade, têm necessidade de organizar-se para que possam ter assegurados seus direitos, se beneficiarem dos bens comuns e usufruírem de relativa liberdade.

O homem, durante sua jornada terrena, emprega seu tempo com inúmeros afazeres esperando contribuir para o seu futuro. Muitas vezes, não contente com seu emprego, empenha-se em arrumar mais atividades que engrossem o salário e lhe possam garantir aquilo que supõe ser sua necessidade maior: o bem-estar pessoal e da família; poder viajar, morar e vestir-se bem, além de reserva monetária em abundância.

Com isso, esse homem não só se afasta do lar e daqueles que o compõem, como não lhe sobra tempo para assuntos que não estejam ligados a interesses financeiros ou prazeres materiais. Estes são os valores que os menos avisados consideram primários. Assim pensa a grande maioria.

Muitos são os que desconhecem ou se esquecem de que fazemos parte dos bilhões de almas que ocupam o espaço neste áspero chão terreno, e que estamos aqui, não por simples acidente biológico ou em viagem de turismo, usufruindo das benesses do mundo; que não nascemos por mera geração espontânea; que não sofremos graciosamente as penalidades e as dores impostas pela vida, enquanto outros dela se deliciam; que as deficiências de toda sorte não podem ser apenas frutos da imperfeição natural da matéria. Como disse certa vez um religioso, “Se você sofre é porque Deus quis assim”, numa tentativa de justificar um triste acontecimento familiar ou social; que por trás de toda essa conjuntura de objeções não existe alguém que exerça um poder soberano, sobre-humano e absolutamente capaz de tudo controlar, ou, então, que possa crer que a vida termina por aqui mesmo, e que, após seu curto período de existência, apaga-se simplesmente do panorama biológico e psíquico com a morte, deixando de ser, de possuir o seu eu individual, a sua essência.

Se a Terra foi considerada por religiosos durante séculos como sendo o centro do sistema e, por fim, revelado por estudos que não era fixa, nem achatada e nem sustentada por elefantes, que pensar de seus movimentos naturais de rotação e translação em torno do Astro-Rei sem sequer afastar-se dele ao longo desses milênios de séculos e perder-se nesse escuro infinito? Seria uma pobreza de inteligência imaginar como corretas as diferenças e descompassos de toda sorte em relação às pessoas e acreditar que a breve passagem pela vida física na Terra, não obstante as diferenças gritantes de oportunidades, se resumisse apenas nesse acanhado e discreto punhado de anos que cada um vive.

Portanto, num processo de desenvoltura racional de conhecimento sobre o alicerce que estrutura e fundamenta o entendimento da trilogia até então considerada como dogma e não explicada, como por exemplo, ‘de onde viemos?’‘por que viemos?’ e ‘para onde vamos?’, deve-se mesmo parar para pensar seriamente sobre o assunto que, se não é importante hoje, o será em qualquer momento futuro, para o seu integral bem-estar e felicidade.

Mas, para isso, é necessário encontrar o fio da meada, a chave desse enigma. Sem essa importante ferramenta que vai mostrar a direção segura, não se chegará a nada, uma vez que, em meio à gigantesca pirâmide de ofertas religiosas que garantem de tudo nesta época atual e, numa região superpopulosa onde a cada dois dias nasce uma nova Igreja (jornal Folha de S. Paulo – 29-1-2006), seria impossível criar laços de confiança quando nada de consistente apresentam seus dirigentes.

A maior comunidade católica do mundo está em nosso país e decresce anualmente. Por sua vez, as igrejas consideradas evangélicas se desdobram com interessante rapidez, deixando compreender que algo não está de acordo com os grupos de fiéis que acabam se afastando, migrando de um templo para criar outro, em qualquer espaço físico que seja, independente e sob nova direção, mas com o mesmo fundo metódico de ensino sem aprofundamento sobre os mecanismos da vida.

Isso representa insatisfação com o trato dos assuntos da espiritualidade, pois a posição vem dos próprios pesquisados que dizem ‘discordar dos princípios ou da doutrina’, e também com a questão da adequação de certos dogmas aos interesses e conveniências, interferindo no visual e na apresentação pessoal, como corte de cabelo, vestuário, bens de consumo mas de importância no lar, bem como a aceitação do casamento em segundas núpcias, com restrições e constrangimentos dentro da igreja, a supressão do limbo visto pela nova interpretação do Vaticano etc.  

A Doutrina Espírita, destacando-se pela simplicidade, ausência de tradicionalismo e sem romantismo em seus ensinamentos claros, objetivos e lógicos a respeito de todos os problemas da vida física e suas consequências, é a que oferece luz e confiança para o caminho seguro do porvir.

Os ambientes espíritas trazem a singeleza que lhe é própria nos locais destinados ao aprendizado do Evangelho e das próprias atividades doutrinárias, sem proibições, simbolismos ou formalidade alguma nos atos, vestimentas e procedimentos, além da dispensa do cultivo de ilusões paralelas sobre o amanhã, afiançando que este poderá ser mudado com as ações de hoje, afirmativa essa de conformidade com a justiça divina, quando diz que a cada um de acordo com suas obras.

E Kardec, em 1857, reforçou essa linha de pensamentos deixando nos anais na história, especialmente a espírita, a afirmação de que “A fé só é inabalável quando pode enfrentar a razão face a face, em qualquer época da Humanidade”. Belo e verdadeiro esse conceito, pois, além desse sentimento singular e maravilhoso, significa que jamais algo poderá sofrer alteração com o tempo, de acordo com os interesses. Ou é ou não é; é sim ou não.

É assim com os que são conscientes, com os que usam a razão, eles passam a compreender, respeitar e viver a Doutrina dos Espíritos. E Kardec foi além, quando se referiu à pureza da Alma: não disse que fora do Espiritismo não haveria salvação, mas que 'fora da caridade, não há salvação'(1).

 

(1) Revista Espírita - Abril-1864, de Allan Kardec.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita