Artigos

por Maria de Lurdes Duarte

 

Jesus, o Irmão Maior


Gostaria de iniciar este artigo com um parágrafo retirado do livro “O Evangelho da Mediunidade”, de Eliseu Rigonatti, em que o autor nos presenteia com uma singela, mas muito bela, súmula descritiva sobre os primórdios do Cristianismo.

“No princípio era um homem moço, beirava os trinta anos, tinha os olhos lúcidos, profundos, sonhadores. Deu uma volta pelo povoado, e dali a pouco já não estava só; acompanhavam-no uma dúzia de homens, os quais se puseram a segui-lo sem mesmo saberem por quê. Nada possuíam, viviam do trabalho do dia a dia; nem todos sabiam ler; alguns casados, solteiros outros. E ele lhes falou dum império que desejava fundar na Terra: o Império do Amor. E expondo-lhes seu plano, passaram-se três anos, findos os quais foi crucificado, e por isso um deles matou-se; ficaram onze. Pouco depois escolheram um novo companheiro, e voltaram a ser doze. Um dia, do pó da estrada de Damasco, ergueu-se um homem, juntou-se a eles e tornaram a ser treze. E começaram a desenvolver o plano que lhes traçara o moço de olhos lúcidos, profundos, sonhadores.”

E o plano traçado por ele, há mais de dois mil anos, projetou-se no futuro, atravessou gerações e gerações, não conhecendo limites de espaço ou de tempo, e chegou aos nossos dias. É verdade que nem sempre na sua forma mais pura original. Mas chegou.

Mas quem é este Jesus, a quem chamamos Cristo, este homem moço de olhos lúcidos, profundos, sonhadores, no dizer de Eliseu Rigonatti? O que tem ele representado para nós, ao longo dos tempos? Como foi e continua ele a ser interpretado e entendido pelos sábios e estudiosos da Terra?

Lançarei mão de um excerto retirado do livro “Jesus no Lar”, do Espírito Neio Lúcio, psicografado por Francisco Cândido Xavier. Diz-nos ele na introdução:

“Para a generalidade dos estudiosos, o Cristo permanece tão somente situado na História, modificando o curso dos acontecimentos políticos do mundo; para a maioria dos teólogos, é simples objeto de estudo, nas letras sagradas, imprimindo novo rumo às interpretações da fé; para os filósofos, é o centro de polêmicas infindáveis, e, para a multidão dos crentes inertes, é o benfeitor providencial nas crises inquietantes da vida comum”.

Somos forçados a não estranhar, perante isto, o fato de, por não ter sido devidamente entendido, este Jesus ter sido apropriado quer pelos intelectuais, quer pelas religiões, sob uma faceta que pouco ou nada teve em conta o seu real propósito: o de instaurar na Terra um Império de Amor.

Continuando com Neio Lúcio, na obra supracitada, importa refletir que…

“Todavia, quando o homem percebe a grandeza da Boa Nova, compreende que o Mestre não é apenas o reformador da civilização, o legislador da crença, o condutor do raciocínio ou o doador de facilidades terrestres, mas também, acima e tudo, o renovador da vida de cada um”.

Reflitamos, então, quem é para nós este Jesus? O que representa nas nossas vidas? Oriundos, grande parte de nós, das religiões tradicionais, talvez nos tenhamos habituado a pensar nele como “o Filho de Deus”, aquele que veio à Terra para “nos salvar”, aquele que “já estava sentado à direita do Pai quando este mundo foi criado”, e a quem podemos recorrer para pedir socorro sempre que a dor aperta, e que nada pede, nada exige de nós, a não ser um culto apontado por esta ou aquela crença que, se bem cumprido, nos deixará de consciência tranquila, prontos para a dita salvação.

Tudo fácil, tudo limpo, sem grandes exigências, porque ele já “morreu por nós na cruz, para nos salvar”, só nos resta adorá-lo, como Filho de Deus, como o próprio Deus feito homem, até. E recorrer a ele quando bem nos apetecer, ou seja, quando nos convém, como um banco de recursos disponível e sempre à mão.

Onde fica, então, a mensagem de renovação e aperfeiçoamento, presente em cada um dos seus ensinamentos, a renúncia às nossas falhas, vícios e imperfeições, que são o grande entrave ao merecimento desse Império de Amor anunciado e prometido por ele? Onde fica a reforma íntima, transformando o egoísmo e o orgulho, no Amor, tão contrário a todos os vícios, mas o único que nos permitirá ascender a um estado de plenitude e comunhão próprio de filhos de Deus a caminho de uma felicidade possível, intemporal e independente do espaço em que nos encontremos?

Sim, porque a felicidade foi-nos anunciada e prometida pelo Mestre, quando disse: “Sede perfeitos”. Não disse que a perfeição era apanágio de apenas outros mundos ou certos Espíritos, não apontou entraves de maior a essa conquista, não falou de eleitos predestinados a alcançá-la. Apenas disse “Sede perfeitos” “Amai-vos uns aos outros”. Todos e cada um de nós. É um caminho pessoal, uma conquista pessoal, na qual cada um tem de empregar todos os esforços, sem ficar atido à ideia de que a salvação já está feita, pronta a usar.

Mais que um salvador, Jesus é o Irmão Maior. É aquele que já era perfeito quando Deus criou a Terra, a quem Ele incumbiu de proteger, orientar, ajudar a progredir, e que, por esse motivo, se sacrificou a viver nela pelo tempo necessário a dar testemunho, fornecer orientações e ensinamentos seguros, disseminar esperanças, projetando os seus habitantes, que somos nós, que já cá estávamos outrora e por cá continuamos ainda, nessa salvação que teremos de ser nós mesmos a alcançar, seguindo as suas sábias e amorosas lições.

Jesus é o Mestre, o Irmão, o Amigo incondicional, o Médico da nossa alma sofredora, sempre pronto a estender a mão, embora nem sempre da maneira simplista que nós desejaríamos. Simplesmente porque se não formos nós a lutar contra as nossas doenças da alma, não haverá verdadeira conquista, haverá apenas a ilusão de bem-estar que não corresponde à verdadeira cura, não se traduzindo em felicidade.

Jesus é, sim, o Filho de Deus. Nós somos os Filhos de Deus. Somos todos, ele e nós, seres por Ele criados com muito amor e destinados à perfeição e à felicidade, porque uma decorre da outra. Se não, vejamos: que mérito teria Jesus em ser perfeito, se tivesse sido criado de uma forma diferente da nossa, se fosse um ser especial, criado por Deus sem necessidade de trabalho e esforço algum? Que Deus imparcial seria esse que criaria Jesus, anjos, demônios e depois… nós, seres pequeninos e ignorantes destinados aos maiores esforços e sacrifícios para tentar alcançar uma réstia de felicidade que mal vislumbramos? Como poderão querer que tomemos o exemplo de alguém que já nasceu com todas as vantagens, enquanto nós temos de começar do nada?

Esta ideia de um Jesus Filho unigênito de Deus, especial, inalcançável, Deus feito Homem, em tudo diminui o seu exemplo e a sua mensagem. Pelo contrário, a ideia de humanidade deste Irmão Maior, maior porque já viveu mais, foi criado antes de nós, já alcançou pelo seu esforço, trabalho, ajuste às Leis Divinas, fruto de uma aprendizagem de muitos milênios (tal como nós), torna-o digno de ser ouvido e seguido.

Se ele chegou…. Também nós haveremos de chegar. Sigamo-lo! E renovemo-nos em pensamentos, sentimentos, atitudes, desejos, com base nas Leis do Pai que ele tão sabiamente colocou ao alcance do nosso entendimento.

Sejamos humildes e reconheçamos que temos ainda um longo caminho a percorrer, mas com a certeza de que, pela mão amiga deste Irmão Maior, o caminho que palmilhamos, apesar de pontuado pelas pedras que nele depositamos, conduzir-nos-á à grande meta, que é o Pai. Que não nos falte o ânimo! Temos um Amigo de “olhos lúcidos, profundos, sonhadores”, a velar por nós.


 

 
 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita