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por Gebaldo José de Sousa

 

Modinhas


Na caminhada matinal, o amigo vilaboense e sua esposa. Fazem, quase sempre, o mesmo trajeto. Contudo, o casal inicia esse exercício mais cedo do que ele, mas, às vezes, tem o prazer de cumprimentá-los, acompanhando-os por alguns passos.

Num desses encontros, apresentou-lhe uma questão ligada à vida da cidade de Goiás, por ele muito amada, pois que nasceu e viveu boa parte de sua existência. Tem raízes bem fincadas naquele chão, na sua querida Vila Boa de Goiás (antiga Capital do Estado, também chamada Goiás ou Cidade de Goiás).

É sabido o amor que dedicam àquela bucólica urbe! Esta é peculiaridade que os engrandece, pois que, amando aquele pedacinho do Brasil, não amam menos nossa pátria. Pelo contrário: quem ama o coração, ama o todo com muito mais razões.

[O disco LPModinhas Goianas’ – produzido por Discos Marcus Pereira –, gravado por Maria Augusta Calado, traz os versos de uma delas que particularmente o tocam, pela beleza singela, pela pureza e pela felicidade com que fala de uma doce e poética paixão, mas, sobretudo, por sua origem: no encarte que apresenta as letras das canções, há a afirmação de que era "cantada pelo desaparecido bobo de rua, Xará". Essas canções podem ser ouvidas no YouTube; para isso, clique aqui.

A questão se desdobra em duas partes: quem terá conseguido que o 'bobo' aprendesse tal letra e música?

E indaga-lhe mais: seria mesmo ele um bobo, já que a reproduz – com a malícia de quem entende os mistérios do amor –, no seu lirismo encantador, espontâneo?

São coisas que nem os homens nem a Ciência explicam, mas que podem ser compreendidas por aqueles que sabemos que passamos por vidas sucessivas!

Eis os versos da modinha intitulada ‘Encontrei Maria’:

 

I       

Encontrei Maria 

no seu jardim.

Tá panhano frô 

prá jogá ni mim! 

II       

Bem que eu tô sabeno 

que ocê é meu.

Tá panhano frô

prá jogá ni eu!

III

E eu oiêi prá ela

E ela oiô prá ieu:

E eu doidim mode ela,

E ela doidim mode ieu!

IV

Bem que eu tô sabeno

que ocê é meu.

Tá panhano frô

prá jogá ni eu!

 

É claro que o amigo não me ofereceu resposta. Mas que ficou a matutar, isso ficou!

*

Eis outra encantadora modinha que faz parte daquele disco LP:


Rosas
(Tradicional)

Rosa colhia sozinha

Lindas rosas no jardim.

Porque nas faces já tinha

As rosas da cor de carmim!

 

Cheguei e lhe disse: – Oh! Rosa,

Qual destas rosas me dás:

As da face, primorosas,

Ou as que colhendo estás?

 

Ela fitou-me sorrindo,

De leve se enrubesceu.

Depois, ligeira, fugindo,

De longe me respondeu:

 

– “Não dou-te as rosas da face,

Nem as que trago na mão.

Daria, se me estimasses,

As rosas do coração”.

 

Ainda a propósito das estórias de Goiás, aquele amigo contou-lhe de um cego que por viveu.

Para quem não sabe, muitas das ruas daquela bela cidade são calçadas com pedras, apresentando inúmeras irregularidades. Calçamento feito por mãos escravas, nos tempos que se foram, eis que fundada no século XVIII, por bandeirantes.

Pois bem. Aquele homem andava por aquelas ruas, com uma gamela na cabeça, a vender bananas.

Quando alguém, em qualquer daqueles becos e vielas o chamavam, ele, de onde estivesse, respondia, dizendo o respectivo nome da pessoa! Identificava-a pela voz! Conhecia não as pedras do lugar, mas também seus habitantes. E mesmo deficiente, trabalhava e era útil. E, na falta da visão, exercitava seus outros sentidos. Assim, desenvolveu mais sua capacidade auditiva.

Por isso é que se diz popularmente que 'Deus tira os dentes e abre a garganta!'.

Que Deus o tenha e o ampare, onde quer que esteja!

*

Quantas estórias, jocosas umas, tristes outras, não haverá por aquelas bandas, que mesmo nossa querida Cora Coralina, com seu talento e carinho não registrou todas, pois são tantas, no seu riquíssimo folclore!

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita