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Crônicas e Artigos
Ano 1 - N° 18 - 15 de Agosto de 2007

JOSÉ CARLOS MONTEIRO DE MOURA
jcarlosmoura@terra.com.br
Belo Horizonte, Minas Gerais (Brasil)
 

Até quando?

1. A famosa expressão com que Cícero abre as suas não menos famosas Catilinárias, quosque tandem? (até quando?), dirigidas a Sergius Lucius Catilina, acusado de insurreição contra a república romana, aplica-se, na íntegra, à postura de total intransigência, de pseudo-supremacia e de incontestável radicalismo que a Igreja Católica vem desenvolvendo, ao longo dos séculos, em relação aos demais segmentos do Cristianismo. Isso se se fizer abstração do que ela fez ao Islamismo, às religiões dos povos colonizados e catequizados por espanhóis e portugueses, e às religiões orientais.

As duas últimas atitudes do Papa Bento XVI revelam quanto a Igreja ainda se acha presa a essas idéias e atitudes. A primeira, que ele justificou como medida para “agradar aos tradicionalistas” – a missa em latim – não ultrapassa os recintos dos templos católicos, e não dizem respeito às demais religiões. Graças a Deus, muito embora o empenho de alguns companheiros, o Espiritismo conseguiu, até esta data, ver-se livre desse tipo de cerimônia. Esperamos que tal situação perdure para sempre e que o malfadado exemplo do “casamento espírita” não sirva de estímulo para missas, batizados, crismas e outros sacramentos!

A segunda, no entanto, interessa de perto ao Espiritismo, pois se refere ao diálogo inter-religioso, que constitui uma de suas preocupações. Entendemos, com o devido respeito aos que pensam em contrário, que o Espiritismo não deve ser visto como uma religião, nos termos que essa palavra significa. É esse o pensamento de Allan Kardec expendido na Codificação, na Revista Espírita de 1859, 1862, 1863, 1864, e principalmente na de 1868, quando esclareceu de vez a polêmica que se formara a respeito da questão. O seu aspecto religioso, que forma juntamente com o científico e o filosófico, a tríade sobre que se apóia, não pode ser confundido ou identificado com uma Religião Espírita, uma vez que, a existir, tal religião implicaria, necessariamente, a existência de hierarquia eclesiástica, liturgia, dogmas, sacramentos etc., perfeitamente dispensáveis e comprovadamente desnecessários.

2. Na mencionada Revista Espírita de 1868, ele afirma que “o verdadeiro objetivo das assembléias religiosas deve ser a comunhão de pensamentos; é que, com efeito, a palavra religião quer dizer laço. Uma religião, em sua acepção nata e verdadeira, é o laço que religa os homens numa comunidade de sentimentos, de princípios e de crenças”. Prossegue dizendo que “o laço estabelecido por uma religião, seja qual for o seu objetivo, é, pois um laço essencialmente moral, que liga os corações, que identifica os pensamentos, as aspirações, e não somente o fato de compromissos materiais que se rompem à vontade, ou da realização de fórmulas que falam mais aos olhos do que ao espírito. O efeito desse laço moral é o de estabelecer entre os que ele une, como conseqüência da comunidade de vistas e de sentimentos, a fraternidade e a solidariedade, a indulgência e a benevolência mútuas. É nesse sentido que também se diz: a religião da amizade, a religião da família” ( REVISTA ESPÍRITA, Edicel, SP, s/d, dezembro de 1968, pp 356/357). Somente sob esse ângulo é que ele aceita que se atribua ao Espiritismo a característica de uma religião.

3. Na sua concepção tradicional e vulgar, a religião dificilmente atende a tais requisitos. Torna-se difícil a coexistência deles em seu âmago, porquanto, via de regra, um sempre elimina o outro, em face do sentimento de exclusiva detentora da verdade de que cada uma se julga possuidora.

Daí a triste verdade que se acha contida no desabafo de Jonathan Swift, mais conhecido no Brasil por ser o autor de Viagens de Gulliver: “Nós temos religião suficiente para nos odiarmos, mas não o suficiente para nos amarmos”.

A atitude do papa, reforçando seu ponto de vista já externado no texto Dominus Jesus , publicado em 2000, quando era o senhor todo poderoso da Congregação para a Doutrina da Fé (nome moderno da Inquisição ), revela o elevado grau de intolerância e de radicalismo que ainda impera na sua igreja.  Naquele documento, como na sua recente ratificação, ficou expressamente explicito que Roma ainda  se considera em nível de absoluta superioridade em relação a ortodoxos, protestantes e evangélicos. Na sua abertura, o último documento afirma, jesuiticamente, que reconhecia a existência de “muitos elementos de santificação e verdade” nas demais denominações cristãs, mas salienta que só o catolicismo tem todos os elementos para ser a igreja plena de Cristo. Num retorno evidente ao passado, proclama a existência de uma grande ferida nessas religiões, por não reconhecerem a autoridade papal!  

Isso reforça a tese de que, no seio do próprio Cristianismo, em que pesem os esforços de alguns poucos, os homens ainda não se entenderam. O que dizer, então, quando a questão foge dos seus limites e diz respeito, por exemplo, às religiões orientais que não se originaram dele?

4. O tema poderia parecer ao menos avisado que nada tem a ver com o Espiritismo. Todavia, Kardec, em O LIVRO DOS MÉDIUNS (Cap.XXIV,in fine),  traçou os verdadeiros objetivos do Espiritismo, ao dizer: “...podem, desde já, formar o núcleo da grande família espírita, que um dia consorciará todas as opiniões e unirá os homens por um único sentimento: o da fraternidade, trazendo o cunho da caridade cristã”.

Note-se que ele falou em “grande família espírita” e não em “grande religião espírita”. Enfatizou e deu primazia à fraternidade, uma vez que somente ela permite compreender e conviver com o outro, respeitar suas opiniões, pontos de vistas e sentimentos, ao contrário dos que, por desconhecê-la ou não praticá-la, insistem em impor suas idéias a todos indiscriminadamente. Disso se conclui, sem muita dificuldade, que a fraternidade não é atributo exclusivo do Espiritismo e que o homem pode ser fraterno, amar o seu próximo e respeitá-lo, até mesmo sem professar nenhuma religião. Trata-se da hoje tão discutida e decantada espiritualização, que Leonardo Boff afirma existir independentemente de o seu possuidor ser, ou não, membro de alguma igreja ou confissão religiosa.   

O Espiritismo é o portador da mensagem da fraternidade universal, fato que, embora alguns apressados confrades já chegaram até a marcar a data de sua implantação no planeta, somente o correr dos séculos e a conseqüente reforma interior da humanidade transformarão em realidade.  A sua proposta compreende, mais do que qualquer iniciativa social ou filosófica, a plena e total convivência entre todas as denominações religiosas, cristãs ou não. É indiscutível que um dos óbices ao estabelecimento dessa fraternidade é o que apresenta conotações religiosas, em face de suas notórias e conhecidas implicações.

Sob esse particular aspecto, não se pode mais desconhecer ou ignorar o profundo conteúdo ético, por exemplo, do Hinduísmo, do Budismo ou mesmo do Islamismo, cujas distorções não passam de meras criações humanas, a exemplo do que ocorreu e ocorre no Cristianismo.

Enquanto perdurar o extremismo ou o sectarismo, enquanto a filiação religiosa for motivo de exclusão ou sinônimo de status social, enquanto ela servir de pretexto para ações bélicas, para as guerras santas que se estendem das Cruzadas à Jihad, incluindo-se aí os atos de terrorismo, a humanidade não se libertará dos seus vícios, erros e mazelas, por maior que seja o esforço que o Espiritismo e os bem intencionados membros de algumas religiões, das quais fazem parte ativa as não cristãs, desenvolvam nesse sentido. E, lamentavelmente, ele encontra dificuldades em seu próprio seio, porquanto muitos já enveredaram  pelas sendas tortuosas do indesejável  radicalismo e das disputas doutrinárias, das que se reportam à ânsia de inovação, numa incontestável repetição do que ocorreu com o Cristianismo primitivo, que inovou e trouxe para suas fileiras todas as excentricidades dos chamados cultos pagãos. É verdade que esse procedimento pode ser justificado como uma extrema medida de sobrevivência. No entanto, no que diz respeito ao Espiritismo, tal situação, passados os primeiros momentos de sua evolução, especialmente aqui no Brasil, já não mais se verifica, e sua ocorrência parece ser explicada pela necessidade que alguns sentem de aparecer. Esses, Kardec, com a franqueza que o caracterizava, classificaria como “espíritas mais de nome que de fato” (O LIVRO DOS MÉDIUNS, nº 335, O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO, cap. 17, item 4, e REVISTA ESPÍRITA, nov. de 1861).    

Finalmente, como que a comprovar que muitos líderes ou dirigentes religiosos ainda não alcançaram o cerne das religiões que seguem e dirigem, é de todo válido relembrar as palavras de Gandhi acerca da absoluta necessidade de todas elas conviverem entre si e de se aceitarem mutuamente: “Se um homem atinge o coração de sua religião, ele atinge igualmente o coração das outras religiões”.   

Nota de esclarecimento:

Em que pese o apreço que temos pelo autor deste artigo, queremos deixar claro que a direção da revista O Consolador entende o Espiritismo como Religião, da mesma forma que assim o entendem Bezerra de Menezes, Emmanuel, André Luiz, Carlos Imbassahy, Herculano Pires, Chico Xavier, Divaldo Franco e tantos outros vultos que já se manifestaram a respeito do assunto. (Astolfo Olegário de Oliveira Filho – Diretor de Redação.)


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