Estudando as obras
de Manoel Philomeno
de Miranda

por Thiago Bernardes

 

Entre os Dois Mundos

(Parte 9)


 

Continuamos nesta edição o estudo metódico e sequencial do livro Entre os Dois Mundos, obra de autoria de  Manoel Philomeno de Miranda, psicografada por Divaldo P. Franco no ano de 2004.


Questões preliminares


A. A partir de que momento os inimigos desencarnados passaram a sitiar Dr. Marco Aurélio, procurando atingi-lo nos seus pontos vulneráveis?

Tudo começou assim que seu verbo atraiu o interesse de amigos e frequentadores da Sociedade Espírita onde ele atuava. O fato despertou a curiosidade das falanges de inimigos que fizera anterior­mente, os quais passaram a sitiá-lo, procurando-lhe os pontos vulneráveis, a fim de atingi-lo. O sicário que a ele se imantara era uma de suas vítimas pessoais que, há mais de um século, buscava vingar-se, em razão dos sofrimentos que experimentou quando sob sua terrível sujeição. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

B. É verdade que a tentação da vaidade foi o ponto inicial de seu fracasso na atual existência?

Sim. Cercado pela admiração de pessoas incautas e bajuladoras, Marco Aurélio acabou não resistindo à tentação da vaidade. Acreditando-se especialmente intelectualizado, su­pondo-se superior aos frequentadores do ambiente que nele desenvolveu o conhecimento básico da Doutrina, começou a insistir que o Espiritismo não pode ser encarado como religião. Era, sem dúvida, um meio por ele arquitetado com o objetivo de fugir às responsabilidades morais que o Evangelho estabelece como essenciais para a desincumbência dos compromissos espirituais que ele houvera assumido. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

C. O fracasso nos compromissos espirituais estendeu-se também aos seus deveres de esposo e pai?

Sim. Nos primeiros tempos, ele desincumbiu­-se relativamente bem dos novos compromissos, enquanto os filhinhos chegavam, espíritos que dele necessitavam, por serem também suas vítimas antigas. Cabia-lhe o dever de os assistir com frequência, instruí-los na fé espírita, sustentá-los nas ações edificantes, liberá-los dos conflitos e reminiscências amargas, dialogar insistentemente. Mas, sentindo anti­patia por ambos e desconforto com a sua presença, remanescentes dos sucessos transatos, preferiu presenteá-los, dar-lhes comodidades exageradas, manter-se distante, ao in­vés de doar-se, o que é sempre mais difícil. A esposa desdobrava-se para exercer o papel de mãe­-pai, pedindo-lhe ajuda, sempre recusada, que tornou os jovens, no lar, inimigos discretos do genitor e os levou a derrapar, a partir da adolescência, mediante fugas espetaculares para o tóxico e o sexo. Quanto a ele próprio, à medida que aumentava o pa­trimônio financeiro, em decorrência das habilidades profis­sionais e do êxito político, deixou-se enredar em aventuras sexuais nos bordéis de luxo com outros amigos de ocasião, absorvendo os fluidos deletérios dos adversários, pacientes e impiedosos, que agora o dominavam completamente. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)


Texto para leitura


88. Todo o projeto relacionado com a reencarnação do Dr. Marco Aurélio foi supervisionado pelos benfeitores espirituais e, cinco lustros depois, ele veio trazido à reencarnação cheio de esperanças e em clima de festa. Tudo transcorreu conforme elaborado. Os pais deram-lhe proteção e carinho, orientaram-no pelo reto caminho do dever, robustecendo-lhe os sentimentos. Encaminharam-no às células espíritas e ele revelou-se excelente discípulo das lições ouvidas, pas­sando a comentá-las com facilidade de palavra e expressivo magnetismo pessoal. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

89. O Mentor calou-se por um pouco, sintetizando toda uma existência em breves comentários, logo dando curso à narração: “Assim que o seu verbo atraiu o interesse de amigos e frequentadores da Sociedade Espírita, também despertou a curiosidade das falanges de inimigos que fizera anterior­mente, e que passaram a sitiá-lo, procurando-lhe os pontos vulneráveis, a fim de atingi-lo. O sicário, que lhe vimos imantado, é uma das vítimas pessoais que, há mais de um século, busca o desforço, em razão dos sofrimentos ultrizes que experimentou, quando sob sua terrível sujeição. Conseguiu, a muito esforço e perti­nácia, acercar-se-lhe, induzi-lo à vaidade, inspirar-lhe o res­sumar das imperfeições que permaneciam adormecidas e, a pouco e pouco, passaram a dominar-lhe o comportamento. Dando lugar ao desenvolvimento intelectual, cursou a Faculdade de Direito, tornando-se um próspero bacha­rel, mais tarde, exímio criminalista, tendo em vista a sua facilidade de comunicação, de raciocínio rápido, de mente arguta... Nesse período, encontrou a futura esposa, que estudava Odontologia e começou o namoro, que iria cul­minar no matrimônio”. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

90. Cercado pela admiração de pessoas incautas e bajuladoras, Marco Aurélio acabou não resistindo à tentação da vaidade. Acreditando-se especialmente intelectualizado, su­pondo-se superior aos frequentadores do ambiente que nele desenvolveu o conhecimento básico da Doutrina, começou a insistir que o Espiritismo não pode ser encarado como religião. Utilizando-se de verbalismo complexo e de hábeis textos retóricos, procurou justificar a tese com fundamentos pueris, embaraçando os mais simples, que não tinham como contestá-lo. Sem dúvida, tratava-se de sua habilidade pesso­al, a fim de fugir às responsabilidades morais que o Evan­gelho estabelece como essenciais para a desincumbência dos compromissos espirituais que houvera assumido. Descom­prometido com a visão religiosa, logo tentou demonstrar que a convicção derivada da observação dos fatos não podia apoiar-se em estatutos morais transitórios, “heranças infeli­zes das religiões decadentes”, como afirmava, abandonando a tribuna e deixando à margem o ideal de servir. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

91. Os seus inimigos espirituais, que lhe inflavam a insen­satez, logo o induziram à carreira política, em que poderia servir à Humanidade, sem vínculos com doutrinas místicas, que mais perturbam as massas do que as orientam. Em todo esse período – informou o Mentor – não falta­ram os socorros hábeis para despertá-lo do letargo, bem como a inspira­ção insistente por parte da mãezinha espiritual que o con­duzira à Colônia, mais de uma vez, a fim de fazê-lo reconsiderar as atitudes infelizes. Assim que retornava ao corpo somático, a embriaguez dos sentidos dominava-o, levando­-o a conclusões de que os fenômenos de que era objeto não passavam de efeitos do inconsciente encharcado de ideias espirituais. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

92. Consorciou-se e, nos primeiros tempos, desincumbiu­-se relativamente bem dos novos compromissos, enquanto os filhinhos chegavam, espíritos que dele necessitavam, por serem também suas vítimas antigas. Cabia-lhe o dever de os assistir com frequência, instruí-los na fé espírita, sustentá-los nas ações edificantes, liberá-los dos conflitos e reminiscências amargas, dialogar insistentemente. Sentindo alguma anti­patia por ambos, também desconforto com a sua presença, remanescentes dos sucessos transatos, preferiu presenteá-los, dar-lhes comodidades exageradas, manter-se distante, ao in­vés de doar-se, o que é sempre mais difícil. A esposa desdobrava-se para exercer o papel de mãe­-pai, pedindo-lhe ajuda, sempre recusada, que tornou os jovens, no lar, inimigos discretos do genitor e os levou a derrapar, a partir da adolescência, mediante fugas espetaculares para o tóxico e o sexo. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

93. Concomitantemente, à medida que aumentava o pa­trimônio financeiro, em decorrência das habilidades profis­sionais e do êxito político, deixou-se enredar em aventuras sexuais nos bordéis de luxo com outros amigos de ocasião, absorvendo os fluidos deletérios dos adversários, pacientes e impiedosos, que agora o dominavam completamente. Aturdido por essas influências pestíferas, não supor­tava mais a esposa enferma, que lhe parecia pesar como um fardo exaustivo e que a morte natural não arrebatara, a fim de deixá-lo livre para a entrega total aos desvarios que lhe retomavam as paisagens mentais e emocionais. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

94. O Mentor fez breve pausa e, em seguida, voltou à história: “Ele aguarda que o enfermeiro desça à cozinha para um ligeiro lanche, como de hábito, alguns minutos mais tarde, quando pretende executar o plano macabro que vem desenvolvendo mentalmente. O uísque, de que se fez de­pendente, dar-lhe-á a coragem que o discernimento não permite”. Nesse ponto da narrativa, o irmão Petitinga interrogou: “Qual o plano de socorro à nossa irmã enferma, que nos cabe atender?” Com paciência e sabedoria, Dr. Arquimedes res­pondeu: “Há um brocardo popular que acentua: quem não ascende a Deus pelo amor, consegue-o pela dor. Abando­nados os sentimentos superiores, que tombaram no olvido, em face da sua presunção e da loucura pelo poder, nosso caro Dr. Marco Aurélio vem sendo vítima de hipertensão arterial, que não tem cuidado conforme seria de desejar. Isso nos será suficiente para sustar o próximo crime. A bon­dade de Deus, que não tem limite, oferece o seu socorro mediante os mais diferentes mecanismos que propiciam a evolução. Dentro em breve receberemos a sua genitora desen­carnada, que nos auxiliará na providência superior para o bem do filho querido”. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

95. Germano, outro membro do grupo socorrista, perguntou: “E não iremos afastar-lhe o obsessor?” Demonstrando muita serenidade e profundo conhe­cimento da alma humana, o Mentor respondeu: “Não nos compete fazê-lo pela violência, já que a sim­biose ocorre por aquiescência do hospedeiro, que lhe oferece campo vibratório para a ocorrência do fenômeno. Posterior­mente, no entanto, seremos convidados a agir conforme es­tabelecem os códigos do amor e da caridade. Aguardemos!” Entendeu Manoel Philomeno que a proposta de aguardar significava que o momento não comportava novas interrogações. De fato, chegavam até eles os ruídos da festa desbragada. O lar, que havia perdido o contato com as esferas superiores, onde a oração fora deixada de lado e os sentimentos nobres cederam lugar aos abusos de variada expressão, refestelava­-se de seres vadios, misturados com a gangue odienta. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

96. Eram, mais ou menos, 21h, quando surgiu e acer­cou-se da equipe uma dama distinta, procedente de alta esfera espiritual. Embora não se apresentasse com todo o esplendor de sua condição elevada, podia-se perceber-lhe o grau de espiritualidade. Após saudar a todos, ela disse ao Mentor: “Estou pronta, querido amigo. Podemos iniciar a terapia salvadora”. No mesmo instante, o enfermeiro afastou-se do quar­to e desceu a escadaria, demandando a cozinha. O Dr. Marco Aurélio adentrou-se, olhou em volta, quase que incorporado pelo inimigo impiedoso. Ofegava, em decorrência da ansiedade e do medo que o dominavam, embora o álcool que absorvera. Tomou de um pequeno vidro, que trazia no bolso, com a substância letal e, insuflado pelo obsessor que lhe impunha a ordem do uxoricídio, derramou-o em um copo, predispondo-se a levá-lo aos lábios da enferma, que o fixa­va com os olhos brilhantes, como se o espírito soubesse o que estava acontecendo. E em realidade sabia-o. Sem poder mover-se, a expressão de dor e de angústia era estarrecedora. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

97. Ele olhou-a casualmente e não pôde sopitar o desespero, informando-a, nervoso, mas sem hesitação: “Isso acabará logo. Não irá doer”. A um sinal da genitora do tresvariado, Dr. Arqui­medes enviou-lhe alta carga de energia, que encontrou gua­rida no chacra cardíaco, fazendo-lhe o coração disparar, aumentando o bombeamento de sangue para o cérebro. O inimigo desencarnado recebeu, também, a onda vibrató­ria, e afastou-se abruptamente, embora continuasse ligado à massa encefálica do seu sequaz. As sucessivas cargas de vibração que eram absorvidas pelo coração aceleravam a cir­culação do sangue e os capilares cerebrais entumeceram, as artérias dilataram-se, e trêmulo, com a vista embaçada, ele levou a mão ao peito, rolando ao chão, quebrando o copo, derramando o líquido terrível, contorcendo-se e desenvol­vendo um íctus cerebral.(1) O enfermeiro escutou-lhe a queda, subiu a escadaria aos saltos e deparou-se com a cena chocante. De imediato telefonou ao Pronto-Socorro, solici­tando um médico e a ambulância, que chegariam com muito atraso, em razão das festas alucinantes. O político de destaque estava agora impossibilitado de prosseguir na trajetória dos desequilíbrios, sendo poupa­do de maiores gravames. (Entre os dois mundos. Capítulo 7: A falência do Dr. Marco Aurélio.)

98. As atividades prosseguem Tomadas as providências de remoção do Dr. Mar­co Aurélio para o hospital, Manoel Philomeno não pôde furtar-se de acompanhar a expressão de pavor desenhada na face da irmã Lucinda. Porque estivesse parcialmente desprendida do corpo físico, por ele comunicando-se através do perispírito que lhe registava as emoções, o nosso Mentor aproximou-se e falou­-lhe com imensa ternura: “Mantenha-se em clima de serenidade. O perigo já passou. Agora você fruirá de paz. Aqui estamos para auxiliá-la”. Sem dar-se conta de que se tratava de um benfeitor desencarnado, ela justificou o medo que a dominava e as incertezas que lhe pairavam na mente, ao que ele esclareceu: “Você tem sido fiel cumpridora dos seus deveres. Nunca falta o divino apoio a quem se entrega a Deus, con­forme você o faz. A partir de agora tudo se regularizará e, em breve, você libertar-se-á do envoltório material, re­tornando ao país de sua origem, ornada pelas bênçãos do triunfo. Felizes aqueles que se desincumbem dos compro­missos assumidos, mesmo que sob o estigma da aflição e as chuvas de amarguras. Procure repousar um pouco e conti­nue confiando no Pai todo misericórdia”. O Espírito asserenou-se e, em pouco tempo, estava adormecido ao lado do corpo, igualmente em repouso. (Entre os dois mundos. Capítulo 8: As atividades prosseguem.) (Continua no próximo número.) 

 

(1) Íctus cerebral é uma enfermidade cerebrovascular que afeta os vasos sanguíneos que levam sangue ao cérebro. É também conhecido como AVC – acidente vascular cerebral.


 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita