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por Jorge Hessen

 

Vade retro, “coisa-ruim”!...


O Vaticano acaba de abrir as portas para seu curso anual de exorcismo em meio a uma demanda crescente de comunidades católicas ao redor do mundo. Cerca de 250 padres, vindos de 50 países, chegaram a Roma para, entre outras coisas, aprender a identificar uma "possessão demoníaca", ouvir testemunhos de colegas e conhecer os rituais para a expulsão de “demônios".

Em 2017, o Papa Francisco disse a clérigos que eles "não deveriam hesitar" em encaminhar casos para exorcistas ao notarem "distúrbios espirituais genuínos". Em 1999, a Igreja Católica fez a primeira grande atualização nas regras sobre exorcismo desde 1614, distinguindo a possessão demoníaca de doenças físicas e psicológicas. [1]

Em geral, o padre pratica o ritual usando uma túnica branca de renda chamada sobrepeliz com uma estola roxa. A pessoa possuída pode ser atada, e água benta deve ser usada. O padre faz o sinal da cruz várias vezes em frente à pessoa ao longo do procedimento. O padre convoca santos, reza e lê trechos da Bíblia nos quais Jesus expulsa demônios de pessoas.

Em nome de Jesus, ele pede ao demônio que se renda a Deus e vá embora, tantas vezes quanto necessário. “Assim que o padre se convence de que o exorcismo funcionou, ele reza a Deus para que impeça o Espírito maligno de importunar a pessoa afetada novamente, e que, em vez disso, a ‘bondade e paz do nosso Senhor Jesus Cristo’ se apossem dela.” [2]

O jornal Correio Braziliense [3] publicou em 3 de julho de 2014 que o Vaticano reconheceu juridicamente a Associação Internacional de Exorcistas (AIE). A notícia foi espalhada pelo jornal L'Osservatore Romano, confirmando que a Congregação para o Clero aprovou os estatutos da associação através de um decreto. O ritual do “exorcismo” foi restaurado pelo papa João Paulo II, “quando a Igreja católica decidiu, depois de quase 400 anos, revisar o texto anterior de 1614, devido às mudanças realizadas pelo Concílio Vaticano II (1962-1965) e aos avanços da ciência no campo da mente. [4]

Será que existem fundamentos coerentes à prática do exorcismo? Consta que no ritual da Igreja romana tão somente os bispos podem autorizar um sacerdote a fazer “exorcismos”. Segundo relatos, no esconjuro, os "demos" respondem com mentiras às indagações do “exorcista” sobre a identidade e/ou os motivos da subjugação.

Amparados no bramido beneditino “vade retro, satanás!”, os exorcistas exortam os Espíritos satânicos a saírem do corpo dos possessos, valendo-se igualmente da invocação do nome de Deus, de Cristo e todos os anjos. Ao fim das extenuantes algazarras e invocações, sempre sob o arrimo da “reza brava”, o resultado poderá aparecer de forma ligeira, sem sustento duradouro. 

Os espíritas compreendem que os tais “demônios”, “capetas”, “coisa-ruim”, “lúcifer”, “diabo”, “satanás”, “satã”, “cão”, “demo”, “besta” etc., no senso comum, não são seres votados por Deus à prática do mal, e sim seres humanos desencarnados que se desequilibraram em atitudes infelizes perante a vida. “Na raiz do problema encontramos a necessidade de considerar os chamados ‘Espíritos das trevas’ [demônios] por irmãos verdadeiros, requisitando compreensão e auxílio, a fim de se remanejarem do desajuste para o reequilíbrio neles mesmos.” [5]

Se o célebre “exorcismo”, aplicado consoante os rituais das igrejas, não funciona, como tratar o processo de subjugação espiritual? Ora, a maioria dos Centros Espíritas dispõe de trabalhos de desobsessão. Embora saibamos que a tarefa de tratamento espiritual não é simples, pois muitas vezes obsedado e obsessor comungam um mesmo estado mental, dificultando a identificação de quem é vítima de quem. 

Há trabalhos de “desobsessão”, conforme garantem os incautos, que são mais “fortes” e “imediatos”, contudo, infelizmente, nesses estranhíssimos “tratamentos espirituais”, é fixado apenas um imperativo urgente: o afastamento rápido do obsessor. Mas será que esse instantâneo banimento espiritual é possível? Ora, “como rebentar, de um instante para outro, algemas [mentais] seculares forjadas nos compromissos recíprocos da vida em comum?” [6]

Portanto, são inteiramente inúteis as fórmulas e rituais exteriores para “exorcismos”, o que importa é a autoridade moral do doutrinador. Nesse sentido, a técnica da conversação [doutrinação] com os perseguidores do Além estabelece uma das grandes contribuições do Espiritismo para a melhora das relações entre encarnados e desencarnados. Em face disso, as reuniões de desobsessão bem orientadas são de grandiosa força revolucionária, por disseminar nas suas sessões o convite amorável do Mestre sobre o amor e o perdão.

 

Referências bibliográficas:

[1]  Disponível em bbc,  acessado em 4 de maio de 2018.

[2]  Disponível em bbc 1,   acessado em 4 de maio de 2018.

[3]  Disponível em correio.

[4]  Disponível em globo,  acesso em 18/07/2014.

[5]  XAVIER, Francisco Cândido. Caminhos de Volta, ditado por Espíritos diversos, SP: edição GEEM, 1980.

[6]  XAVIER, F. C. Missionários da Luz, pelo Espírito André Luiz. 8. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1970.


 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita