WEB

BUSCA NO SITE

Página Inicial
Capa desta edição
Edições Anteriores
Quem somos
Estudos Espíritas
Biblioteca Virtual
Livros Espíritas em Português Libros Espíritas en Español  Spiritist Books in English Livres Spirites en Français  
Jornal O Imortal
Vocabulário Espírita
Biografias
Livros Espíritas em Português Libros Espíritas en Español  Spiritist Books in English Livres Spirites en Français Spiritisma Libroj en Esperanto 
Mensagens de Voz
Filmes Espiritualistas
Livros Espíritas em Português Libros Espíritas en Español  Spiritist Books in English    
Efemérides
Esperanto sem mestre
Links
Fale Conosco
Especial
Ano 1 - N° 7 - 30 de Maio de 2007

JOSÉ CARLOS MONTEIRO DE MOURA
jcarlosmoura@terra.com.br
Belo Horizonte, Minas Gerais (Brasil)
 

Aspectos inusitados do aborto

A visita do Papa ao Brasil revelou-se como mais um acontecimento religioso típico da Igreja. É indiscutível que o seu caráter triunfalista demonstrou a clara intenção de sua cúpula em afirmar a superioridade de Roma em relação às demais religiões.
Isso pode ser visto como mais um fator para acirrar os ânimos dos defensores da descriminalização do aborto, muitos movidos, quem sabe, mais pela necessidade

fazer frente à conhecida arrogância católica, do que por convicção.

Os pronunciamentos oficiais da Igreja ainda hoje se revestem do caráter dogmático que ela insiste em manter e, via de regra, acham-se envoltos em uma atmosfera pouco simpática, reflexo talvez da época em que ela se julgava detentora do mais absoluto poder civil, político e... até religioso!

A par de tal situação, alguns desavisados abortistas aproveitaram a ocasião para as mais infelizes e inconseqüentes manifestações em defesa de suas idéias. O exemplo mais triste e, por isso mesmo, mais alarmante, foi dado pelo Ministro da Saúde, quando afirmou pela imprensa que "a proibição do aborto no País tem um viés machista e que o tema é, antes de tudo, de saúde pública e não apenas" religiosa, ética, filosófica ou fundamentalista" (sic).

Essa grande preocupação em eximir o aborto de todo e qualquer conteúdo religioso, ético e filosófico demonstra, ao contrário do que pensa o ilustre Ministro, o mais arraigado fundamentalismo, expressão muito utilizada nos dias de hoje, mas que poucos sabem o que realmente significa. Fundamentalista é aquele que somente admite a sua verdade, seja em que campo for, político, social, esportivo ou religioso. Ao acusar os opositores da liberação da hedionda prática, ele sim assumiu uma postura tão dogmática e exclusivista como as adotadas pela Igreja. Em suma, deu o mais elucidativo exemplo do verdadeiro fundamentalismo.

O fato de a Igreja ser contra o aborto não constitui exclusividade dela, uma vez que todas, ou quase todas, as profissões religiosas o são. Ademais é de se levar em conta que, sendo o catolicismo a religião dominante no Brasil, o número de seus adeptos que já o cometeram, ou mesmo dos que defendem sua legitimidade, é infinitamente superior ao das demais religiões, embora milite a favor deles a circunstância de que mais de 50% dos católicos brasileiros o são por mera tradição e sem nenhuma convicção.

O Espiritismo é, dentre todos os segmentos religiosos (e não nos cabe aqui discutir se ele é ou não religião), o que se mostra mais liberal em relação ao aborto. Muito antes de as legislações penais cogitarem do chamado aborto terapêutico, já O Livro dos Espíritos, em 1857, o mencionava na questão 359, quando o "nascimento da criança pusesse em perigo a vida da mãe dela".

As hipóteses que os abortistas englobam na rubrica genérica da "gravidez indesejável", e nas quais se acha subjacente a assertiva de que a mulher é dona de seu corpo e que pode dispor dele como bem lhe convier, implicam gravíssima heresia científica, porquanto o feto jamais poderá ser considerado, como sustentam alguns, "uma parte das entranhas maternas".

Ao longo de mais de trinta anos de atividade constante na tribuna do júri, a quem cabe o julgamento dos quatro crimes dolosos contra a vida – homicídio, induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, infanticídio e aborto – aliados a outros tantos no magistério superior, especificamente na área do Direito Penal - tivemos oportunidade de presenciar toda espécie de reações negativas, por parte de terceiros, diante dos autores de um crime de homicídio. Essas mesmas pessoas, contudo, não se mostravam tão surpresas ou mesmo revoltadas quando a questão girava em torno do aborto. É de notar, ainda, que a grande maioria desse universo era possuidora de escolaridade superior. Igual tipo de comportamento era também comum no meio universitário. A repulsa, a revolta, e até mesmo um certo sentimento de vingança revelado em face do homicida não ocorriam quando o crime era o de aborto. Quase sempre o que se observava da parte de tais pessoas, salvo raríssimas exceções, era um certo indiferentismo em relação à morte do feto no útero materno. Falava mais alto, indiscutivelmente, o famoso ditado segundo o qual "o que os olhos não vêem o coração não sente".

Concomitantemente, a mulher que abortara, e até aqueles que se prestaram a realizar o abortamento, eram passíveis de uma estranhável dose de simpatia, sempre sob a ótica da indesejabilidade da gravidez, seja por motivos econômicos, familiares, sociais, éticos (sic), ou mesmo os de natureza meramente estética!

As feministas extremadas, e os que, por oportunismo ou por outros motivos pouco recomendáveis, fazem coro com elas, desconhecem ou fingem desconhecer a inominável covardia que significa a morte do ser humano em formação no útero materno. Exatamente por isso, tal covardia atinge índices de superlativa gravidade, e embora o aborto não figure entre os chamados crimes hediondos, a sua hediondez, do ponto de vista moral e ético, ultrapassa todos os limites do mínimo de sensibilidade exigível de um ser humano.

O Código Penal, ao cogitar do crime de homicídio, cuja vítima já não é mais o indefeso e desprotegido feto, qualifica, isto é, agrava sensivelmente as ações praticadas mediante traição, ou mediante qualquer recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido. Nenhuma traição pode ser comparada com aquela perpetrada pela própria mãe, eliminando ou permitindo que se elimine a vida do pequeno ser que traz dentro de si, que dela depende em tudo e por tudo, e que, por isso mesmo, nela deposita a mais absoluta e irrestrita confiança. Nenhum "recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido" alcança o mesmo grau de intensidade e de gravidade que a ação praticada contra quem não dispõe de nenhuma possibilidade de reação, de nenhuma capacidade de autodefesa, de nenhum meio capaz de nem sequer clamar por socorro!

Isso sem falar nas qualificadoras vinculadas à motivação do agente (motivo fútil ou torpe), quantas vezes presentes nos fatores determinantes da sempre alegada "gravidez indesejável".

Argumenta-se, por outro lado, que o aborto raramente vai a julgamento, operando-se sempre a prescrição da ação ou da pena, o que tornariam inócuas as figuras delituosas previstas no Código Penal. Um erro não justifica outro erro. É verdade que a Polícia Judiciária tem se mostrado inoperante para apurar as centenas desses crimes que são cometidos às escâncaras, muitas vezes em locais situados nas proximidades das próprias repartições policiais. Trata-se, indubitavelmente, de um problema administrativo, cuja solução não pode ser reduzida ao simplismo de se retirar o aborto do rol dos crimes da Lei Penal. Nunca é demais relembrar também que o Estado detém o poder e o dever de zelar pela integridade física do nascituro e que a incriminação do aborto constitui um dos instrumentos de que dispõe para o exercício desse poder-dever.

De outro lado, se o Poder Judiciário não dispõe de recursos para agilizar o andamento dos processos, isso não pode ser debitado aos inocentes imolados no ventre materno, uma vez que, pelo menos nesta vida, eles em nada colaboraram para a eterna lentidão e carcomida burocracia processual! Além disso, se, nesse particular aspecto, tais espíritos carregam consigo algum débito conseqüente de erros do passado, a Justiça Divina dispensa toda e qualquer ajuda humana para o funcionamento de seu mecanismo operacional!

Escuta-se, ainda, nos corredores forenses, entre os defensores do aborto livre, o sovado argumento, hoje erigido à conta de verdadeiro dogma de saúde pública, que a sua descriminalização poria termo à indústria do aborto clandestino, praticado sem as precauções médicas indispensáveis. Nenhum argumento é mais utópico e agride tanto a realidade brasileira como esse. O nosso sistema de saúde vive um verdadeiro caos. Neste final de semana, por exemplo, um cidadão desencarnou aqui, em Belo Horizonte, depois de esperar doze horas numa fila de atendimento de urgência. Entretanto, a valer a argumentação acima, o Estado continuaria a não dispor de médicos e de recursos para salvar vidas, mas contaria com o mais sofisticado aparato técnico e científico para matar!!!

Finalmente, ainda que se admita, apenas para argumentar, que a questão não deve ser vista como tema da alçada religiosa, ou como "coisa de padre e de irmã de caridade" como querem alguns, ela é de extrema e incontestável importância, uma vez que interessa a todo ser humano que tenha o mínimo de preocupação com o caráter transcendental da vida e com a sua destinação superior. Refere-se a algo muito mais profundo e que se inscreve no sentimento de religiosidade, inerente ao homem, do qual ele não consegue prescindir e que se perde na poeira dos tempos. É inaceitável, como infelizmente já tivemos oportunidade de constatar no meio em que convivemos, que alguém se coloque a favor da legalização do aborto, apenas e tão-somente como forma de exteriorizar uma atitude contrária às velhas tendências autocráticas de Roma, ainda que elas, como afirmamos no início destas considerações, tenham sido muito enfatizadas com a visita papal. O senso do justo e do injusto inato ao ser humano, aliado ao bom senso e à lógica jurídica, sem os quais não há que se falar em Direito e em Justiça, depõem contundentemente contra o livre aborto. Para nós, espíritas, em face de nossa postura reencarnacionista, o tema assume foros e características especiais e se desdobra em diversos ângulos ou facetas, todos merecedores da mais acurada análise e reflexão.

Por isso, se por acaso ocorrer o terrível retrocesso espiritual de ele vir a ser legitimado no Brasil, só nos resta voltar aos tempos do Direito Romano e repetir: "Non omne quod licet, honestum est".


Voltar à página anterior


O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita